O compositor e pianista gaúcho Vitor Peixoto teve seu primeiro contato com o teclado aos 17 anos, aprendendo o instrumento como autodidata.
Ingressou em 1984 no curso de Composição e Regência da UFRGS. Em 1986 sua composição “Pequenas Variações” foi incluída no programa de recitais do pianista Hubertus Hofmann, na época, pianista titular da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre – OSPA.
Em seguida começou a acompanhar diversos artistas gaúchos, participando também de grupos de música instrumental como o grupo “Tocaia”, “Trio Jazzil”, “Quinteto Expresso” e “Jazz Noir”.
A partir de 1990, começou a produzir jingles e trilhas para o Rádio e TV, e também trilhas para grupos de teatro e dança. Participou em mais de 50 discos como pianista/tecladista e arranjador, e no segundo CD instrumental de Marcelo Corseti (1994) gravou a composição “Pirata”, de sua autoria.
Em 1997 foi convidado para ministrar o curso de “Teoria do Som e Música Eletrônica” em uma cadeira de Pós-Graduação na Universidade de Passo Fundo (UPF). Participou de dezenas de Festivais de música no Rio Grande do Sul, obtendo prêmios como “Prêmio Revelação” e “Melhor Instrumentista”. Em 2000, participou do “Festival da Música” da Rede Globo e em 2005 do “Festival Cultura – A Nova Música do Brasil”, ambos em São Paulo.
Em 2001, participa como instrumentista e arranjador no CD Paixão no Peito, de Renato Borghetti pela gravadora “Som Livre”. No mesmo ano, apresentou-se no Teatro San Martin em Buenos Aires, em um show de Marcelo Delacroix (prêmio Açorianos de 2001). Em 2002 passou a fazer parte da Hardworkind Band, gravando o 3o CD da banda junto à Orquestra da Ulbra.
Em 2003, participou nos CD’s instrumentais de Frank Solari e de Ângelo Primon. Em 2004, sua composição “Sonata n°1 (1988)” é interpretada em recitais no estado de São Paulo e na 5ª edição do Concurso Nacional de Piano de Música Brasileira “Maestro Spartaco Rossi” em Tatuí (SP), pelo pianista Domingos Sarto Neto, finalista deste concurso (3º lugar).
Em 2006, passou a fazer parte do Renato Borghetti Quarteto e desde então já realizou 25 turnês internacionais, apresentando-se em mais de 20 países europeus (Alemanha, Austria, Bélgica, Eslovênia, Finlândia, França, Holanda, Itália, Letônia, Luxemburgo, República Tcheca, Romênia, Suíça, Suécia, Portugal, Ucrânia, etc.) e também nos EUA, México, Canadá, Israel, Tunísia, Argentina, Colômbia e Uruguai.
Em 2007, foi indicado ao Prêmio Açorianos na categoria de “Melhor instrumentista popular” pela participação no CD “Cidade Baixa”, de Fausto Prado, e em 2017 como “Melhor instrumentista” pelo CD “Gaita na Fábrica,” de Renato Borghetti. Em 2011, o CD “Andanças – Live in Brussels” que gravou com Renato Borghetti Quartet em Bruxelas, foi indicado como um dos melhores CD´s do ano pelo jornal holandês “Het Parool” e pelo site italiano “All about Jazz”.
Em 2012 grava o DVD “Europa”, com o Renato Borghetti Quarteto, registrando duas turnês do grupo. Em 2012 o Renato Borghetti Quarteto abre o show de Robert Plant e em 2018 o show de Roger Waters, em Porto Alegre. Em 2015 participou de uma apresentação especial dos 20 anos da The Hard Working Band, em Porto Alegre, trazendo o cantor britânico Myles Sanko como convidado especial.
Em 2016 gravou o DVD / CD “Gaita na Fábrica”, com Renato Borghetti Quarteto, registrando sua composição “Forró pra Já”. Em 2017 participou de um show em Cartagena (Colômbia) com o Renato Borghetti Quarteto, o acordeonista francês Vincent Peirani e a orquestra jovem da Colômbia, retornando ao mesmo país em 2019, dessa vez no Teatro Colsubsidio, em Bogotá, com o quarteto.
No final de 2019 fez sua vigésima turnê europeia com o Renato Borghetti Quarteto, um pouco antes da chegada da pandemia do Coronavírus. Durante a pandemia começou a produzir vídeos para o seu canal no YouTube, lançando um crescente material na plataforma desde então: https://www.youtube.com/@VitorPeixoto
Segue abaixo entrevista exclusiva com Vitor Peixoto para a www.ritmomelodia.mus.br, entrevistado por Antonio Carlos da Fonseca Barbosa em 07/02/2025:
01) Ritmo Melodia: Qual a sua data de nascimento e a sua cidade natal?
Vitor Peixoto: Nasci no dia 20/03/1965, em Porto Alegre (RS). Registrado como Vitor da Silva Peixoto.
02) RM: Fale do seu primeiro contato com a música.
Vitor Peixoto: Embora eu não venha de uma família de músicos e tenha começado a tocar tarde, aos 17 anos de idade, a música sempre esteve muito presente em casa, pois meu pai (Claudio Antônio Ludwig Peixoto) era audiófilo e escutava o seu som diariamente. A variedade de discos que escutávamos era muito grande.
03) RM: Qual a sua formação musical e/ou acadêmica fora da área musical?
Vitor Peixoto: Tive meu primeiro contato com o teclado aos 17 anos de idade, aprendendo como autodidata. Aos 19 anos marquei aulas com uma professora de piano, com o intuito de aprender a ler partituras para poder passar no teste específico para a universidade de música da UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que exigia que fossem tocadas peças do repertório clássico na prova de admissão.
Em 1984, ingressei no curso de Composição e Regência da UFRGS, mas acabei cursando poucas cadeiras porque os convites para tocar com diversas bandas, somado ao trabalho que eu já começava a fazer com jingles, cresciam muito, fazendo com que eu faltasse frequentemente às aulas.
Estudei eletrônica também por alguns anos, trabalhando na área desde os meus 15 anos de idade, montando amplificadores valvulados, transistorizados e fazendo manutenção de equipamentos de áudio e telefones sem fio (esses telefones custavam na época algo em torno de 200 dólares, valendo a pena consertá-los).
04) RM: Quais as suas influências musicais no passado e no presente. Quais deixaram de ter importância?
Vitor Peixoto: Devido à grande diversidade de discos que o meu pai escutava em casa, as influências foram numerosas e de estilos diversos.
Ouvi muito: Guilherme Arantes, João Bosco, Lô Borges, Milton Nascimento, Tavinho Moura, Arrigo Barnabé, The Police, Quenn, Genesis, Hermeto Pascoal, Egberto Gismonti, Toninho Horta, etc.
Quanto aos compositores clássicos, além de Bach, que por incrível que pareça conheci primeiramente através dos sintetizadores do Walter Carlos, me atraiu especialmente os compositores do século XX, como: Prokofiev, Stravinsky, Bartok, Milhaud, Albert Roussel, Marcel Dupre, Alban Berg, Arthur Honegger, Paul Hindemith, etc.
Com a chegada das plataformas musicais, acabei conhecendo outros trabalhos muito interessantes como as bandas: Kaipa, Kenso, Frank Zappa, Allan Holdsworth, etc.
Sobre as influências que deixaram de ter certa importância, creio que mesmo as que eu tenha me afastado, de certa forma seguem presentes, seja na forma de tocar, nas concepções de arranjo, enfim, acho que tudo acaba somando à bagagem musical que vamos acumulando com o passar do tempo.
05) RM: Quando, como e onde você começou a sua carreira musical?
Vitor Peixoto: Logo após ter ingressado na universidade, em 1984, comecei a receber os primeiros convites de colegas para trabalhos profissionais e esses convites foram se multiplicando rapidamente. Embora a grande maioria dos músicos na universidade tivessem formação clássica, alguns dos estudantes vinham da música popular.
O primeiro grupo que participei foi na banda instrumental Tocaia, que tocava repertório próprio, onde também pude experimentar minhas composições.
Em seguida vieram convites para acompanhar diversos cantores, participar de festivais de música (muito comuns naquela época no Rio Grande do Sul), além de entrar em outras bandas instrumentais como: Trio Jazzil, Jazz Noir, Quinteto Expresso, Marcelo Corsetti, etc. Nessa época também trabalhei muito no meio publicitário, fazendo jingles e trilhas para o rádio e TV.
06) RM: Quantos álbuns lançados? Cite os álbuns que já participou como Tecladista/Pianista?
Vitor Peixoto: Participei em torno de 50 álbuns, sendo alguns desses em vinil. Quanto aos principais, poderia citar: Renato Borghetti Quarteto – Fandango (CD e DVD); Renato Borghetti Quartet in Brussels (CD); Renato Borghetti Quarteto Europa (DVD) ; Renato Borghetti Quarteto – Gaita na Fábrica (CD e DVD); Acqua, de Frank Solari (CD) ; Festival da Globo, 2000 (CD); Casa de Asas – Fausto Prado e Caetano Silveira (CD); Cidade Baixa – Fausto Prado e Caetano Silveira (CD); Flávio Adonis – Beijo de Bailarina (Vinil); Durante a pandemia também gravei alguns singles com composições próprias, que lancei nas plataformas digitais (Spotify, Amazon, etc.) e principalmente no meu canal do YouTube.
07) RM: Como é o seu processo de compor?
Vitor Peixoto: Trabalho de duas formas distintas. O primeiro processo é mais prático e consiste em ir experimentando e improvisando no instrumento algumas ideias que vêm à cabeça.
O segundo processo é mais lento e trabalhoso. Consiste em tentar criar e “ouvir” internamente as ideias musicais de uma forma completa (melodia, harmonia, arranjo), mas sem o instrumento, experimentando no piano tais idéias, só após elas estarem bem solidificadas e definidas internamente. O segundo método me parece resultar em um leque muito maior de possibilidades, pois o universo musical de tudo que eu já ouvi, e que certamente influenciará na composição, sempre será bem mais amplo do que o meu universo como instrumentista.
Além disso, compondo dessa forma, evito vícios, paradigmas e limitações técnicas que eu tenha no instrumento. Às vezes uso as duas técnicas na mesma composição, como fiz na música instrumental Forró pra Já, que gravei com o Renato Borghetti Quarteto.
08) RM: Quais são seus principais parceiros de composição?
Vitor Peixoto: Sempre enxerguei o processo de composição como um trabalho mais solitário, não que isso seja uma regra, mas funciona melhor dessa forma para mim.
09) RM: Quais os prós e contras de desenvolver uma carreira musical de forma independente?
Vitor Peixoto: Eu trabalho mais como instrumentista, contribuindo com outros artistas e só me dediquei um pouco mais de forma individual, durante a pandemia, portanto não tenho muita experiência no desenvolvimento de uma carreia como artista principal. De qualquer forma sou de uma geração que assistiu a inúmeras mudanças, seja no mercado musical, seja na tecnologia.
Lembro quando ouvi falar pela primeira vez de um selo de gravação independente, através do disco Feito em Casa, do Antônio Adolfo, que tentava um caminho novo, sem o contrato com as grandes gravadoras. Na época o problema de trabalhar um selo independente, era o da distribuição, ou seja, fazer chegar os discos às lojas, coisa que sem o suporte das grandes gravadoras, parecia uma tarefa impossível, sem contar os custos elevados de uma boa gravação, prensagem, etc.
A realidade hoje é completamente outra, o disco físico perdeu o protagonismo e muitas pessoas não possuem nem mais os equipamentos necessários para ouvi-los, mas por não focar numa carreira própria, desconheço grande parte das ferramentas e estratégias atuais.
10) RM: Quais as estratégias de planejamento da sua carreira dentro e fora do palco?
Vitor Peixoto: Como 99% dos trabalhos que participo são como pianista / tecladista de outros artistas, não tenho experiência em estratégias de desenvolvimento de carreira própria.
11) RM: O que a internet ajuda e prejudica no desenvolvimento da sua carreira musical?
Vitor Peixoto: Sou de uma época em que não havia internet e a forma de trabalhar era completamente outra. As ferramentas disponíveis hoje são muitas e quem souber usá-las de forma efetiva, certamente terá maiores chances no mercado.
O lado negativo é a massificação, os valores absurdamente baixos pagos pelas plataformas de streaming, onde as métricas de monetização tornaram-se praticamente irrisórias para artistas ou estilos que não estejam em alta.
12) RM: Quais as vantagens e desvantagens do acesso à tecnologia de gravação (home estúdio)?
Vitor Peixoto: No passado os bons equipamentos de gravação faziam toda a diferença, ainda mais quando se ouvia o resultado em aparelhos sofisticados, voltados a audiófilos.
Hoje a grande maioria das pessoas ouve música unicamente por streaming, com altas taxas de compressão, em ambientes ruidosos, tornando investimentos elevados em equipamentos de gravação, algo que talvez não faça mais tanto sentido.
Claro que o uso de microfones e pré de boa qualidade ainda são importantes, mas houve uma padronização mínima considerável na qualidade dos equipamentos (fruto também da digitalização do áudio) que possibilitou montar um home studio de qualidade aceitável com um investimento bem mais reduzido. Os estúdios profissionais com equipamentos de nível mais elevado foram tornando-se restritos a nichos mais específicos.
13) RM: No passado a grande dificuldade era gravar um disco e desenvolver evolutivamente a carreira. Hoje gravar um disco não é mais o grande obstáculo. Mas, a concorrência de mercado se tornou o grande desafio. O que você faz efetivamente para se diferenciar dentro do seu nicho musical?
Vitor Peixoto: Como comentei anteriormente, não foco em carreira própria, mas acredito muito no seguinte princípio: cada músico possui uma linguagem própria, uma forma pessoal de se expressar, de compor e de tocar.
Nem sempre é fácil se despir de tantas influências e modelos prontos que escutamos no dia a dia, mas creio que quando o músico / compositor busca encontrar e explorar a sua própria essência, ele terá mais chances de se diferenciar e consequentemente, se destacar.
14) RM: Como você analisa o cenário musical brasileiro. Em sua opinião quais foram as revelações musicais nas últimas décadas? Quais artistas permaneceram com obras consistentes e quais regrediram?
Vitor Peixoto: Eu não tenho acompanhado tanto quanto gostaria o cenário musical brasileiro atual, mas recentemente tive contato com o trabalho de alguns artistas que não conhecia e que me chamaram a atenção, como por exemplo: Delia Fischer, Fabio Cadore, Cristian Sperandir, Keco Brandão. Artistas como André Mehmari, Yamandu Costa, Hamilton de Holanda e Hercules Gomes, por exemplo, seguem produzindo um trabalho sólido de excelência e deixarão um importantíssimo legado à música brasileira instrumental.
Acredito que a música instrumental brasileira hoje tem um espaço maior de divulgação do que tempos atrás, basta ver os festivais de jazz e música instrumental que apareceram pelo país.
O nível técnico dos músicos brasileiros também aumentou muito em comparação a pelo menos 3 ou 4 décadas atrás, e creio que um fator relevante que contribuiu para isso foi a internet, que possibilitou o acesso a aulas com diferentes focos e abordagens, baixar métodos, sem contar as tecnologias de mudar andamento e / ou tonalidade de um playback, repetição de um trecho, etc.
Digo isso porque sou de um tempo em que tirar uma música de um disco de vinil era um exercício de paciência, um se sentar e se levantar sem fim para reposicionar a agulha no trecho desejado.
15) RM: Quais as situações mais inusitadas aconteceram na sua carreira musical (falta de condição técnica para show, brigas, gafes, show em ambiente ou público tosco, cantar e não receber, ser cantado, etc)?
Vitor Peixoto: Há muitas histórias, mas uma delas foi bastante preocupante. Numa turnê europeia com Renato Borghetti Quarteto, fizemos um show em Chisinau, (Moldávia), no Ethno Jazz Festival e no dia seguinte tínhamos um voo para Riga (Letônia).
Ao chegarmos no aeroporto na manhã seguinte, apresentamos os passaportes no check-in, como de praxe, mas a moça que nos atendeu levou nossos passaportes consigo, sem dizer uma palavra, e não retornou mais ao guichê. As demais filas fluíam normalmente, enquanto a nossa ficou pausada e sem atendente. O horário de embarque começava a se aproximar e nada da funcionária da companhia retornar, e para piorar, agora estávamos sem os passaportes, num país pouco conhecido, de língua difícil (na Moldávia falam o russo e o romeno) e sem o suporte dos produtores locais.
Após um tempo, suficiente para passar em nossas cabeças todo o tipo de problemas possíveis que pudesse ter ocorrido, a moça reapareceu vindo em nossa direção com um sorriso no rosto e acompanhada de mais duas pessoas também sorridentes.
Eram os diretores do Festival de Jazz, que havíamos tocado na noite anterior, e eles traziam lembranças locais para gente. Provavelmente eles tinham avisado à companhia aérea para que não nos deixassem entrar no setor de embarque, antes que chegassem com os presentes. No fim tudo acabou bem, mas tomamos aquele susto…
16) RM: O que te deixa mais feliz e mais triste na carreira musical?
Vitor Peixoto: Eu sou muito grato à música, pois através dela tive a oportunidade de conhecer dezenas de países. É maravilhoso, por exemplo, poder tocar para uma plateia na Áustria ou na Tunísia, de culturas tão diferentes da nossa, e perceber em alguns momentos as pessoas se emocionando e se identificando com uma música vinda de tão longe… é quando se percebe o poder da linguagem universal da música, e isso não tem preço.
Frequentemente me pergunto que outra chance eu teria na vida de conhecer tantos lugares, sem ser músico e não sendo de uma família rica? A profissão de músico exige muita dedicação e tem um futuro incerto, mas por outro lado é uma profissão linda e que pode ser compensadora.
É preciso contar com a sorte também, e tenho consciência que cruzei com ela algumas vezes. Tive a sorte de conhecer determinados músicos em momentos cruciais e a sorte de ter uma família que me deu condições de desenvolver o lado musical, ainda que tardio.
O que me deixa triste na carreira musical é a pouca valorização da profissão, especialmente no Brasil (já foi pior, é verdade) e a incerteza com o futuro, pois o valor pago por direitos autorais e conexos, que poderia se visto como uma espécie de aposentadoria para os artistas, se tornaram irrisórios com a chegada do streaming.
Creio que acima de tudo a carreira musical deve ser exercida com prazer e sem a cobrança de resultados imediatos, evitando assim a ansiedade por possíveis expectativas. Parafraseando o Zeca Pagodinho e o Serginho Meriti, “deixa a música te levar”…
17) RM: Quais os estudos técnicos para independências das mãos?
Vitor Peixoto: Eu desconheço estudos desse gênero e só tive um breve contato com o Hannon (estudo de técnica para o piano) durante o período que passei na Universidade.
Por outro lado, lembro que quando tirei a música “Lôro”, do Egberto Gismonti, um dos grandes desafios era justamente a independência das mãos, em que a melodia na mão direita, cheia de notas repetidas de semicolcheia (a tendinite agradece), contrastava com o ritmo sincopado da mão esquerda, alternando entre o baixo e os acordes. Nesse caso, foi o estudo da própria música que serviu como um exercício de independência das mãos.
18) RM: Você acredita que sem o pagamento do Jabá as suas músicas tocarão nas rádios?
Vitor Peixoto: Tempos atrás se falava muito sobre o pagamento de jabá para as rádios, mas desconheço a atual situação. Imagino até que as rádios hoje possivelmente tenham perdido a relevância com a chegada do streaming e que o jabá tenha migrado intensamente para essas plataformas, como forma de impulsionamento.
19) RM: O que você diz para alguém que quer trilhar uma carreira musical?
Vitor Peixoto: Exerça a profissão com prazer, valorize uma boa relação pessoal e não só musical com os músicos com quem você vai tocar e busque o diferencial que está dentro de você.
É muito comum buscarmos referências externas, e sim, é importante conhecer uma ampla variedade de estilos, pois se aprende muito com isso, mas às vezes acabamos esquecendo ou dando pouca atenção a detalhes únicos que cada músico possui dentro de si.
Quando você toca o que vem de dentro, de suas bases individuais, soa mais verdadeiro e com personalidade, e é justamente esse diferencial que pode acabar sendo valorizado.
20) RM: Quais os Pianistas e Tecladistas que você admira?
Vitor Peixoto: Enumerar músicos de destaque é sempre uma tarefa difícil e ingrata, pois a chance de esquecermos importantes artistas, é muito grande, mas vamos lá. Egberto Gismonti, André Mehmari, Cesar Camargo Mariano, Gonzalo Rubalcaba, Hermeto Pascoal, Jovino Santos, Hercules Gomes, Lito Vitale, Lyle Mays, Keith Emerson, Keith Jarrett, Chick Corea, Tony Banks, e muitos pianistas de música clássica, como Grigory Sokolov, Glenn Gould, Dimitry Masleev, Daniil Trifonov, Yuja Wang, Evgeny Kissin, etc.
21) RM: Quais os compositores eruditos que você admira?
Vitor Peixoto: Além de Bach, aprecio bastante os compositores do século XX e XXI, como Bela Bartok, Prokofiev, Stravinsky, Darius Milhaud, Havergal Brian, Marcel Dupré, Medtner, Malcolm Arnold, Albert Roussel, Nikolai Kapustin, Michael Torke, os brasileiros Villa-Lobos, Camargo Guarnieri, Guerra Peixe, Edino Krieger, Claudio Santoro, etc.
22) RM: Quais os compositores populares que você admira?
Vitor Peixoto: Sting, Lô Borges, Guilherme Arantes, Edu Lobo, Tavinho Moura, Chico Buarque, Gilberto Gil, Guinga, Milton Nascimento, a banda Toto, Luis Alberto Spinetta, Aca Seca, Kate Bush, etc.
23) RM: Quais os compositores da Bossa Nova que você admira?
Vitor Peixoto: Tom Jobin, Jonnhy Alf, Marcos Valle, etc.
24) RM: Quais os compositores do Jazz que você admira?
Vitor Peixoto: Do jazz tradicional ouvi muito pouco, mas considerando o jazz num sentido mais amplo, gosto de Allan Holdsworth, Al di Meola, Philip Catherine, Chick Corea, Frank Zappa, Hermeto Pascoal, Egberto Gismonti, Toninho Horta, Lyle Mays, Jeff Berlin, Yellowjackets, etc.
25) RM: Quais as principais diferenças entre as técnicas de Piano e Teclado?
Vitor Peixoto: O piano exige mais solidez no toque, mais peso das mãos e dos braços do que no teclado. Consequentemente é um instrumento que permite uma maior variação de dinâmica e expressividade.
Nos teclados vale notar que nem tudo que se vai executar neles, deva ser abordado sob o olhar de uma técnica pianística. O Hammond, por exemplo, usa uma técnica bastante diferente.
26) RM: Quais os principais vícios e erros que devem ser evitados pelo aluno de Piano/Teclado?
Vitor Peixoto: Talvez eu não seja a pessoa mais indicada para comentar isso, devido a minha formação mais empírica e por não lecionar, mas uma coisa que eu acho que é importante, é ter a clara consciência do dedilhado nas frases rápidas e isso só é alcançado estudando o fraseado de forma lenta.
É muito comum conseguirmos tocar uma determinada passagem apenas se executada na velocidade requerida pela música ou até mais rapidamente, mas não lentamente, sendo que em tese, tocar lentamente deveria ser até mais fácil.
Isso significa que quando se estuda o movimento das mãos apenas numa velocidade rápida, é possível que não estejamos adquirindo a real percepção detalhada do dedilhado que se está fazendo.
Penso que seja importante que o instrumentista tenha a consciência de cada passo da ação mecânica dos dedos, não só para aumentar sua segurança durante a performance, como também para identificar e resolver qualquer dificuldade técnica que porventura apareça durante aquela fração de tempo, obtendo assim maior clareza no fraseado.
Ter mais clareza no fraseado seria o equivalente a ter uma boa dicção no instrumento. Fazendo outra rápida analogia, daria pra dizer que reproduzir frases musicais sem o entendimento pormenorizado do movimento, é como falar um texto sem compreender o seu significado.
27) RM: Quais os principais erros na metodologia de ensino de música?
Vitor Peixoto: Embora eu não lecione, sempre me chamou a atenção que muitos instrumentistas têm dificuldade para ler partituras com fluidez (eu me incluo nisso), enquanto aqueles que não têm esse problema, muitas vezes apresentam dificuldades em tirar músicas de ouvido por mais simples que sejam ou improvisar.
Os primeiros, parece que desenvolveram melhor o reconhecimento de acordes e cadências, mas deixaram de lado uma ferramenta útil e importante: uma fluente leitura de partituras. Já no segundo grupo, parece ocorrer o oposto.
Claro que há também aqueles músicos “completos”, que dominam bem essas duas técnicas, mas retornando à pergunta sobre metodologia de ensino na música, me parece que esse equilíbrio em alcançar uma boa prática de leitura, sem o prejuízo do desenvolvimento do ouvido e da improvisação, ainda não foi totalmente sistematizado em grande parte das escolas de música.
28) RM: Existe o Dom musical? Como você define o Dom musical?
Vitor Peixoto: Acredito que sim. Basta ver certos músicos que mesmo com pouca idade e experiência já dominam as mais diversas técnicas do instrumento e ainda possuem um ouvido extremamente desenvolvido.
Ainda assim, penso que também há outros fatores determinantes no desenvolvimento musical, como uma exposição precoce à música, condições mínimas estruturais e um direcionamento correto e disciplinar no estudo, que se vier associado ao prazer, trará sempre melhores resultados.
29) RM: Qual a definição de Improvisação para você?
Vitor Peixoto: A improvisação é uma matéria interessante, complexa e difícil de definir. Para um bom improviso, além de toda a subjetividade e criatividade envolvida, geralmente pressupõe um bom conhecimento técnico do instrumento, uma considerável bagagem musical, um bom ouvido, um conhecimento avançado de harmonia e escalas, um raciocínio rápido, etc.
Com um grande desenvolvimento de todas essas habilidades, alguns podem alcançar uma espécie de by-pass da “interface física”, conectando quase que diretamente o cérebro ao instrumento, ou seja, o instrumento se torna uma extensão direta das suas ideias musicais. No meu caso, acho que eu precisaria de mais umas vidas pra chegar a esse nível.
30) RM: Existe improvisação de fato, ou é algo estudado antes e aplicado depois?
Vitor Peixoto: Acho que existem os dois casos. Quem nunca já vivenciou a sensação de ter realizado um verdadeiro e belo improviso numa determinada música, tornando aquela noite inesquecível? Sim, isso acontece, mas também há aqueles casos em que um estudo prévio da harmonia, a experimentação de algumas ideias, talvez possa trazer um resultado bem mais satisfatório.
É uma questão muito pessoal, de experiência com determinadas cadências, habilidade com o instrumento e diversos outros fatores. Eu prefiro, quando possível, experimentar algumas frases ou ideias antes, nem que seja para pelo menos definir uma linha de improviso, mas também já aconteceu comigo de o primeiro “take” acabar sendo melhor do que os outros, onde tive mais tempo de pensar para “construir” um improviso.
31) RM: Você toca outros instrumentos musicais?
Vitor Peixoto: Não.
32) RM: Quais os seus projetos futuros?
Vitor Peixoto: Em março de 2025 participarei de mais uma turnê europeia com Renato Borghetti Quarteto e pretendo continuar trabalhando com a The Hard Working Band, sempre que as agendas permitirem. Pretendo também seguir acrescentando material ao meu canal do YouTube, seja de composições (ainda falta gravar muita coisa), seja de apresentações, material das turnês, histórias da profissão, etc.
33) RM: Quais seus contatos para show e para os fãs?
Vitor Peixoto: https://www.instagram.com/vitorpeixoto_musico
Meu canal do YouTube. https://www.youtube.com/@VitorPeixoto
O canal já conta com mais de 100 vídeos organizados em playlists (Renato Borghetti Quarteto, Pelo Mundo, Do Fundo do Baú, Improvisos, Composições, Jazz Noir, Entrevistas, Histórias Musicais, etc.). Além de vídeos mais atuais, tenho ainda um vasto material arquivado que estou constantemente revisitando, editando e postando aos poucos no canal.
O Pirata, versão piano 2020 (Vitor Peixoto): https://www.youtube.com/watch?v=xUBWNDwJCPI
Playlist de composições: https://www.youtube.com/watch?v=xUBWNDwJCPI&list=PLABrgnac_XcT534Avx1qsDdT3fivHR3B1
Playlist: https://www.youtube.com/watch?v=XxUFzv1Kofw&list=PLABrgnac_XcTIEVg7nb1T5QVZ-8FFDo7O
Que bela trajetória do artista! Inicialmente autodidata e depois adquiriu formação técnica com atuações impressionantes! Ótima entrevista!
Que bela entrevista e bela trajetória do Vitor Peixoto! Parabéns, exímio jornalista Antonio Carlos e a revista Ritmo Melodia que canta o Brasil!