More Edson Leão Ferenzini »"/>More Edson Leão Ferenzini »" /> Edson Leão Ferenzini - Revista Ritmo Melodia
Uma Revista criada em 2001 pelo jornalista, músico e poeta paraibano Antonio Carlos da Fonseca Barbosa.

Edson Leão Ferenzini

Compartilhe conhecimento

 

O Cantor, compositor, poeta e jornalista mineiro Edson Leão Ferenzini, integra algumas bandas e projetos de música e poesia, como a banda Eminência Parda e os grupos: Ou Sim, Fusca Voador, Parangolé Valvulado e FBI.

A banda Eminência Parda é um dos grupos mais atuantes de Juiz de Fora – MG e Região com mais de três décadas de militância cultural, tanto em seu trabalho, quanto em projetos coletivos e produções que contribuíram para a renovação da cena, rock, pop, MPB e até do Carnaval. Nesse tempo criou uma linguagem bastante pessoal unindo influências da MPB pós tropicalista, do rock alternativo dos anos 80 e 90 e do rock setentista.

Eminência Parda desenvolveu em sua trajetória, pontes entre diferentes faixas da música popular brasileira e do rock. Entre suas influências estão o rock alternativo dos anos 80, MPB pós-tropicalista, pop sessentista, grooves da black music e rock setentista. O resultado é um trabalho diversificado e de personalidade, com trânsito entre diferentes faixas etárias de público.

A poética continua sendo o forte, mas com letras mais diretas, com romantismo fino, além de comentários críticos e sociais, mas sempre líricos, sobre a realidade. As melodias seguem incomuns e belas e os arranjos se beneficiaram do crescimento musical, do acúmulo das experiências de cada um, com os anos de estrada.

Eminência Parda com longa experiência por palcos de Minas Gerais e outros estados, representou Juiz de Fora em eventos como Festival de Cultura da UNE (anos 90) em Ouro Preto, Green Rock Festival (em Palmas) e Projeto Raízes, da empresa Belgo Mineira, que percorreu algumas cidades do estado.

Lançou: Eminência Parda – Cadeira (1994), primeiro disco no formato CD, lançado por um grupo da Zona da Mata Mineira. O álbum Coletânea Cultural Bar (1999). Projeto coletivo.  Eminência Parda – Cidade sob a Chuva (2002). O álbum – Impressões de Viagem, Brasil 70 (Releituras) e o DVD Impressões de Viagem (ao Vivo) (2008). O álbum Coletânea Cultural Bar II. Projeto Coletivo.

O álbum – Avohai 40 anos Remake Pop Rock (2018), uma coletânea comemorativa dos 40 anos do primeiro álbum de Zé Ramalho, com seleção do próprio artista e a escolha da versão da Eminência Parda, da música Avohai, como abertura do álbum.

O álbum “Mundos Achados & Perdidos – Tocando Solo”, é eminentemente um fruto do distanciamento social da pandemia do Covid-19. Nasceu de experimentos caseiros de áudio e vídeo, feitos com celular, notebook, programas básicos de edição, manipulação de sons, mas principalmente da extrema necessidade de achar formas de expressão, num momento em que todo o setor artístico se viu de uma semana para outra, inviabilizado de existir presencialmente, pela pandemia.

Graças ao edital da Lei Aldir Blanc MG para gravação ou finalização de álbuns, foi possível concretizar a parceria fundamental com o músico Julião Jr. Fazendo a dupla função de George Martin e dos quatro garotos de Liverpool, ele produziu, arranjou e executou o álbum, somando à liberdade de experimentação, intuição e improviso dos primeiros esboços, o artesanato meticuloso, o apuro técnico, tecnológico e musical atento a cada detalhe.

Fundamental também à criação do álbum, foi a parceria com a vídeo-poeta Patrícia Almeida em vídeo poemas e vídeo clips experimentais feitos também durante a pandemia e que foram ponto de partida para as faixas “Mundos Achados & Perdidos/Sobretudo” (que inclui um poema de sua autoria interpretado por ela), “Digitália” (com intervenções vocais da artista). São dela também os experimentos de alteração de ritmo e vozes que serviram de base para a canção “Fragmentos sobre essa noite” (de autoria do cantor).

Pelo próprio contexto em que foi gestado, o álbum tem um tom mais intimista do que outros álbuns gravados pelo artista em trabalhos de grupo (Eminência Parda, Sambavesso, Ou Sim, Parangolé Valvulado). Um álbum de rock, mas reflexivo em temáticas e na interpretação vocal, com forte influência folk, mas aberto às novas tecnologias. Une algumas influências fundamentais do artista, mas sem a preocupação de seguir é alguma linha fechada.

Nas longas reuniões virtuais sobre os caminhos dos arranjos, surgiam referências tão diversas quanto Pink Floyd, The Cure, Babybird, Dead Can Dance, Johny Cash, Peter Gabriel, Zé Ramalho, Johny Maar, o folk punk dos Pogues, música de intervenção (canção de protesto portuguesa), Massive Attack, Echo & The Bunnymen e Walter Franco. A intenção não era que alguma dessas referências realmente estivesse audível no resultado final, mas eram uma tentativa de mapear as intenções sonoras e buscar uma identidade.

Segue abaixo entrevista exclusiva com Edson Leão Ferenzini para a www.ritmomelodia.mus.br, entrevistado por Antonio Carlos da Fonseca Barbosa em 22.03.2023:

01) Ritmo Melodia: Qual a sua data de nascimento e a sua cidade natal?

Edson Leão Ferenzini: Nasci no dia 12 de outubro de 1966; no meio da febre e da efervescência do rock e da nascente MPB. Nasci em Juiz de Fora, MG, cidade que abrigaria Festivais de Música que revelariam grandes canções e artistas dos anos 70.

02) RM: Fale do seu primeiro contato com a música.

Edson Leão Ferenzini: Meu primeiro contato com a música foi através do rádio, TV e discos. Nelson Gonçalves, através do meu pai (Cleuber Ferenzini, percussionista de um grupo de seresta depois da aposentadoria, mais ou menos na mesma época em que ia me aproximando do rock e da MPB). Roberto Carlos, através da minha mãe (Maria Olívia Leão Ferenzini). Bossa Nova, Clube da Esquina, Fagner, Ednardo através da minha irmã (Valéria Leão Ferenzini que é letrista, cantora, historiadora). Rock progressivo através de amigos mais velhos e punk, pós punk e new wave, por minha conta e risco e pelo espírito do tempo da minha juventude.

03) RM: Qual sua formação musical e/ou acadêmica fora da área musical?

Edson Leão Ferenzini: Em música, estudei canto popular e um pouco de violão. Sou formado em Comunicação Social e fiz mestrado em Teoria da Literatura, ambos na UFJF – Universidade Federal de Juiz de Fora.

04) RM: Quais as suas influências musicais no passado e no presente. Quais deixaram de ter importância?

Edson Leão Ferenzini: Não acho que algo que influenciou no passado tenha perdido a importância. As referências continuam como possibilidades, podem voltar à tona quando menos se espera, no meio de algum processo de criação.  São principalmente fontes do rock alternativo pós punk, da MPB pós tropicalista influenciada pelo rock e pela contracultura, e do rock psicodélico e progressivo.

05) RM: Quando, como e onde você começou sua carreira musical?

Edson Leão Ferenzini: Participando de festivais de música estudantis em Juiz de Fora – MG, nos anos 80, principalmente com a banda Eminência Parda, que na época, misturava influências de pós punk, MPB e neopsicodélica.

06) RM: Quantos CDs lançados?

Edson Leão Ferenzini: São nove álbuns. Dois álbuns autorais e um de releituras além de duas coletâneas de bandas, com a banda Eminência Parda. Um álbum com a Banda Sambavesso. Um álbum com o bloco Parangolé Valvulado. Um álbum lançado nas plataformas com o grupo “Ou Sim”. 

O álbum solo – “Mundos Achados & Perdidos – Tocando o Solo”, as letras trazem reflexões sobre os impasses que estamos deixando para as próximas gerações quanto à criação de um mundo mais solidário (Pronunciamento), um convite à reconstrução e esperança num mundo pós pandemia do covid-19 (Lullaby – canção de acordar), um comentário irônico sobre as perdas e descobertas de se encarar o momento presente como um santuário no meio do caos (faixa título). Também reflete sobre tentativas mundiais reviver valores arcaicos.

Influenciado pelo mote “todo mundo quer saber com quem você se deita/ nada pode prosperar”, “Última Sessão de Cinema”, usa do lirismo e da leveza de amantes que pegam a estrada de uma cidade do interior para se livrarem “dos olhos que falam demais”, para lembrar que ainda vivemos numa sociedade que ainda teima em policiar o prazer alheio.

Em “Da Aldeia”, o termo aldeia é tratado de forma polissêmica. É tanto a “aldeia global”, quanto os diversos obscurantismos que tentam promover retrocessos e massacres, mas também remete às culturas originais como fontes de alternativas e resistência. “O Rato Roeu” e “Ruas” completam a série de canções “da aldeia”, alegorizando a fragilização das democracias e ampliação do abismo das desigualdades e da indiferença.

“Manual” é um experimento poético e sonoro em diálogo com a faixa de abertura (Pronunciamento) enquanto “Digitália” faz um extenso inventário irônico da nossa condição de seres inevitavelmente cibernéticos, em cima de uma base composta a partir da manipulação de samples de Hurdy Gurdy (instrumento medieval muito usado por grupos de música folk europeia), numa contraposição irônica entre cyber e ancestralidade folk. Com interversões vocais de Patrícia Almeida ela se funde com os experimentos rítmicos e vocais de “Fragmentos Sobre esta noite”.

Produção, arranjos finais e execução: Julião Júnior. Produção executiva, arranjos de base, e voz: Edson L.F. Participação Especial: Patrícia Almeida, que contribuiu também em experimentos audiovisuais que resultaram em três das faixas, participaram também da vídeo/poeta, os experimentos rítmicos e vocais que serviram de base para a canção “Fragmentos sobre essa noite” (minha melodia e letra). Além de ter participado com opiniões e experimentos na busca de conceitos e soluções para a ilustração do álbum, finalizada pelo cantor, a partir de colagem e customização de imagens. “Mundos Achados & Perdidos/Sobretudo” (Edson / Patrícia Almeida).

Com a banda Eminência Parda: – Álbum – Cadeira (1994). Um primeiro disco no formato CD, lançado por um grupo da Zona da Mata Mineira. Coletânea Cultural Bar – (1999). Projeto coletivo. Álbum – Cidade sob a Chuva (2002). Álbum – Impressões de Viagem, Brasil 70 (Releituras) e DVD Impressões de Viagem (ao Vivo) (2008). Álbum Coletânea Cultural Bar II. Coletivo. Álbum Avohai 40 anos Remake Pop Rock (2018). Uma coletânea comemorativa dos 40 anos do primeiro álbum de Zé Ramalho, com seleção do próprio artista e a escolha da versão da Eminência Parda, de Avohai, como abertura do álbum.

07) RM: Como você define seu estilo musical?

Edson Leão Ferenzini: Um rock apaixonado pela música popular brasileira e que se permite projetar pontes.

08) RM: Você estudou técnica vocal?

Edson Leão Ferenzini: Sim.

09) RM: Qual a importância do estudo de técnica vocal e cuidado com a voz?

Edson Leão Ferenzini: É algo libertador que te ajuda a expressar com mais naturalidade sua arte.

10) RM: Quais as cantoras (es) que você admira?

Edson Leão Ferenzini: Atualmente eu tendo a gostar mais do canto que se aproxima da naturalidade da fala, como ensinou João Gilberto, entre eles Vitor Ramil, Gilberto Gil, Caetano Veloso.  Gosto também da força telúrica das vozes de Alceu Valença, Fagner, Ednardo.  Também a passionalidade Rock ‘n’ roll de figuras como Jim Morrison, Bono Vox, Renato Russo, Eddie Vedder. Das cantoras, Baby do Brasil, Olívia Byington, Vania Bastos, Ná Ozzetti… o Brasil é muito rico nesse campo.

11) RM: Como é seu processo de compor?

Edson Leão Ferenzini: Já experimentei diferentes formas: colocar melodia em letras de parceiros (as); escrever letras que ganharam melodias por outros parceiros (as); compor letra e melodia simultaneamente, às vezes a partir da sonoridade das palavras entoadas e que acabam sugerindo ideias de tema; criações coletivas em que todo mundo opina na letra e na melodia. Recentemente experimentei também criar bases no computador e improvisar com a “máquina”, criando “entoações” a partir de textos que me pareciam dialogar com a sonoridade das bases. Às vezes brincava definindo esse método como Cyber folk.

12) RM: Quais são seus principais parceiros de composição?

Edson Leão Ferenzini: Principalmente integrantes de grupos dos quais participo ou participei. Minha irmã Valéria Leão Ferenzini foi uma das primeiras parcerias, contribuindo com letras densas e poéticas primeiro para a banda Eminência Parda, depois para o grupo “Ou Sim”, no álbum “Música, poesia e outras esquinas”, onde também tenho parcerias com Bruno Tuler. A banda Eminência Parda gerou parcerias com os guitarristas Danniel Goulart e Wesley Carvalho e com o baterista Marcelo Panisset. Já “O Fusca Voador” nasceu em função de uma série de parcerias com o gaúcho Arnaldo Huff. Por sua vez o Bloco Parangolé Valvulado tem um processo coletivo de composição, mas acabou também me aproximando de criadores ligados aos sambas como Carlos Fernando Cunha, Roger Resende e Dudu Costa. No meu álbum solo – “Mundos Achados & Perdidos – Tocando o Solo” tiveram um papel fundamental as parcerias com a poeta Patrícia Almeida e a parceria de produção com Julião Jr.

13) RM: Quais os prós e contras de desenvolver uma carreira musical de forma independente?

Edson Leão Ferenzini: Ponto positivo é a autonomia estética e não depender da benção das multinacionais do mercado fonográfico para se expressar.  Mas as chances de visibilidade são restritas, porque são raros os casos em que um trabalho realmente viraliza espontaneamente. O mercado de música popular é movido a dinheiro, repercutir nas redes exige impulsionamento, compra de espaços grana gerando grana. É um jogo pesado para um artista independente. Daí a necessidade de Leis de incentivo.

14) RM: Quais as vantagens e desvantagens do acesso à tecnologia de gravação (home estúdio)?

Edson Leão Ferenzini: Meu primeiro álbum, “Mundos Achados & Perdidos – Tocando o Solo”, só foi possível graças as novas tecnologias. Ele nasceu do distanciamento social gerado pela pandemia do covid-19, além de ser um comentário sobre aquele momento. Com as bandas paradas, comecei criar ao notebook e ao celular, vídeos e áudios que se tornaram os esboços dos arranjos do álbum. Depois consegui uma verba da Lei Aldir Blanc Minas Gerais, para viabilizar a finalização com um mago dos estúdios, o produtor e guitarrista, Julião Jr., que reelaborou e executou os arranjos definitivos.

A maior parte do processo, foi feito à distância, com trocas de arquivos via internet e longas conversas virtuais para afinar as ideias. O resultado superou muito minhas expectativas. Sobre o lado negativo das tecnologias, talvez fiquem por conta do excesso de informações, que faz com que muita gente não dê conta de ir além das canções de três minutos, o que não é novidade na história da música pop, mas é no mínimo curioso, já que a maior parte gasta o fim de semana maratonando séries de 7 temporadas (risos).

15) RM: No passado a grande dificuldade era gravar um disco e desenvolver evolutivamente a carreira. Hoje gravar um disco não é mais o grande obstáculo. Mas, a concorrência de mercado se tornou o grande desafio. O que você faz efetivamente para se diferenciar dentro do seu nicho musical?

Edson Leão Ferenzini: Tento uma comunicação mais honesta e próxima ao meu público, sem tentar criar uma fachada ascética de profissionalismo. Nas redes sociais eu tento expressar o que eu penso da forma mais clara sem agredir quem pensa diferente, mas sem ocultar meus pontos de vista sobre música, arte, política e vida. Mas não penso nisso como estratégia de mercado, até porque o mercado só parece entender uma estratégia: grana, muita grana, que gere mais grana, que pague novas estratégias de como gerar mais grana. Não vejo muita eficácia em estratégias, então tento ser eu mesmo, e curtir a possibilidade de convívio virtual com público, como experiências de vida mais do que como estratégia, embora é lógico que eu quero que as pessoas apareçam nos shows também (risos).

16) RM: Como você analisa o cenário da Música Popular Brasileira. Em sua opinião quais foram as revelações musicais nas últimas décadas? Quais artistas permaneceram com obras consistentes?

Edson Leão Ferenzini: Vi outro dia uma música do gaúcho Vitor Ramil na propaganda de uma novela. Ele é um artista que segue firme com uma consistência musical e poética, desde os anos 80, e sem a grande mídia. Nas últimas décadas o circuito independente é que tem apresentado as melhores novidades só que muitas já viraram décadas sem chegar a um público mais amplo, permanecem artistas de nicho. Bandas como The Baggios, Francisco El Hombre, artistas como Caio Prado, Criolo, Liniker.

Mas a verdade é que as cenas regionais produzem muito mais do que mercado absorve. Poderia fazer uma lista extensa só da minha aldeia e região: Roça Nova, Tata Chamas e as Inflamáveis, Parangolé Valvulado, A Zagaia, Danniel Goulart, Luizinho Lopes, Laura Jannuzzi, Roger Resende, Carlos Fernando Cunha, Wesley Carvalho, Juliana Stanzani, Assombro de Bicho, Marco Antônio Bouquard ( https://ritmomelodia.mus.br/entrevistas/marco-antonio-bouquard ). Teria muitos outros nomes e isso, só em uma região de um estado gigante como Minas Gerais. Imagine qual a realidade do Brasil!

17) RM: Quais as situações mais inusitadas aconteceram na sua carreira musical (falta de condição técnica para show, brigas, gafes, show em ambiente ou público tosco, cantar e não receber, ser cantado etc)?

Edson Leão Ferenzini: Com a banda Eminência Parda tocamos muito em cidades menores, fazendo o nosso som, Rock com um pé na MPB 70, e eventuais releituras nessas linhas. Um momento que foi sintomático de que o Brasil estava caminhando para uma monocultura musical tóxica, foi quando numa dessas cidades, um grupo de caras subiu a escada do palco ameaçando de forma agressiva a nossa banda, caso não tocássemos músicas Sertanejas. Não me lembro como saímos dessa, já que até hoje não tocamos nada dessa praia, mas deu pra sentir que algo não ia bem no país da diversidade musical e social. Vejo hoje como prenúncio do buraco em que o país se enfiaria tempos depois em vários sentidos. Mas em geral, até era divertido e legal, mesmo enfrentando às vezes situações precárias.

18) RM: O que lhe deixa mais feliz e mais triste na carreira musical?

Edson Leão Ferenzini: É realizador perceber que seu trabalho teve um efeito psicológico genuíno em algumas pessoas, seja uma multidão ou um grupo restrito. O que mais entristece é ver a música de tantos artistas que admiro não chegar a boa parte do grande público, por culpa das manipulações mafiosas do mercado.

19) RM: Existe o Dom musical? Como você define o Dom musical?

Edson Leão Ferenzini: Acho que existe, em parte o Dom. Algumas pessoas tem uma facilidade muito grande, mas outras têm uma força de vontade que supera as aparentes limitações. Acredito que em certo grau o suposto dom, pode ser desenvolvido, aprimorado.  Só que isso não muda o fato de que existe um Hermeto Paschoal, que parece estar em outro plano de relação com a música.

20) RM: Qual é o seu conceito de Improvisação Musical?

Edson Leão Ferenzini: Fluir com o momento musical.

21) RM: Existe improvisação musical de fato, ou é algo estudado antes e aplicado depois?

Edson Leão Ferenzini: No meu trabalho em bandas de rock, que não eram grupos jazzistas, sempre vi o improviso como algo genuíno que brota naturalmente quando o momento pede. Ele não é ensaiado, mas o ensaio, no sentido de entrosamento da banda, domínio da estrutura básica do arranjo, é fundamental. É o ensaio que vai te dar tranquilidade para deixar o improviso fluir quando tem que fluir.  É um pouco, como o que o Osho fala sobre o Tao, que seria se deixar levar naturalmente pelo “caminho”. Só que a maioria, antes de se deixar levar pelo caminho, precisa da segurança de uma técnica, até que num momento, se entrega ao improviso, que é gingar com a vida. O improviso musical não ensaiado, é se entregar ao fluir do momento.

22) RM: Quais os prós e contras dos métodos sobre Improvisação musical?

Edson Leão Ferenzini: Desenvolver a capacidade de improvisação é algo positivo inclusive para a criação. Os contras só existem se faltar o bom senso, que é respeitar o que a música pede. A sensibilidade sempre tem que estar à frente do exibicionismo e do ego do músico.

23) RM: Quais os prós e contras dos métodos sobre o Estudo de Harmonia musical?

Edson Leão Ferenzini: Acho que todo aprendizado é bem-vindo, mesmo se sua opção estética for por formas musicais mais simples, como no campo do rock alternativo derivado do punk e do pós-punk. Sempre pode abrir perspectivas para novos experimentos e inovações. O único contra que vejo, é, muitas vezes a ideia de que, por exemplo, um roqueiro deva obrigatoriamente “evoluir”, para usos harmônicos mais elaborados e em última instância, se tornar um jazzista. A desvalorização da eficácia estética da simplicidade, me parece tão tola quanto a obrigatoriedade comercial de se fazer músicas de duração de três minutos e quatro acordes para entrar no mercado. Você tem exemplos de excelência estética e eficácia mercadológica tanto em obras que primam pela simplicidade, quanto pela elaboração melódica e harmônica. O que falta é mercado menos viciado em fórmulas e regras.

24) RM: Você acredita que sem o pagamento do jabá as suas músicas tocarão nas rádios?

Edson Leão Ferenzini: No modelo atual, não. Mas não concordo com a ideia de que a realidade atual é a única possível. Na década de 80 rádios como a Fluminense FM, de Niterói abriam sua programação para fitas demo de bandas novas. Foi assim que nomes como Legião Urbana, Paralamas do Sucesso, Celso Blues Boy, Picassos Falsos, conseguiram chamar a atenção do público e das gravadoras. Num cenário mais regionalizado, com a banda Eminência Parda, chegamos a ter faixas executadas em rádios locais sem pagar nada. São realidades possíveis, mas é preciso que se coloque mais o dedo na chaga que se tornou a indústria cultural em sintonia com todas as irregularidades mafiosas que se espalharam por praticamente todos os setores da vida brasileira.

25) RM: O que você diz para alguém que quer trilhar uma carreira musical?

Edson Leão Ferenzini: Se organize o máximo que puder. O artista hoje tem que conhecer o máximo que puder de todas as etapas da gestão de uma carreira e não vou mentir que isso seja fácil, porque é preciso conciliar alguma visão empresarial sem sufocar o lado criativo, lúdico, experimental, aberto aos riscos, sem o qual você vira um burocrata da arte. Não me considero um exemplo nesse campo, mas reconheço que essa é a realidade.

26) RM: Festival de Música revela novos talentos?

Edson Leão Ferenzini: É um mecanismo que permite que alguns compositores talentosos que dominam formatos consagrados da MPB tenham um relativo reconhecimento. Acho que são válidos, mas em geral, são limitados. Por um lado, por não ter muita abertura a abordagens mais experimentais ou renovadoras. Funcionam mais como espaços de preservação de tradições. Outra limitação que vejo hoje é que o formato festival surgiu ligado às emissoras de TV dos anos 60, que amplificavam a repercussão dos mesmos e serviam de vitrine para os novos artistas chegarem às gravadoras. Essa cadeia se rompeu há muito tempo, o que limita a repercussão atual dos festivais, embora eles ainda tenham um papel cultural que merece respeito.

27) RM: Como você analisa a cobertura feita pela grande mídia da cena musical brasileira?

Edson Leão Ferenzini: A cobertura feita pela grande mídia da cena musical brasileira é conservadora, que não admite riscos e sem riscos não há criação, só redundância. Ela se fechou em certos nichos muitas vezes pré-fabricados para ter um apelo mais imediato, ou então na cobertura sobre nomes consagrados da MPB e do Pop Rock de outras décadas. Quando entra algum nome novo, em geral, é porque se destacou através das redes sociais e já “bombou”. Os grandes meios de comunicação têm contribuído pouco para a renovação e em geral têm um faro bem limitado para o novo.

28) RM: Qual a sua opinião sobre o espaço aberto pelo SESC, SESI e Itaú Cultural para cena musical?

Edson Leão Ferenzini: A circulação dos trabalhos é um dos principais problemas, todo espaço é bem-vindo.

29) RM: Como você analisa o cenário do Rock no Brasil. Em sua opinião quais foram as revelações musicais nas últimas décadas? Quais artistas permaneceram com obras consistentes?

Edson Leão Ferenzini: No campo específico do rock, admiro muito a consistência da trajetória da banda The Baggio’s. É um grupo que já atravessou década com álbuns relevantes e em geral, fora da grande mídia. Respondendo em termos de últimas décadas gostei muito também dos mineiros do Porcas Borboletas, Tata Aeroplano e o grupo Cérebro Eletrônico, dos gaúchos do Subtropicais, Francisco El Hombre, El Efecto, Terra Celta

Da ala feminina, sem me prender ao rock, Letrux, Papisa, a veteranas Kátia de França e Alzira Espíndola, a lista é imensa. Mas vários outros grupos e artistas seguem firmes e consistentes em várias áreas, assim como a renovação também não para. A verdade sobre o rock no Brasil (e que vale para outras áreas) é que nunca parou, talvez tenha deixado de ter cara de bandido, como definiu Rita Lee, mas poucas vezes foi realmente mainstream e quando foi, na maioria das vezes sofria pressões para domesticar sua estética.

Enfim, parece que o Brasil sempre teve uma das produções musicais mais ricas e diversificadas do mundo e infelizmente, um dos mercados mais deficientes em saber lidar com essa diversidade. O rock sofre com essa deficiência assim como a MPB, e outras áreas que não sejam a “bola da vez” para quem paga.

30) RM: Quais os seus projetos futuros?

Edson Leão Ferenzini: Dentro do meu trabalho solo, prosseguir a divulgação, do álbum “Mundos Achados & Perdidos – Tocando o Solo” e da filmagem do show baseado no álbum (que foi viabilizado através da Lei Municipal de Incentivo à Cultura Murilo Mendes, da Prefeitura de Juiz de Fora – MG). Também buscar verbas para viabilizar a circulação do show e para um segundo álbum. A retomada de outros trabalhos autorais coletivos que estavam em pauta, como o primeiro álbum do grupo Fusca Voador e um novo álbum da banda Eminência Parda que segue se apresentando desde o fim do distanciamento social causado pela pandemia do covid-19, assim como a banda do Bloco Parangolé Valvulado. Além de minha colaboração na escrita do Rock: o livro, juntamente com Rita Almico, Valéria Leão Ferenzini, Fernando Gaudereto Lamas, Luiz Fernando Saraiva & Ricky Goodwin: https://lojahucitec.com.br/rock-o-livro

31) RM: Quais seus contatos?

Edson Leão Ferenzini: (32) 99102 – 1530 | [email protected] | https://www.instagram.com/edsonleaoferenzini

Canal: https://www.youtube.com/@edsonleaoferenzini 

Artesãos do Futuro (Inédita). Dedicada às pessoas que fazem de suas vidas a arte de projetar futuros: https://www.youtube.com/watch?v=2szH1LyzcGM

Playlist do álbum “Mundos Achados & Perdidos – Tocando o Solo”: https://www.youtube.com/watch?v=TDP-VQKRVuQ&list=OLAK5uy_naUWiKp8Hr2Vwlnq9l86PWd-_IWtS2i-E 

Show do “Mundos Achados & Perdidos – Tocando o Solo”: https://www.youtube.com/watch?v=DySrNrVFgOY&list=PL7O41ZfAl_Q2LKG9fXG2s1qnhDOXNv-jq 

Playlist do álbum Cidade sob a chuva da banda Eminência Parda: https://www.youtube.com/watch?v=73haPOOsSjM&list=PL7O41ZfAl_Q3F0UreEHfopmozuV7L_4VQ 

O “Mundos Achados & Perdidos – Tocando o Solo” nas principais plataformas: https://tratore.ffm.to/mundosachadoseperdidos-tocandoosolo  

Playlist da coletânea com músicas do Zé Ramalho: https://www.youtube.com/watch?v=P3IiRnxHJ-Q&list=PLyzPWoQvJ2TjjSL7u1zHhi0CU5TdW7NTw 

Playlist do álbum de releituras do Eminência: https://www.youtube.com/watch?v=9SIREeufhAE&list=OLAK5uy_moZOfrV_qJj50b0LOYwohhVJfqXj4pbI0 

Playlist do álbum do Ou Sim – Música, Poesia e outra esquinas: https://www.youtube.com/watch?v=G2y1H-yxbxI&list=PL5dLgq2ZnONyfsGHRaKjuOe-ND6B5nhoe 

Playlist do Sambavesso – Ópera do Mané: https://www.youtube.com/watch?v=sTJsFApyAkQ&list=OLAK5uy_ksLF8MRQnE1o-9Uhmbi_pMx545Exr_e4U 

Playlist do Parangolé Valvulado – 10 anos: https://www.youtube.com/watch?v=3t657IiyZpQ&list=PL9wlaG8-cxC3GhxkvUrlmYgxlk6MdZpKh 

Algaravia – Roger Resende/Edson Leão/Kadu Mauad: https://www.youtube.com/watch?v=WhN1soGtlC0 

Algaravia (Roger Resende / Kadu Mauad) Xote Blues: https://www.youtube.com/watch?v=eSdBzDIdl1I  

Cavaco Madeira – Carlos Fernando – Edson Leão: https://www.youtube.com/watch?v=aaESWZfA00I 

Ócio Criativo – Carlos Fernando – Edson Leão: https://www.youtube.com/watch?v=rhJZVyJUmYE


Compartilhe conhecimento

Comments · 2

Deixe um comentário

*

Uma Revista criada em 2001 pelo jornalista, músico e poeta paraibano Antonio Carlos da Fonseca Barbosa.