O cantor, compositor, baixista e produtor musical maranhense Gerson da Conceição é graduado em Música pela FPA – Faculdade Paulista de Artes.
Tem no seu currículo gravações com artistas como Zeca Baleiro, Rita Ribeiro (Benneditto), Banda Black Rio e Tribo de Jah. É o líder da banda Mano Bantu, com três álbuns gravados: “NÊGO BANTO”, pela CIA PAULISTA DE HIP- HOP; “MANO BANTU”, pela multinacional WARNER MUSIC e “NRG”, por SOUND SYSTEM BRAZIL/POR DO SOM.
A banda já dividiu o palco com grandes nomes do reggae internacional como os jamaicanos: “U Roy”, Clinton Fearon e a cantora inglesa Sylvia Tella. Como produtor musical assinou os arranjos e direção musical da faixa “Último Post”, do Álbum – “O disco do ano”, do artista Zeca Baleiro lançado pela SOM LIVRE e que tem participação especial da cantora Margareth Menezes.
Produziu em parceria com Edu Zappa, a trilha sonora do curta “Jardim Beleléu”, do diretor Ari Candido Fernandes. Uma homenagem ao compositor Itamar Assumpção, que tem no elenco os atores José Wilker, Flavio Bauraqui e Thalma de Freitas e que recebeu premiações em festivais de curtas em Nova York e San Diego (EUA).
Atualmente Gerson está finalizando as gravações do seu novo projeto musical, em parceria com Jahgun, NEW ROCKARS, uma banda cujo repertório remete a cena “Old school do reggae jamaicano”, com sonoridades atualizadas e textos recheados de romantismo e positividade e que teve sua estreia no verão de 2015 no Festival Reggae On The Mountain e abrindo o show da turnê Americana, da renomada banda jamaicana THIRD WORLD, ambos em Los Angeles, Califórnia.
Segue abaixo entrevista exclusiva com Gerson da Conceição para a www.ritmomelodia.mus.br , entrevistado por Antonio Carlos da Fonseca Barbosa em 10/03/2018:
01) Ritmo Melodia: Qual a sua data de nascimento e a sua cidade natal?
Gerson da Conceição: Nasci no dia 10/03/1967 em São Luís (MA).
02) RM: Conte como foi o seu primeiro contato com a música?
Gerson da Conceição: Desde criança gostava de ver as manifestações folclóricas do Estado do Maranhão como bumba meu boi e tambor – de – crioula, depois quando adolescente comecei a tocar gaita de boca.
03) RM: Qual a sua formação musical e acadêmica fora música?
Gerson da Conceição: Estudei Engenharia Mecânica na UEMA – Universidade Estadual do Maranhão, mas não conclui o curso. Graduei-me em Licenciatura em Música em São Paulo, pela FPA – Faculdade Paulista de Artes.
04) RM: Quais suas influências musicais no passado e no presente? Quais deixaram de ter importância?
Gerson da Conceição: As mais diversas, desde a música erudita, quando estudava Violão Clássico na escola de música do Estado do Maranhão, ao jazz. Desde a Bossa Nova a música cubana e jamaicana. Todas essas influências prevalecem até hoje.
05) RM: Quando, como e onde você começou a sua carreira musical?
Gerson da Conceição: Quando ainda estudante de engenharia, eu comecei a dar aulas em escolas públicas e particulares, prefeitura para sobreviver. Trabalhei também como bancário, depois que veio um envolvimento mais profissional como músico, acompanhando como baixista maior parte dos artistas da cena local na década de 1990.
06) RM: Quantos álbuns lançados?
Gerson da Conceição: Três álbuns lançados: Nêgo Banto (1999), pela cia paulista de hip hop; Mano Bantu (2001), pela Warner Music; NRG (2004), por sound system brazil/por do som. Os dois primeiros álbuns a formação original da banda Mano Bantu: Eu, Moisés Mota, Celso Franca, Edu Zappa, Edu Oliveira, Rodrigo Loli.
No último disco da banda Mano Bantu, além de Eu, Edu Zappa e Rodrigo Loli, Vandinho e Thiaguinho Silva, ambos são bateristas. Participações especiais da cantora inglesa Sylvia Tella, do William Magalhães da banda Black Rio e do Digitaldubs mixando uma música. Tanto no primeiro quanto no segundo álbum há uma predominância do estilo Lovers Rock que era uma tendência muito conhecida nas Radiolas do maranhão.
Já no terceiro álbum já tem umas experimentações de sonoridades mais DUB e eletrônicas, mas ainda assim prevalece o Lovers Rock. No primeiro álbum as músicas: “Down down” e “Lady”, que são muito conhecidas tocaram em São Paulo, Maranhão e em outros Estados. E “Down down” teve um clip na MTV. Do álbum – NRG, “Vou te levar” ganhou prêmios da música mais executada nas Rádios.
07) RM: Como você define o seu estilo musical dentro da cena reggae?
Gerson da Conceição: É complicado rotular um estilo, mas acho que sempre trabalhei com DUB, Lovers e rocksteady.
08) RM: Como você se define como cantor/intérprete?
Gerson da Conceição: Sempre um aprendiz.
09) RM: Quais os cantores e cantoras que você admira?
Gerson da Conceição: A minha cabeça musical sempre foi eclética, imagina quantos cantores admiro, e incontável, vai de Bob Marley, Gilberto Gil a Steve Wonder, Fela Kuti, Billy Holiday, Aretha Franklin, Madonna, Marvin Gaye, etc…
10) RM: Quem são seus parceiros em composições?
Gerson da Conceição: Meus parceiros musicais são: Zeca Baleiro, William Magalhaes, Otto, César Nascimento, Gerude, etc…
11) RM: Quais os prós e contras de desenvolver uma carreira musical de forma independente?
Gerson da Conceição: Música no Brasil e muito difícil, sempre lidamos com dificuldades, mas também tem vitórias, e essas vitórias que o incentivam a continuar na caminhada.
12) RM: Quais as ações empreendedoras que você pratica para desenvolver a sua carreira musical?
Gerson da Conceição: O artista tem que gerenciar sua obra, se não está fodido. As redes sociais ajudam o perfil do artista no facebook, canal no youtube, etc.
13) RM: Como você analisa o cenário reggae brasileiro? Em sua opinião quem foram às revelações musicais nas duas últimas décadas e quem permaneceu com obras consistentes e quem regrediu?
Gerson da Conceição: Tem uma turma muito boa. Tem o Flayom Rodrigues do Rio de Janeiro cujo disco está muito bom. Em São Paulo gosto muito do Veja Luz, Leões de Israel que tem um trabalho de muita qualidade liderado pelo grande Edu Satajah, ótimo baixista.
14) RM: Quais as vantagens e desvantagens do acesso à tecnologia de gravação (Home Studio)?
Gerson da Conceição: É ótimo poder ter um home studio em que possa fazer suas pré-produções em casa, mesmo que tenha depois que terminar em um studio mais profissional.
15) RM: Qual ou quais os músicos já conhecidos do público que você tem como exemplo de profissionalismo e qualidade artística?
Gerson da Conceição: Tem muita gente boa por aí, e difícil falar. Quem trabalha sério sempre tem a possibilidade de se dá bem profissionalmente, embora as vezes as oportunidades não são dadas a todos.
16) RM: Quais as situações mais inusitadas aconteceram na sua carreira musical (falta de condição técnica para show, brigas, gafes, show em ambiente ou público tosco, cantar e não receber, ser cantado e etc)?
Gerson da Conceição: Todas essas situações acontecem para quem lida no mercado musical.
17) RM: O que te deixa mais feliz e mais triste na carreira musical?
Gerson Conceição: Feliz de compartilhar a música com quem está nela por amor e contribui para o crescimento. E, triste pelos que só criticam e nada fazem, mas nem tudo é perfeito, temos que fazer a nossa parte.
18) RM: Nos apresente a cena musical na cidade que você mora?
Gerson da Conceição: Moro em São Paulo, é um mundo e tem muita coisa difícil de descrever em poucas palavras.
19) RM: Quais os músicos ou/e bandas que você recomenda ouvir?
Gerson da Conceição: Flayom Rodrigues, Criolina, Vila Verde, Veja Luz, Dicy Rocha.
20) RM: Quais os cantores e cantoras que gravaram as suas canções?
Gerson da Conceição: Zeca Baleiro, Banda Black Rio, Silvya Tella, Célia Sampaio, Dicy Rocha, Criolina, etc…
21) RM: Você acredita que sem o pagamento do jabá as suas músicas tocarão nas rádios?
Gerson da Conceição: Minha música já tocou na rádio sem pagar o jabá.
22) RM: O que você diz para alguém que quer trilhar uma carreira musical?
Gerson Conceição: Estude, dedique-se, perseverança e muito trabalho.
23) RM: Como você analisa a relação que se faz do reggae com o uso da maconha?
Gerson da Conceição: O reggae antes de se tornar popular foi e ainda é muito discriminado como, era no Maranhão, como música de preto, de pobre e de maconheiro, claro que já ganhou mais respeito.
24) RM: Como você analisa a relação que se faz do reggae com a religião Rastafari?
Gerson da Conceição: Englobando a pergunta anterior é claro que o reggae está relacionado com a maconha e ao rastafarianismo, pois o rei do reggae, Bob Marley sempre defendeu as ideias de Marcus Garvey, que profetizou a vinda de um deus negro que seria a redenção do povo africano disperso pelo mundo. Com a coroação de Haile Salassie como Imperador da Etiópia em 1930.
É como se a profecia tivesse sido cumprida. Mas mesmo na época do SKA, quando os Twincle Brothers gravaram “Oh Caroline”, foram acompanhados pela Orquestra de Nyahbinghi, do Countie Ossie, cuja filosofia musical era rastafári, aliás a origem do próprio nome vem de Ras Tafari Makonen que era o nome de Haile Salassie.
E não devemos esquecer que depois da expulsão dos espanhóis pelos ingleses, na Jamaica do século 20 e a chegada da igreja batista o sincretismo era permitido, ou seja, os marroons povos escravos na Jamaica, desde que fizessem os seus trabalhos, poderiam cultuar seus deuses africanos através de seus cultos como a pokomina, cumina.
Então aí já se percebe os sinais dessa relação antes mesmo do surgimento do SKA que vai se transformar em reggae, passando pelo rocksteady, numa evolução musical em que o contexto religioso está inserido, desde o fundamentalismo da igreja batista ao culto rastafári Nyabinghi.
25) RM: Você usa os cabelos dreadlock. Você é adepto a religião Rastafari?
Gerson da Conceição: Sou rastafári, pelo ideal de paz, de construção. Mas sou cristão, acredito em Deus e Jesus Cristo. Mas acho perigoso quem usa a fé para ganhar dinheiro.
26) RM: Os adeptos a religião Rastafari afirmam que só eles fazem o reggae verdadeiro. Como você analisa essa afirmação?
Gerson da Conceição: Ainda não sabia dessa afirmação, mas ninguém é dono da verdade.
27) RM: Na sua opinião porque o reggae no Brasil não tem o mesmo prestígio que tem na Europa, nos EUA e no exterior em geral?
Gerson da Conceição: Estive na Califórnia, em Los Angeles e realmente, lá existem muitos festivais de reggae, assim com na Europa. Acho que pode ser uma questão de organização, de se criar mais festival sério, não só de reggae, mas de música, pode ser de jazz, de música africana, etc.
Há exemplo do que acontecem nesses países ou continentes, mas no Brasil a gente sofre as consequências de uma manipulação midiática, em que o que toca no Rádio, ou se vê na TV é o que tem espaço, aí só Sertanejo Universitário e “ô caralho”.
Nada contra ninguém, mas acho que deveria se democratizar mais a cultura, estudar tanto a obra de Tchaikovsky nas Escolas Públicas, como Djavan, Tom Jobim, Jackson do Pandeiro, para a gente ter um povo mais rico culturalmente.
Se alguém quer ouvir Música Sertaneja, tudo bem: escute. Mas saiba que existe uma banda Black Rio, que é mais conhecida na Europa que no Brasil. Mas é como Darcy Ribeiro falou: o povo brasileiro não conhece o Brasil.
E alguns se intitulam brancos e odeiam negros e nordestinos, mal sabendo eles que a mãe brasileira é índia, segundo o próprio antropólogo Darcy Ribeiro. Falta mais cultura, mais informação e pesquisa e respeito ao próximo.
28) RM: Quais os prós e contras de usar o Riddim como base instrumental?
Gerson da Conceição: A cultura do riddim está no começo do reggae, a partir da época do SKA e rocksteady, aliás o DUB e o toast ou deejaying, protagonizados por King Tubby e U-roy, respectivamente, no sound systen nesse período, deram origem a elementos da atual música pop como RAP e a própria música eletrônica. Desde que haja democratização e não tire espaços de bandas, mas que some com as bandas, acho saudável.
29) RM: Você faz a sua letra em cima de um Riddim já conhecido usando uma linha melódica diferente?
Gerson da Conceição: Não. Geralmente crio meus riddims e melodias, obviamente com influência do que já existe. Mas sempre me dou ao cuidado de ver se parece com algo que já existe.
30) RM: Você acrescenta e exclui arranjos de um Riddim já conhecido?
Gerson da Conceição: Não me lembro de ter usado riddims já conhecidos, me lembro de uma frase que usei de um clássico jamaicano, uma linha de metais que usei numa produção minha, no disco do Jai Mahal, mas como música incidental.
31) RM: Quais os prós e contras de fazer show usando o formato Sound System (base instrumental sem voz)?
Gerson Conceição: Não vejo nada de ruim do formato Sound System.
32) RM: Qual o seu contato pessoal e profissional com Dionorina?
Gerson da Conceição: Já fiz arranjos para uma música do Dionorina no disco do Jahbolo, que eu produzi.
33) RM: Qual o seu contato pessoal e profissional com os membros da Tribo de Jah?
Gerson da Conceição: Além de amigos, já trabalhei com Fauzi fazendo a direção do projeto Soul Vibes em que viajamos para algumas apresentações na Califórnia (EUA).
34) RM: Qual o seu contato pessoal e profissional com Célia Sampaio?
Gerson da Conceição: Já produzi o primeiro single da Célia Sampaio, mulher negra e black power. Depois tocamos juntos e gravei as linhas de Baixos no seu primeiro CD. Em 2016 tocamos juntos no Sesc Consolação em São Paulo na Virada Cultural.
35) RM: Qual seu contato pessoal e profissional com Tony Tavares, já falecido?
Gerson da Conceição: Produzi o primeiro álbum do Tony Tavares.
36) RM: Qual seu contato pessoal e profissional com Santa Cruz?
Gerson da Conceição: Produzi o primeiro álbum de Santa Cruz.
37) RM: Quais os motivos que o levou a sair do grupo Mano Bantu?
Gerson da Conceição: Nunca sai do Mano Bantu (risos). Eu sou o “Mano Bantu”.
38) RM: Quais as dificuldades de cantar e tocar o Contrabaixo?
Gerson da Conceição: Não vejo dificuldade em cantar e tocar o Contrabaixo, pois é automático. O meu cérebro fica dividido em cantar e tocar o Baixo, mas é automático.
39) RM: Quais os motivos que o levou a escolher São Paulo para morar e trabalhar?
Gerson da Conceição: Queria dar um rolê e expandir um pouco mais a minha arte e aprender também. E escolhi São Paulo.
40) RM: Quais as diferenças de desenvolver uma carreira musical em São Paulo em relação a São Luís?
Gerson da Conceição: São Paulo é um grande centro, nos anos 60,70,80 todos vieram pro Sudeste: os novos baianos, os mineiros, o pessoal do Ceará etc. Nos grandes centros estava a comunicação com o mundo, mas com a globalização o mundo está dentro de casa.
E São Luís cresceu muito e tem uma cena musical muito interessante, com ótimos artistas e bandas e um grande Festival, BR-135, idealizados por Luciana Simões e Ale Muniz, que traz artistas de todo o país.
41) RM: Quais os prós e contras de desenvolver uma carreira musical em São Paulo?
Gerson da Conceição: Em qualquer lugar é difícil desenvolver uma carreira musical, tem que ter apoio artístico, financeiro e acima de tudo tem que ter muito trabalho.
42) RM: Quais os seus projetos futuros?
Gerson Conceição: Tenho muitos. Um deles é que estou finalizando o álbum do New Rockars, um projeto que tenho com Jahgun, em Los Angeles (EUA) em que nos apresentamos em 2015 em um grande Festival: Reggae on the Mountain e em Hermosa Beach, numa casa chamada Saint Rock em que abrimos o show do Third World.
*O músico, cantor e compositor maranhense Gerson da Conceição faleceu no dia 22/04/2019, aos 52 anos, em São Paulo. A causa da morte foi um infarto fulminante.
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