A cantora e compositora paulistana Juliana Areias depois de mais de um ano de shows com ingressos esgotados ao redor da Austrália, já é uma referência no país.
A música da cantora brasileira envolve várias tonalidades da música popular brasileira e da sua enorme influência no jazz e em outros ritmos internacionais. A sua autêntica voz brasileira, a sua ginga, seu charme contagiante e sua presença apaixonada e ao mesmo tempo pessoal em cena são as características do seu trabalho. Juliana foi apresentada pessoalmente aos fundadores da Bossa Nova quando ainda era uma adolescente pelo lendário jornalista e historiador Ruy Castro, que logo a batizou de “Bossa Nova Baby”. Este encontro e esta experiência única lhe inspirou a seguir a carreira de cantora.
A cantora brasileira morou por vários anos na Europa, na Suíça e na Nova Zelândia antes de mudar para a Austrália. Sempre atuando no circuito musical, a sua carreira inclui apresentações em festivais de renome internacional, como o reverenciado Montreux Jazz Festival, o Auckland Festival, e o American’s Cup (Nova Zelândia). Mais recentemente, ela se apresentou em eventos como o concerto no: 505 em Sydney, o Kings Park Festival, o Perth International Jazz Festival, na mostra novaiorquina “Van Gogh, Dali and Beyond”, na Art Gallery of Western Austrália, e no Ritmo Festival no Darling Harbour, em Sydney, para uma plateia de mais de 30.000 pessoas.
Juliana Areias gravou para o poeta, compositor e diplomata brasileiro Marcio Catunda, em seis de seus álbuns, produzidos na Suíça (Anima Lirica -1997), Bulgária (Crescente – 2000), Brasil (Mística Beleza – 2003/ Itinerário Sentimental -2008), Espanha (Água de Flores – 2009) e Portugal (O Jardineiro da Vida – 2010).
Apelidada de Bossa Nova Baby, a cantora brasileira que mora em Perth desde 2009 tem o seu primeiro CD à venda nos principais serviços de música pela internet. O seu apelido é o título de seu primeiro CD autoral. Ela lançou o CD – “Bossa Nova Baby” no Ellington Jazz Club, o principal palco de jazz de Perth, no dia 7 de fevereiro de 2015, dia em que comemorou o seu aniversário de 40 anos. O CD reflete o presente, o aqui e o agora, e também toda a riqueza da música popular brasileira com suas múltiplas influências, combinada com a fantástica qualidade da música produzida aqui em Perth, na Austrália. Perth é considerada a capital mais remota do planeta, mas, para mim, é um dos lugares mais inspiradores, musicalmente e artisticamente, em que vivi.
Com patrocínio do Departamento de Cultura e Artes do Governo de Western Austrália e graças a uma campanha bem-sucedida de crowd-funding que envolveu fãs e seguidores espalhados por países tão diferentes: Itália, Qatar, Andorra, Nova Zelândia e, claro, Brasil e Austrália, pode gravar o CD que reúne 12 músicas de sua autoria e gravadas em Perth com alguns dos músicos de jazz mais conhecidos e consagrados da Austrália, como Pete Jeavons, Graham Wood, Ray Walker, Marcio Mendes, Chris Tarr, Paul Millard.
Em músicas como “Garoto de Copacabana”, “Maré Cheia”, “Belas Artes”, “Meu Lugar”, “Night in Takapuna”, a cantora brasileira passeia por ritmos como bossa, samba, jazz, tango, choro, pop e funk.
Apesar de Juliana morar fora do Brasil há décadas, o seu coração continua em seu país de origem. Algumas canções que fazem parte do CD – “Bossa Nova Baby” foram inspiradas por cidades brasileiras. “Flecha”, por exemplo, é dedicada a São Sebastião do Rio de Janeiro, a Cidade Maravilhosa; “Dia a Dia” foi inspirada pela vivência da cantora em sua cidade natal, São Paulo; e “Meu Lugar” é uma homenagem a Salvador-BA.
As canções passeiam por lugares, pessoas, sons e histórias que amo. No álbum, ela canta para cada um dos seus lugares. A canção “Meu Lugar” é dedicada a todos, que como ela, sai do Brasil, mas deixam uma parte do coração por lá. Salvador é a cidade onde pulsa o coração. O coração como o verdadeiro lugar de onde se vem e para aonde quer chegar. O lar. Nesse sentido a canção se transborda e é dedicada a todas as pessoas que deixaram sua cidade natal e estão recriando o seu lar em qualquer outro lugar do mundo. O nosso lugar é sempre onde o nosso coração está.
Segue abaixo entrevista exclusiva com Juliana Areias para a www.ritmomelodia.mus.br , entrevistada por Antonio Carlos da Fonseca Barbosa em 01.06.2015:
01) Ritmo Melodia: Qual a sua data de nascimento e a sua cidade natal?
Juliana Areias: Nasci no dia 7 de fevereiro de 1975, na maternidade de São Paulo, pertinho da minha amada Av. Paulista, às 21:20h de um sábado de carnaval. Meu pai conta que da maternidade dava para ouvir o som do desfile de carnaval passando lá embaixo. Não sei se por isso, ou por eu ser chorona mesmo, meu pai compôs em comemoração ao meu nascimento uma marchinha de carnaval que diz: “Juliana vem, não faz manha não, pois papai não gosta de choro não”. Sou Aquariana com ascendente em Libra. E por curiosa coincidência, são os meus três compositores brasileiros favoritos são aquarianos: Tom Jobim (25/01), Djavan ( 27/01) e Lenine ( 02/02).
02) RM: Fale do seu primeiro contato com a música.
Juliana Areias: Papai, apesar de ser economista e exercer sua profissão e sempre foi com certeza músico de coração, que além de cantar muito bem sempre tocou Violão, Gaita. É capaz de tirar som do acordeon e do órgão, instrumentos prediletos do meu avô. Meu avô, na verdade, não tocava nada, mas sempre gostava de ter instrumentos pela casa. Uma das minhas mais antigas lembranças musicais é a musica “O Pato” cantada por João Gilberto, “rodando na vitrola – de meu pai – sem parar” e que eu adorava cantar quando tinha menos de cinco anos de idade. Meus pais sempre foram apreciadores de música e me recordo de desde bem pequena ir a shows ao vivo com eles, mesmo em uma época em que teoricamente shows não eram permitidos para menores de 10 anos de idade. Eu estava em todos. Eu assisti vários shows do “Projeto Pixinguinha” em São Paulo. Mamãe me colocou uma vez no palco para dar um beijo no Gilberto Gil. Eu assisti nessa época com ela, Diana Pequeno, 14 Bis, Milton Nascimento. Eu adorava a Rita Lee, ia a todos os shows com meu pai, tinha todos os discos e adorava “dar meu show” cantando “Lança Perfume” quando pegava ônibus com minha mãe, ficando de pé em cima daquela caixa preta, que guardava o motor do ônibus, ao lado do motorista, quando eu tinha cerca de cinco anos de idade em 1980. Papai teve um grupo vocal chamado “Pedra Mar” que chegou a participar de alguns festivais do Teatro Zacaro. Tiago Araripe, músico chave do chamado movimento de vanguarda Lira Paulistana fazia parte desse grupo. Os ensaios eram no final de semana na casa do meu pai. A música do Tiago sempre me impressionou bastante e acompanho o trabalho dele até hoje. Feliz de vê Zeca Baleiro fazendo o resgate do trabalho do Tiago. Mamãe fez teatro e tinha muitos amigos da classe artística. No prédio onde ela mora até hoje, na Bela Vista e onde cresci, moravam os pais de uma das minhas melhores amigas de infância, a Amanda, filha do Roberto Campadello, artista plástico italiano, vencedor da Bienal de São Paulo em 1974 e da Carmen, cantora. Eles tinham um Bar na Rua 13 de Maio, o legendário “Persona” – passávamos varias tardes lá, tocando, cantando, dançando e “brincando” com o jogo de espelhos e velas do trabalho do Roberto, que deu origem ao nome do bar.
Outro momento marcante para mim foi uma vez que fui com mamãe assistir ao ensaio de uma banda de jazz acústico de conhecidos dela. E me lembro de me sentir maravilhada de perceber como o piano interagia com o baixo e a bateria com tanta sutileza ao vivo, no ar. Essa é uma lembrança única e diferente da maioria dos músicos e ensaios dos amigos dela, que estavam mais ligados a jovem guarda e ao pop rock brasileiro, como Netinho baterista que tocava com a Vanusa, vocalista Simbas da banda Tutti-Frutti, banda Radio Taxi, banda Bombom (“Vamos a la playa”). Interessante que seja essa primeiríssima experiência jazzística a que tenha mais me marcado, como se fosse realmente uma revelação, uma super descoberta aquela combinação de sons tão linda. Todas essas vivencias e contato com a música ao vivo desde muito pequena, são um dos melhores presentes que meus pais me deram e fundamentais na minha formação como pessoa e artista.
03) RM: Qual a sua formação musical e\ou acadêmica (Teórica)?
Juliana Areias: Minha formação musical teórica ou acadêmica é praticamente inexistente, muito menos do que a que eu gostaria de ter. Ao longo da vida, tive períodos de estudo, mas nunca com a continuidade desejada. Fiz aulas de teoria musical por alguns meses antes de me mudar de São Paulo para Brasília – DF em 1992, com meu primo, Rubens De Donno, super contrabaixista erudito formado pela USP – Universidade de São Paulo, músico permanente da Orquestra de Jazz Sinfônica e a Orquestra Sinfônica Municipal, entre outras. A base de teoria que tenho até hoje, devo então ao Binho (Rubens). Depois, já morando em Salvador – BA entre 1994 e 1996, eu cursei Belas Artes na UFBA – Universidade Federal da Bahia e fazia parte do coral universitário. Na Suíça entre 1997 a 1999, fiz solfejo e canto jazz no Conservatoire de Geneve e na Maison de la Musique.
Na Nova Zelândia, entre 2000 a 2007 não estudei, mas fui assistente de pesquisa e contratada como especialista em musica brasileira pela University of Auckland para assessorar o projeto de pesquisa e PhD do Professor Chris Naughton. O Projeto se chamava “Free Samba” e se propunha a ensinar música e cultura brasileira para os estudantes de licenciatura musical da universidade. Depois das aulas dentro da universidade, íamos com eles as escolas de primeiro e segundo grau e ao publico em geral, onde os estudantes universitários aplicavam o que aprenderam desenvolvendo workshops e espetáculos. Após todo esse processo, vinha à etapa de entrevistar todos esses participantes e recolher dados para a pesquisa de PhD, que queira entender como a música brasileira pode ser usada como agente de integração cultural não só no Brasil, mas no mundo a fora. Mais informação e links sobre o “Free Samba Project” podem ser encontrados na pagina “Bio” do meu site: www.julianaareias.com .
Aqui na Austrália desde 2007, fiz apenas algumas aulas via skype com a professora Sueli Mesquita do Rio de Janeiro e mais recentemente por seis meses antes de iniciar a gravação do CD – Bossa Nova Baby, eu estudei com uma jovem cantora australiana, que gosto muito, a Shameem, que também tem um trabalho autoral, mas em uma linha mais soul-r&b-jazz.
Quase todos os músicos com quem trabalho aqui e gravei o álbum são professores da WAAPA, o conservatório de jazz mais bem conceituado da Austrália, que fica aqui em Perth, a cidade onde moro, na costa ocidental da Austrália, oposto a Sydney e Melbourne. Perth, a metrópole – capital mais isolada do mundo, me fascina pela sua excelência artística e capacidade criativa.
04) RM: Quais as suas influências musicais no passado e no presente. Quais deixaram de ter importância?
Juliana Areias: Minhas primeiríssimas influências musicais foram Rita Lee e Tom Jobim. Essas influências estão ainda tão vivas em mim que o meu primeiro disco autoral “Bossa Nova Baby” justamente é dedicados a ambos, além de ser dedicado ao Meu Amor Geoffrey, irmão Rodrigo Miguilim e filhotes Jobim e Lilas.
Depois vieram outras três vozes femininas fundamentais: Leny Andrade, Leila Pinheiro e Rosa Passos. Leny foi a cantora que eu mais ouvi ao vivo na minha vida e durante minha adolescência. Nesse período, graças a Ruy Castro, tive a oportunidade de conviver nos bastidores do show “Chega de Saudade”, baseado no livro do Ruy e poder conhecer alguns dos meus ídolos ligados a Bossa Nova como Ronaldo Boscoli, Luizinho Eça e Johnny Alf.
Conheci Ruy em uma sequência de shows anteriores a este, promovidos pelo Shopping Morumbi em São Paulo, na época, comemorando 30 anos de Bossa Nova. Foram duas semanas de shows diários e eu estava lá todos os dias, na primeira fileira, cantando tudo.
O Apolo, da produção do evento, ficou admirado de ver uma adolescente tão interessada em Bossa Nova e me apresentou ao Ruy, que estava lançando o seu livro em uma tarde de autógrafos. Eu já tinha o livro e há anos já estava pesquisando sobre Bossa Nova, passando minhas tardes no Centro Cultural de São Paulo ouvindo discos e pesquisando livros sobre o assunto. Então quando me apresentaram a ele, na minha petulância de 15 ou 16 aninhos, ao invés de lhe dizer, que eu gostava do livro dele, eu lhe disse: “Você roubo a minha ideia. Eu é que ia escrever esse livro (risos)”. O Ruy, depois de um segundo de susto, abriu seu característico “sorriso do Gato de Alice” e me adotou como a “mascotinha da Bossa Nova“, a “Bossa Nova Baby“, me presenteando com varias gravações raras e me dando acesso aos bastidores dos shows de Bossa Nova.
Então obviamente, a Bossa Nova é a minha maior influência como cantora e compositora. Mesmo que tudo o que eu cante hoje não seja mais necessariamente classificado de Bossa Nova, ainda permeia em tudo o que eu faço. Uma alma e um jeito Bossa Nova de ser, de compor, de cantar, de interpretar e de me expressar no palco.
Outro momento divisor de águas foi em 1994, quando eu ouvi pela primeira vez; caminhando pelo Shopping Barra em Salvador – BA, o disco “Festa” de Rosa Passos que tem “Paris de Santos Dumont aos travestis”, composição de Moacyr Luz e Aldir Blanc, com arranjo de Lula Galvão. Ouvi tocado com maestria por Rosa no Violão, Lula na guitarra, Itamar Assiere no piano, Jorge Helder no contrabaixo, Erivelton Silva na bateria, Marcio Montarroyos no trompete e Pirulito e Ovídio Brito nas percussões.
Esse foi um momento tão revelador para mim quanto o que Caetano Veloso descreve quando ouviu João Gilberto na televisão pela primeira vez. Eu parei, ouvi e fui correndo até administração de marketing do shopping para saber o que é que havia sido tocado. Leslie, o então gerente, me disse sorrindo “Rosa Passos“. Daquele minuto em diante, o mundo passou a ser divido entre as pessoas que já conheciam o trabalho da Rosa e as que ainda não e precisavam conhecer. Naquele momento entendi e decidi, é essa a linha do que eu quero seguir “Quando eu crescer”.
Outros dois compositores essenciais para mim são Djavan e Lenine. O DVD ao vivo do Lenine no Cite em Paris – França em 2004, só com ele, Yusa baixista cubana e Ramiro Musotto percussionista argentino (com um pé na Bahia e infelizmente já falecido). É ainda um dos melhores shows que já vi na minha vida e nos últimos 11 anos.
Sobre outras possíveis influências musicais que foram sublimadas ou transformadas ao longo do tempo, devo confessar que na minha pré-adolescência dos nove aos onze anos, entre o amor pela Rita Lee e a redescoberta da Bossa Nova na adolescência, eu tive minha fase de fanzona dos Menudo e da Madonna – com direito a imitação de coreografias e visual. O que aprendi e levo comigo desse período, é a habilidade de hoje em dia poder cantar em espanhol, graças ao Menudo e as aulas de “performance” e atitude irreverente dadas pela rainha do pop Madonna.
05) RM: Quando, como e onde você começou a sua carreira musical?
Juliana Areias: Comecei a minha carreira artística profissional como atriz, aos 13 anos de idade em 1988 em São Paulo, como aluna do professor Luiz Gustavo Alves. Por muitos anos atuei como a atriz que sabe cantar e dançar em peças infantis como “A Bruxinha que era boa”, com direção do Walcyr Carrasco e no elenco minhas amadas Silvia Ferreira (Silvinha aquariana, com gosto de chamá-la) e Raquel Gomes.
A transição para a cantora que sabe interpretar só ocorreu muitos anos depois, já morando em Salvador-BA em 1995. Devido ao profundo amor e respeito pela música e pelo palco, demorei muito para me assumir cantora além de atriz. Uma sensação de responsabilidade incrível, de que para poder honrar a profissão de cantora, eu tinha que fazer por merecer, passar por um teste. Então me apresentei pela primeira vez como cantora, dando uma canja com meu ex – companheiro e ainda super amigo e parceiro musical Carlinhos Franco, na barraca de praia do Sariga, no idílico Farol de Itapuã em Salvador. Na plateia, me ouvia o amigo cantor e uma das vozes masculinas mais bonitas que eu conheço: Vainer Dias Gomes, o “Deus da voz”. Cantei “Homenagem ao Malandro” do Chico Buarque, que admiro como o melhor letrista do Brasil.
Vainer, que é cantor de estúdio de gravação e pianista, líder de coral, arranjador de backing vocal e professor de canto e extremamente critico e de sinceridade cortante – ouviu e no final disse: “Nossa Ju, não sabia que você cantava; você é afinadinha”. Vindo de Vainer, tomei o comentário como positivo e como uma benção. E assim nascia a cantora Juliana Areias, nas areias do farol de Itapuã, terra onde morou Vinícius de Moraes. Eu morava na mesma rua da casa que havia sido de Vinícius. Já o processo de compositora, sempre esteve presente, componho, escrevo poesias e diários desde meus 13 anos de idade. Amo palavras e sons – principalmente acordes dissonantes, cadencias harmônicas e divisão rítmicas interessantes.
06) RM: Quantos CDs lançados, quais os anos de lançamento (quais os músicos que participaram nas gravações)? Qual o perfil musical de cada CD? E quais as músicas que entraram no gosto do seu público?
Juliana Areias: Bossa Nova Baby, gravado agora em 2015 foi o meu primeiro CD autoral. Ele é composto por 12 músicas, criadas com diversos parceiros musicais espalhados pelo mundo: Johannes Dimyadi, Sue Burns e Chris Naughton residentes na Nova Zelândia; Carlinhos Franco residente em Londres; Ecio Parreira, residente em Genebra; Maximiliano Ayres, residente no Brasil; Doug de Vries, Glenn Rogers, Mike Bevan e Pete Jeavons residentes na Austrália. A ideia do Bossa Nova Baby é criar um dialogo contemporâneo entre a Bossa Nova com vários outros estilos musicais: o Jazz, o Funk, o Pop, o Choro, o Tango, o Baião e as diversas facetas do Samba. Foi gravado aqui em Perth com a participação de dois excelentes músicos brasileiros, Marcio Mendes (percussão) e Thiago Santos (cavaquinho) e do português Mike Burns (guitarra portuguesa) junto com os melhores músicos de jazz da cidade, todos abaixo professores do WAAPA, o melhor conservatório de Jazz da Austrália: Pete Jeavons – arranjos, produção, baixo e contrabaixo. Graham Wood – pianista e fundador do Perth International Jazz festival e do Ellington Jazz Club, a mais requintada casa de jazz australiana. Ray Walker – guitarrista legendário de Perth, Doug De Vries – arranjo de “Belas Artes” e violonista virtuoso, parceiro de Yamandú Costa. Paul Millad – saxes e flauta. Jeremy Greig – trombone. Ricky Malet – trompete e pistão. Zak Rowtree – violin. Cathie Travers – acordeon. Chris Tarr – bateria e percussão. Como o álbum é recém-lançado, ainda é difícil de saber qual será a preferência do publico. Até agora as canções que parecem já se destacar são: Maré Cheia, Flecha (dedicada ao Rio de Janeiro) e o belíssimo choro Belas Artes, as duas últimas tiveram mais de 1000 “curtidas” na minha pagina de facebook “Juliana Areias – Bossa Nova Baby” em menos de uma semana. Sendo um álbum realmente tão eclético, tem atraído públicos diversificados, desde uma linha mais pop como “Como Vai” até o surpreendente Tango “Dia a Dia” dedicado a São Paulo. Quase todas as músicas são em português, com exceção de “Night in Takupuna” uma Bossa Nova pura que tem chamado a atenção do público na Austrália e na Europa. Antes desse álbum, participei de vários projetos do poeta e diplomata Marcio Catunda: Anima Lirica – gravado em Genebra, Suíça em 1997, produzido e arranjado pelo pianista Rubens Diniz. Crescente – gravado em Sofia, Bulgária em 2000, produzido e arranjado pelo pianista Christian Boyadjiev. Mística beleza – produzido e arranjado em Brasília – Brasil em 2003 por Fernando Campos. Itinerário sentimental, produzido e arranjado em Lisboa, Portugal em 2008 por Marcelo Miranda e Milton Batera. Água de Flores, produzido e arranjado em Madrid, Espanha em 2009 por Pedro Moreno. O jardineiro da Vida, produzido em Lisboa, Portugal em 2010 por Marcelo Miranda e Milton Batera.
07) RM: Como você define seu estilo musical?
Juliana Areias: Sou essencialmente uma cantora de música brasileira, com um “sotaque” Bossa Nova em tudo o que faço, dai o meu apelido musical ser “Bossa Nova Baby”, titulo do meu primeiro álbum autoral. Isso significa que canto de Bossa Nova, Samba, Choro, Baião, Rock brasileiro ao Jazz, Pop, Funk, Tango e Bolero e swing francês – mas tudo com uma estética e sentimento Bossa Nova.
08) RM: Como é o seu processo de compor?
Juliana Areias: Componho, de várias formas e desde a adolescência, como mencionei anteriormente. Às vezes a melodia chega; originaria de uma cadencia harmônica ou de uma melodia, de quando brinco com meu Violão. Outras vezes a letra que nasce primeiro. Escrevo muito e tenho facilidade para colocar letras em melodia de parceiros, assim como tenho poemas para serem musicados. O processo de composição então varia e a forma de inspiração. Pode ser livre e inesperada, daquela que você precisa parar para registrar para não esquecer, mas também pode ser direcionada por um tema de trabalho e pesquisa. Tom Jobim costumava a afirmar que o processo de criação é 90% transpiração e 10% inspiração. Concordo e assino embaixo, tudo requer trabalho, dedicação, força de vontade, persistência, organização, concentração, além de é claro, doses de talento e inspiração.
O que me faz lembrar-se de uma entrevista que assisti do Gilberto Gil com a Bruna Lombardi, há muitos anos atrás, em que Gil contava que escreveu “Se eu quiser falar com Deus” em meio a criançada brincando. O momento ideal não existe. É a gente que o cria. E essa é que é a beleza da vida, o que se consegue criar e atingir junto com todos os afazeres e desafios do dia a dia. Gilberto Gil está novamente certo quando disse: O melhor lugar do mundo é aqui e agora.
09) RM: Quais são seus principais parceiros musicais?
Juliana Areias: Como disse acima falando do CD Bossa Nova Baby, tenho vários parceiros espalhados pelo mundo, principalmente pelos locais onde já morei nesses últimos 20 anos, Brasil, Suíça, Nova Zelândia e Austrália. A escolha dos parceiros acontece normalmente vinda de uma admiração mútua artística e profissional. Todos os nomes que citei na pergunta seis são super especiais para mim.
10) RM: Você estuda técnica vocal?
Juliana Areias: Muito menos do que o que deveria. Como disse antes, minha formação teórica sempre foi muito fragmentada pelas mudanças de cidades, mas cada vez mais, principalmente depois de todas as lições aprendidas com a experiência de me ouvir no estúdio de gravação, fica evidente o quão importante é manter a pratica do “instrumento” que é a voz.
11) RM: Qual a importância do estudo da técnica vocal e os cuidados com a saúde vocal?
Juliana Areias: A técnica é importante para aprender a ter controle, consciência e consistência vocal. Cuidados com a saúde vocal são essenciais. Cuidado básico que tomo é apenas beber água não gelada enquanto estou cantando. Procuro e nem sempre consigo – aquecer a voz, fazer exercícios de repetição e notas prolongadas antes de entrar no palco. Costumo dormir com cachecol para proteger a garganta antes de um show ou gravação importante. Certamente deve ter um fator psicológico nessa atitude, mas para mim funciona. Fica aqui uma dica curiosa que aprendi com a Sueli Mesquita, quando estiver ficando rouca e com a voz falhando e ficando grave, procure falar docemente e mais agudinho. Parece irônico, mas funciona. Obrigada Sueli!
12) RM: Quais os prós e contras de desenvolver uma carreira musical de forma independente?
Juliana Areias: Meu trabalho sempre foi independente e o que gosto nisso é que a verdade e liberdade artística podem prevalecer a cima de qualquer suposto imperativo mercadológico. Difícil falar de outro panorama que pessoalmente nunca experimentei. O de ter o suporte de uma gravadora e uma equipe completa de produção. Ambas as opções podem tanto funcionar como fracassar artístico e comercialmente. No final, creio que o que seja realmente importante, independente da formula utilizada ou disponível é ter uma visão clara do objetivo do trabalho e ter a melhor equipe possível para realiza-lo.
13) RM: Quais as estratégias de planejamento da sua carreira dentro e fora do palco?
Juliana Areias: Andam sempre juntos e em paralelo o processo artístico e operacional. O primeiro ligado essencialmente às decisões artísticas: quais composições escolher e em que ordem colocar em uma gravação, show, programa de rádio, qual o tema de cada apresentação, quais os músicos a convidar, qual é a visão e a mensagem. Dai a partir disso, tenho uma micro equipe de produção com apoio de patrocinadores, roupas da Totem, acessórios da Daniela Colletion para compor a imagem da Juliana Areias no palco, nas fotos e nos vídeos. Paralelo ao trabalho de criação e produção tem o trabalho de comunicação e divulgação que normalmente coordeno e opero trabalhando várias horas do dia no meu computador, atualizando webite e todas diversas redes sociais.
Sempre que possível conto com a super ajuda, talento, trabalho e parceria de amigos e profissionais da área de comunicação e jornalismo, como Claudia Rondon, Roberta Alves e do meu irmão Rodrigo Vasconcelos Cesar. E tem o trabalho operacional de falar com as pessoas, responder emails, processar cobranças e pagamentos, conseguir apoios, fazer contatos, prestar contas, fazer balanço no final do ano fiscal igual qualquer outra empresa ou prestadora de serviço profissional. Não basta ser artista e ter talento. Tem que ser empreendedor e persistente. Costumo dizer alias, que o meu maior talento é a perseverança.
14) RM: Quais as ações empreendedoras que você pratica para desenvolver sua carreira?
Juliana Areias – Busca e manutenção constante de novas parcerias, novos públicos, patrocinadores e apoios governamentais. Criação de estratégia de marketing e desenvolvimento de produtos – CDs, vídeos, shows. Ser artista autônoma é trabalhar 24 horas por dia, porque sua mente está sempre ligada, atenta, criando, pesquisando, processando informação, buscando inspirações, caminhos, conexões e soluções. Sempre converso e reflito sobre isso com o meu amor, Geoffrey Drake– Brockman, artista plástico e escultor australiano que emprega tecnologia e robótica em sua arte. (http://www.drake-brockman.com.au). Embora estejamos em áreas artísticas diferentes, nossos processos de trabalhos são muito semelhantes. A beleza disso é que amamos o que fazemos. E quando se ama o que se faz e se está rodeada de pessoas que entendem esse sentimento e necessidade, porque amam o que fazem e trabalham 24 horas por dia, embora exija muito esforço, é um prazer.
Enquanto muitas pessoas no mundo sonham em um dia se aposentar para se dedicarem ao que amam, é preciso muita coragem de pagar para ver, arriscar, colocar a cara a tapa, viver na corda bamba, para criarmos e conquistarmos a super oportunidade de viver a vida fazendo o que amamos sem nunca sonhar em nos aposentar. “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é” – diz Caetano Veloso. A relação com a música é tão intensa e intima que normalmente sei o meu estado de espírito todo dia a cada momento, através da música que vem na minha cabeça. A música traduz a minha alma. Acredito que cada pessoa tem uma maneira de se comunicar com sua alma e Deus, a minha é através da música.
15) RM: O que a internet ajuda e prejudica no desenvolvimento de sua carreira?
Juliana Areias: Ajuda em tudo. Graças a um trabalho continuo e presença constante na internet, um trabalho musical pode se fazer conhecer e estar presente na vida das pessoas em qualquer lugar do mundo simultaneamente. Graças à internet, a necessidade de impressão de pôster, por exemplo, diminuiu, a comunicação é cada vez mais eletrônica e dinâmica. Canais como youtube, tem substituído o papel da televisão, o que significa um pouco mais de democracia – tanto se tem o direito de postar assuntos variados quanto o de se escolher o que se quer ver e ouvir. Fala-se muito da questão da pirataria e de como “baixar” músicas banalizou e quebrou a indústria da venda de discos. Acredito que essa linha de pensamento não ajuda a ninguém porque esse processo é inevitável, então melhor focar nos pontos positivos disso que como já citei. É a possibilidade das músicas de artistas independentes terem alcance mundial.
A única coisa que sinto falta talvez seja das lojas de música (não virtuais), pois sou do tipo que ainda curte o ritual de comprar um álbum, ouvir, folhear a ficha técnica, ler as letras. Ritual que no mundo virtual é um pouco mais descartável. Mas, como acredito que para toda tendência, existe sempre uma contra tendência em ação, já se ver uma volta do consumo de Long Play em vinil, vinda dessa necessidade mais romântica de ter a informação mais “palpável”.
16) RM: Quais as vantagens e desvantagens do acesso a tecnologia de gravação (home estúdio)?
Juliana Areias: De novo, acho legal que exista a democratização, a possibilidade de poder se gravar com custos menores. Como já falamos o conceito de “venda de música” estar em transformação. Acho que ter opções não é de forma alguma ruim. Ter opções significa que você ainda pode escolher bons profissionais em estúdios caseiros ou estúdios maiores, da mesma forma que se pode ainda optar por ter um fotógrafo ou cinegrafista profissional ao invés de tirar e filmar com seu celular. Tudo depende sempre das escolhas artísticas e disponibilidades financeiras de cada projeto. Com bons profissionais e criatividade se produzem trabalhos fantásticos em ambos os cenários.
Para a gravação do meu primeiro álbum autoral; coisa de mãe de primeiro filho, eu planejei e trabalhei mais de um ano para obter verbas tanto de financiamento coletivo e patrocinadores como a Metax e Zambelli’s, quanto de patrocínio do Departamento de Cultura e Arte do Governo Australiano, para poder executar o álbum com os melhores músicos de jazz e no melhor estúdio e técnico de som da cidade, o Crank Recording do Lee Buddle.
Agradeço eternamente a todos esses apoios, que me ajudaram a dar a luz ao CD – Bossa Nova Baby, com toda a qualidade sonhada e almejada que ele merece e tendo a exclusiva dedicação do Pete Jeavons que fez com excelência o seu trabalho de arranjador e produtor musical do álbum.
17) RM: No passado a grande dificuldade era gravar um disco e desenvolver evolutivamente uma carreira musical. Hoje gravar um disco não é mais o grande obstáculo, mas a concorrência se tornou o grande desafio. O que você faz efetivamente para se diferenciar dentro do seu nicho musical?
Juliana Areias: Eu demorei 15 anos para poder gravar o meu primeiro trabalho autoral. Lembro-me que na virada do ano de 2000, esse já era um dos meus objetivos. Creio que o meu diferencial venha justamente do amadurecimento e da história e trajetória do meu trabalho, desde as vivencias da adolescente amante da Bossa Nova ainda no Brasil, passando por toda a experiência de ter vivido na Suíça, na Nova Zelândia e agora na Austrália, sempre levantando a bandeira da qualidade da música brasileira e essa capacidade natural que a nossa música tem de evoluir e se reinventar, adquirindo novas influencias, sem jamais perder a sua raiz própria.
Esse é um fenômeno que já se discutia na Semana de Arte Moderna de São Paulo em 1922, a “antropofagia” da nossa cultura, que foi um dos princípios conscientes do movimento da Tropicália, mas, que na verdade está presente em todos os movimentos musicais brasileiros, que por sua vez refletem o nosso contexto histórico de cada período. Além da paixão pela música, sou absolutamente apaixonada por história e acho fascinante perceber como ambos os aspectos são tão interligados na nossa cultura. É possível contar a História do Brasil através da nossa música e vice-versa e isso me fascina. Então estou sempre atenda a história e origem das coisas, das músicas, dos sons, das ideias e esse elemento talvez seja um dos diferenciais que se refletem nas minhas músicas, nas minhas letras, o amor pela qualidade musical, pelas palavras e pela história tanto individual quanto coletiva. Somos o agente da História.
Esse foi um conceito que me marcou muito desde a minha primeiríssima aula de história, na quinta série com o professor José Henrique da escola IMACO – Instituto de Ensino Imaculada Conceição que ficava na Rua Cincinato Braga – Bela Vista – SP. Sou eternamente grata pelas lições de vida que pude absorver de professores fantásticos como o José Henrique, a Valeria, professora de Português, o Fernando, de Religião, a Malu, de Matemática (que acompanha minha carreira até hoje). Um dos desejos da minha música é poder homenagear e reverenciar as grandes pessoas que já passaram e continuam passando pela minha vida, me inspirando, me motivando e me dando sempre a certeza, que ao contrário do que se acredita, existe muita gente boa no mundo, fazendo com muita dignidade e amor os seus trabalhos. E contribuindo para o bem estar e a felicidade, aperfeiçoamento do mundo como um todo.
Outro dia o Lloyd, filho do Geoffrey, de 20 anos fez uma observação que achamos de uma profundidade, sabedoria e verdade linda: A probabilidade das coisas correrem bem no mundo e tudo dar certo é muito maior do que a de tudo ser uma catástrofe e dar errado. Simples e lindo esse pensamento e constatação. Que a gente saiba evidenciar e valorizar cada vez mais o que é bom. Espero que o meu trabalho contribua com o mundo nesse sentido, de inspirar a vida das pessoas com beleza, ideias, sentimentos que façam com que a gente se sinta cada vez mais conectados.
18) RM: Como você analisa o cenário musical brasileiro. Em sua opinião quais foram as revelações musicais nas duas últimas décadas, quem permaneceu com obras consistentes e quem regrediu?
Juliana Areias: Morando fora do Brasil desde 1996 e nesse período tendo voltado apenas duas vezes em 2000 e 2007, não tenho um panorama completo, mas procuro ficar atenta aos trabalhos que chegam até mim por indicação da família, amigos ou por pesquisa na internet e seguir aqueles que eu aprecio. Alguns dos nomes são: Maria Rita, Roberta Sá e Maria Gadú. Não parei ainda para ouvir o trabalho mais recente da Maria Gadú, mas, o primeiro disco dela, eu achei de um bom gosto e sensibilidade incríveis, com produção de Rodrigo Vidal. Adoro a veia de composição dela. Daquele álbum, minha canção predileta é Encontro – o trecho da letra “Deixa estar que o que for pra ser vigora. Eu sou tão feliz, vamos dividir os sonhos que podem transformar o rumo da história” – ecoam fortemente mim. De novo, nós somos o agente da história. Ouvi e adoro a versão da Maria Gadú para “Amor de índio” do Beto Guedes, que sempre foi pra mim uma das músicas mais importantes da minha vida. Enfim, espero que Maria Gadú continue trilhando esse caminho, criando e produzindo belezas como estas. Recentemente descobri e estou ouvindo e gostando muito do trabalho do Marcio Celli, uma voz bonita e letras interessantes do seu disco autoral “Da minha janela”. Marcio, assim como eu, é apaixonado por Rosa Passos, que continua sempre fazendo um trabalho bonito e consistente. Trabalhos de alma genuína como o de Rosa; são independentes de modismos, vem para ficar para sempre, apresentam um nível de qualidade indiscutível. Que Tom Jobim e Rosa Passos continuem me guiando nesse caminho.
19) RM: Quais os músicos já conhecidos do público que você tem como exemplo de profissionalismo e qualidade artística?
Juliana Areias: Muita gente boa, a começar novamente por todos esses artistas pelos quais tenho profunda admiração: Tom Jobim, Djavan, Lenine, Chico Buarque, Rosa Passos, Maria Gadú, Yamandú Costa e antes de Yamandú, o violonista Raphael Rabello, já falecido.
20) RM: Quais as situações mais inusitadas que aconteceram na sua carreira musical?
Juliana Areias: Inúmeras situações interessantes e inusitadas. Por exemplo, nos anos em que morei na Suíça, entre 1996 a 2000, fiz desde shows para autoridades na ONU – Organização das Nações Unidas em Genebra e no renomado Montreaux Jazz Festival, como cantei por uma semana, substituindo outro músico, em um “bar de programa” chamado “Piranhas” em Zurique. Acredite, o público do “Piranhas”, tanto as meninas, quanto os seus clientes, tinham excelente gosto e sensibilidade musical, além de todos serem muitos educados e o ambiente super respeitoso e inclusive muito mais decente do que outros bares “normais” por onde já me apresentei mundo a fora. Lição aprendida é que vale sempre a pena rever nossos “pré-conceitos”.
21) RM: O que lhe deixa mais feliz e mais triste na carreira musical?
Juliana Areias: O que me deixa mais feliz, além da realização diária de poder “viver do que eu cantar”; é quando o momento mágico de conexão com o público acontece. O que me deixa mais triste é se o momento mágico de conexão com o público não acontece.
22) RM: Nos apresente a cena musical da cidade que você mora?
Juliana Areias: Perth é uma cidade de cerca de um milhão e meio de habitantes e também a metrópole capital mais isolada do Mundo. Perth tem uma forte tradição de jazz, que vem de várias gerações. E hoje em dia se manifesta e se mantém no reconhecimento do WAAPA, como o melhor conservatório de Jazz da Austrália, atraindo ainda mais talentos para cidade – e do Ellington Jazz Club, a mais requintada casa de jazz da Austrália. Ambas instituições, trabalhando em conjunto com o JAzzWA e O Perth Jazz Society fazem dessa cidade um núcleo criativo interessantíssimo, do qual tenho muito orgulho de fazer parte e ter Perth como meu lar.
23) RM: Quais os músicos, bandas da cidade que você mora, que você indica como uma boa opção?
Juliana Areias: Além de todos os músicos que já citei que participaram do projeto de gravação comigo, gosto do trabalho da Shameen, na linha soul, a Libby Harmmer e o James Flynn, excelentes cantores de standarts de jazz. Aqui em Perth se encontra a Beleza Samba School, liderada por Mike Boase, certamente em termos de qualidade musical, a melhor “batucada” em estilo de escola de samba que já ouvi fora do Brasil. Gosto do trabalho musical da Tara Tiba, cantora iraniana que mistura a música tradicional de seu país com jazz.
24) RM: Quais os motivos que fizeram você mudar de país?
Juliana Areias: Morar no exterior era um sonho desde a infância. Meus pais se separaram quando eu tinha quatro anos de idade e meu pai teve uma namorada chamada Márcia Vianna, de quem eu gostava e ainda gosto muito. O namoro durou pouco, mas a amizade continuou. Márcia se casou e foi morar na Europa e sempre me mandava fotos, presentes, cartões postais escritos Sverige, que eu achava que era Suíça, mas só depois de muitos anos fui descobrir que era Suécia. Tarde demais, aos cinco anos de idade, o desejo e decisão de ir morar na Suíça, quando eu crescesse, se cristalizaram. Dito e feito, aos 21 anos, “quando eu cresci”, apareceu à oportunidade de me apresentar e morar na Suíça. Não pensei duas vezes. Fomos então com o nosso trio chamado Jazz Brasil para lá, formado por Carlinhos Franco (violão e voz), Plínio de Oliveira (sax/flauta) e eu. O ano de 1996 foi o ano de preparação dessa partida.
A música na minha mente que caracterizava esse período foi “Flor de ir embora”, da Fátima Guedes, que diz “Flor de ir embora. É uma flor que se alimenta do que a gente chora. Rompe a terra decidida, flor do meu desejo de correr o mundo a fora. Flor de sentimento, amadurecendo aos poucos a minha partida, quando a flor se abrir inteira muda a minha vida. Esperei o tempo certo. E lá vou eu. E lá vou eu. Flor de ir embora, eu vou. Agora esse mundo é meu”.
As questões de descontentamento com a política, corrupção, falta de segurança do Brasil já existiam, e cheguei a escrever naquele ano alguns poemas sobre isso, mesmo que motivação principal da viagem fosse pessoal, a realização do sonho de infância, esses outros motivos reforçavam esse desejo e a decisão.
Principalmente porque nesse ano, houve um episódio de eu ter sido assaltada na orla de Salvador-BA, no final da tarde, por um “pivete” de cerca de 10 anos de idade, que ameaçava me machucar com uma suposta faca embaixo da sua blusa. Esse acontecimento me trouxe uma indignação profunda, “pra que tanto céu, pra que tanto mar” se a gente não pode mais passear despreocupadamente na beira do mar e desfrutar de toda essa beleza. Motivados por esses sentimentos, eis os dois poemas que escrevi nessa época, antes de sair do Brasil:
Na beira do mar – Salvador-BA, Brasil, 29/2/1996 – 21 anos de idade.
Eu só queria caminhar, noite de lua, na beira do mar. \ Sair por aí, sem pressa de chegar. \Dar um tempo pra mim, me presentear. \Cabelo ao vento, precisando pensar. \ Viver meu momento, sentir o lugar. \ Eu só queria caminhar, noite de lua, na beira do mar. \ Mais uma bossa seria, de amor, de sorriso, de mar. \ Mas o que a gente não vive é a poesia. \ E ameaçaram meu cantar, sem precisar… \ Sem precisar ser \ Sem precisar ser assim \ Não precisava ser assim \ E é triste não poder caminhar, noite de lua, na beira do mar \ Eu só queria poder caminhar, noite de lua, na beira do mar. \ * para o pivete que me assaltou na orla da Pituba, ás 19:00. Consequências das consequências, eu sei…
Sonho Brasil – Salvador-BA, Brasil, abril de 1996 – 21 anos.
Eu, que não sou Chico, nem Francisco \ Não sou Tom, nem Antônio \ Apenas brasileira \ Querendo partir \ Pra Buarque de Holanda \ Ou qualquer outro lugar \ Dizer adeus Copacabana, princesinha do mar \ Onde meu barco naufragou, exausto de lutar, de tanto remar e nunca chegou \ Se navegar é preciso, viver também \ Num lugar de fala estranha, \ Fora do meu país, \ Deserto de mim \ Minha língua é meu cantar! \ Onde, por ironia, no fim. \ Longe do Brasil, mais perto de vivê-lo. \ E pensando ter perdido o meu mar anil \ É que vou reconhecê-lo \ Nos olhos de outros brasileiros \ Que nas ruas do mundo eu cruzar \ Brasileiros como eu \ Que não são Chico, nem Francisco \ Não são Tom, nem Antônio \ Mas abriram mão do Brasil \ Pra não abrir mão dos seus sonhos \ Sonho Brasil
PS: todos os poemas e canções escritas desde os 13 anos até hoje podem ser encontrados na pagina “lyrics” do meu website: www.julianaareias.com
25) RM: Quais os prós e contras de desenvolver uma carreira musical fora do Brasil?
Juliana Areias – Desenvolver qualquer carreira em qualquer lugar tem sempre os seus desafios. A carreira musical fora do Brasil tem os desafios de enfrentar um idioma e cultura diferente. Gosto desses desafios, porque sempre tive paixão por gente, história, culturas e idiomas. A beleza é poder levar aquilo que mais amo do Brasil, a beleza e riqueza da nossa música, sempre dentro de mim e poder compartilhá-la com as pessoas mundo afora. Poder trocar influências, ideias, sentimentos, pensamentos. Sou hoje em dia parte de todos esses lugares e eles são parte de mim. Em paralelo quero muito ainda poder ir ao Brasil e poder cantar, apresentar e compartilhar o meu trabalho ai também. Esse é o próximo grande sonho no qual já estou trabalhando para poder realizar.
26) RM: Como a música brasileira é vista na cidade que você mora?
Juliana Areias: Se comparado com a Europa, tanto na Nova Zelândia quanto na Austrália, a música brasileira é ainda um universo muito distante. O público em geral não conhecia muito além de “Mas que nada” de Jorge Benjor, gravado nos anos 60 por Sergio Mendes. Ainda acontece casos esporádicos de pessoas fazerem a confusão de achar que música brasileira é salsa, que estou cantando em espanhol e que a capital do Brasil é Buenos Ayres. O público de jazz conhece um pouco mais, principalmente Tom Jobim e Bossa Nova em geral. Então sempre me sinto com a missão de não só apresentar um trabalho artístico, mas também de educar. O público australiano tem recebido de braços abertos a nossa música, sempre lotando as casas de show onde me apresento.
27) RM: Existe algum tipo de resistência, restrição ou preconceito com músico estrangeiro por parte dos músicos e da mídia local?
Juliana Areias: Na minha experiência, não, na verdade acho que existe o contrário, um grande interesse, abertura e vontade de conhecer, fazer junto, apoiar. Desde a minha chegada, tenho tido a oportunidade de trabalhar com os melhores músicos da cidade, me apresentando nas melhores casas de show, festivais e nas melhores rádios, recebendo boa cobertura da imprensa e mídia australiana.
28) RM: Você viaja para fazer show em países vizinhos? Quais?
Juliana Areias: Sendo Perth a metrópole capital mais isolada do Mundo, tanto pra ir para Sydney quanto para Singapura são cinco horas de voo. Já estive me apresentando em Singapura duas vezes e costumo a ir a Sydney e Adelaide uma vez por ano. Em Sydney, fui por três anos consecutivos, junto com Marcio Mendes, participar do Festival Ritmo – Brazilian Day que reúne mais de 30 mil pessoas em Darling Harbour um dos cartões postais da cidade. No ano passado, fui fazer uma apresentação super especial com o Abuka, na casa de jazz 505. Gosto muito do trabalho do Abuka, que fazem música brasileira original de excelente qualidade, tocando com alguns dos melhores músicos de jazz de Sydney.
29) RM: Seu repertório é em português e inglês?
Juliana Areias: O meu repertório é 90% em português e os outros 10% em francês, Inglês, espanhol e Italiano.
30) RM: Você acredita que sem o pagamento do jabá as suas músicas tocarão nas rádios?
Juliana Areias: Aqui na Austrália já estão tocando sem pagar jabá, em boas rádios como RTR, SBS, ABC, Fremantle Radio Station e outras. Existem diversas rádios e rádios digitais pelo mundo afora, nos EUA, Havaí, Bélgica e Espanha, que já entraram em contato e já estão tocando o CD – Bossa Nova Baby.
31) RM: O que você diz para alguém que quer trilhar uma carreira musical?
Juliana Areias: Se você acredita em você e no que você faz e se você sente que o que você faz vai contribuir de forma positiva com o mundo: vai fundo, com coragem e incansável persistência. Tenha uma visão clara de qual objetivo sua música quer atingir e mantenha esse objetivo sempre firme no seu coração e cabeça. Você vai precisar revisitá-lo e reforçá-lo várias vezes. Experiência e aprimoramento vêm com dedicação e tempo. Não tenha pressa. Seja bem vindo.
32) RM: Como você analisa o papel da grande mídia em relação ao mercado musical?
Juliana Areias: Jornalistas e a classe musical sempre andaram de mãos dadas. A mídia informa e forma opinião. Apesar de todas as criticas que se faz a grande “mídia” como “entidade” que valoriza mais o comercial e nem sempre o artístico – conheço, acredito e sei de muita gente, de carne e osso, fazendo um excelente trabalho jornalístico dentro da “Mídia”. Acho que sabendo procurar, existe sim sempre espaço para todo mundo.
33) RM: Quais os seus projetos futuros?
Juliana Areias: Esse ano será dedicado à divulgação do CD mundialmente de forma online principalmente e planejamento de futuras turnês pela Austrália e futuramente para o Brasil, Nova Zelândia, Europa, Japão e EUA. Muitos anos de trabalho pela frente, como sempre foi até hoje e a tendência é só crescer.
34) RM: Quais seus contatos para show e para os fãs?
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