A palavra “dom” é usada desde os primórdios até hoje. Espera-se que o indivíduo nasça com o “Dom” disso ou daquilo, exemplo o Dom Musical.
Isso se torna um problema sério para o próprio indivíduo, que passa a ser rotulado como o “cara que tem o Dom”. E com esse rótulo, ele tende a ter o ego exaltado, resultando em uma profunda aversão para aprender coisas novas e para aprimorar sua predisposição para o conhecimento e aprofundamento musical.
Ninguém nasce com o Dom para alguma coisa, e sim com influência, primeiramente dos pais, depois, de tudo que está ao seu redor. Uma pessoa que nasce em uma família que toca choro o tempo todo, obviamente será influenciada, e consequentemente, terá facilidade para a aprendizagem do tal estilo. Assim sendo, o leigo, vendo isso, diz: – Tá vendo? O (a) menino (a) nasceu com o Dom, filho de peixe, peixinho é. Acontece que tal influência de nada vale se, no futuro, não for lapidada, ou seja, conscientizada. Seria o mesmo que uma criança ao nascer e crescer, não fosse treinada para falar o idioma dos pais.
O paradoxo é tanto que muitos adotam a ideia de que uma pessoa tem que se submeter a um teste qualquer e se sair bem, sem nunca sequer ter visto antes o conteúdo do teste. Isso é impossível – Ou a pessoa já conhece o conteúdo antes ou será impossível levar o teste adiante. Na música, acontece exatamente isso, coloca-se o instrumento na mão do aspirante a músico e diz: – Toca! E se o sujeito tocar algo, imediatamente será aclamado, senão, lhe é dito: – Esqueça, siga outra profissão que música não é pra você.
Ninguém nasce com o Dom para falar um idioma qualquer. Jamais ouvimos ou ouviremos alguém dizendo ter o Dom para falar japonês. A música é um idioma, aliás, o idioma matriz, portanto, não há um milésimo de possibilidade sequer de uma pessoa nascer falando algum idioma sem nunca ter antes escutado, vivido e treinado. Em fim, o problema é tão grande que, muitos músicos, com o tal rótulo, são professores, e, como podem ser professores, se divulgam o Dom, a intuição, a magia? Isso é inadmissível em uma sala de aula. Pra quê mentir pra si mesmo, se julgando ser músico, sem saber o que está fazendo? Pra quê?
Hoje o indivíduo estuda algo e já vira professor da noite para o dia, ou seja, imediatamente posta no youtube.com a sua aula, dizendo estar ajudando… Depois reclamam, dizendo que o mercado musical está difícil, que não estão ganhando dinheiro. Se todos estudassem com lógica, sem o tal Dom, como na área da medicina, odontologia, linguística, etc. Não lhes faltariam sequer trabalho, e todos estariam compatíveis e sedentos pela aprendizagem do idioma musical, seriam respeitados e sem rótulos. Você não vê um engenheiro ensinando engenharia no youtube.com.
Em vez de buscar o seu Dom, busque ter conhecimento. Faça o esforço para compreender. Esqueça a adivinhação, premonição, ouvido, dom, mito, etc. Viva o hoje e o agora. O ontem já passou, não há mais como voltar, o amanhã ainda não aconteceu, não se sabe como vai ser, portanto, seja o agora, estude, pois só estudando, e com lógica, é que será possível ver o hoje e em tempo real, ou seja, ver você mesmo, como você é de fato.
Seja brasileiro acima de tudo. Aprenda a se respeitar. Dê valor à língua que temos e à música que nos é tão peculiar. Antes de querer tocar a música de fora, estude, primeiramente e com vontade, a música do seu país, e principalmente a música que se encontra nos meandros da sua mente e que faz vibrar o seu coração. Isso é o mínimo que podemos fazer para ser de verdade. Não há necessidade alguma de nascer com o “Dom” para ser verdadeiro. Somos quem podemos ser.
Jack Lima é multi-instrumentista, compositor, professor, escritor, programador e empresário. Leciona música há mais de 20 anos. Tem como conselheiro, mestre e
principal influência, o consagrado pianista e professor Wilson Curia. É autor do livro Dicionário de Ritmo e desenvolveu o SMD (Sistema de Música Definitiva) – www.smdjacklima.com.br
Quem vê?
Aquele que entende.
Quem entende?
Aquele que sabe.
Quem sabe?
Aquele que estuda.
Quem estuda?
Aquele que quer se transformar.
Transformar-se em quê?
Em uma pessoa segura.
Segura de quê?
De que é ela quem conduz.
Conduz o quê?
Suas ideias.
Ideias do quê?
Do que é certo ou errado.
O que é certo ou errado?
Só sabe aquele que vê.
Jack Lima