A cantora e compositora cearense Mona Gadelha divulga atualmente o seu terceiro CD – TUDO SE MOVE, que começa com uma marcha de carnaval antiga, “Bloco da Solidão” (Evaldo Gouveia/Jair Amorim), gravada por Maysa e Altemar Dutra. A música foi produzida, arranjada e executada pelo pianista carioca Fernando Moura, com percussão de Marcos Suzano, ganhou sonoridade jazzística com levadas de drum´n´bass.
O disco prossegue marcado pela forte presença dos recursos da música eletrônica – samplers, loops, ruídos, efeitos, texturas que se mesclam com canção brasileira, bossa, samba, jazz e rock (este sob a forma de balada, na regravação de “A Última Guerra” (Samuel Rosa, Lô Borges e Rodrigo Leão). Além de resgatar um clássico de carnaval, ela também relê um standard eternizado por Billie Holiday, “Love me or Leave”, que na versão em português de Fernando Cali Pereira ganhou o título de “Suspense”, transformado num samba-canção d&b também por Fernando Moura.
A cantora contou com a colaboração de cinco produtores: Fernando Moura, Alexandre Fontanetti (com quem trabalhou em seu primeiro CD), Álvaro Fernando (produtor de faixas do seu segundo disco), DJ Mau Sacht e Paulo Bira, além do DJ e produtor italiano Roby J.C., que assina a faixa 13, o remix “Saint-Denis-Ceará – Panaphonic”. “Foi enriquecedor trabalhar com vários produtores”, conta Mona. “De cada um ganhei sugestões, parcerias e novas experiências”. Como compositora, Mona assina parcerias com Fernando Moura (na faixa-título e “Noturna”, uma balada lounge com sotaque francês), Ricardo Cunha (na bossa pouco ortodoxa “Louca,Nua”) e Sergio Cruz (na dançante “Na Estação”).
Mona Gadelha cursou Comunicação Social em Fortaleza – CE, cidade onde nasceu. Começou cantando suas próprias canções em bandas de rock locais, como“Kaleidoscópio” e “Emoções Perigosas”. Com esta última, chegou a gravar um single e excursionar pelo nordeste. Terminada a graduação na Faculdade, mudou-se para São Paulo no final de 1985. Nessa época o jornalismo era sua atividade principal.
Escreveu sobre moda, marketing, propaganda, turismo, negócios e informática. Mesmo com a música em segundo plano, conheceu os guitarristas paulistanos Sergio Cruz e João Alberto, que se tornaram seus parceiros. Enquanto não voltava definitivamente para a música, em 1994 praticamente largou o jornalismo e foi trabalhar como produtora executiva de discos para selos independentes. No ano seguinte produziu seu primeiro CD, juntamente com o guitarrista Alexandre Fontanetti, Vladimir Ganzerla (co-produção) e Rosely Lordello (produção executiva), lançado pela Gravadora Movieplay no final de 1996.
Em agosto de 1998 gravou seu segundo CD – “Cenas & Dramas”, produzido por André Magalhães, diretor do Estúdio Zabumba e Álvaro Faria (sócio do VU Studio). Recentemente teve a música “Crepúsculo de uma Deusa” incluída no disco “Pra Lua Tocar”, da cantora Eliana Printes, que ficou entre as 10 mais tocadas em várias rádios do país, especialmente no Rio de Janeiro. Também já foi gravada pelas cantoras Ione Papas (“Cinema Noir”), Ana Torres (“Pessoas”, em parceria com Flávio Paiva), Karla Karenina (“Cor de Sonho”) e Lívia França (“Cor de Sonho”).
Segue abaixo entrevista exclusiva com Mona Gadelha para a www.ritmomelodia.mus.br , entrevistada por Antonio Carlos da Fonseca Barbosa:
01) Ritmo Melodia: Fale do seu primeiro contato com a música. Cidade de origem ?
Mona Gadelha: Nasci em Fortaleza – CE no dia 28 de outubro. Ouvia muito rádio e programas musicais na TV local. No festival de rock de um programa de rádio conheci muitos músicos e daí começamos toda uma cena de rock e blues no Ceará, na passagem dos anos 1970 para os 1980.
02) RM: Quais foram suas principais influências musicais? E quais as influências que permaneceram?
Mona Gadelha: Amava Os Beatles e Os Rolling Stones, Janis Joplin, Joni Mitchel, Os Mutantes e Rita Lee, Roberto e Erasmo Carlos, Gal Costa, Maysa, Bob Dylan, Miles Davis. Depois, a canção cearense de Ednardo, Fagner e Belchior (e todos os seus parceiros, grandes letristas). Nos anos 80 os Smiths, Pat Smith, Pretenders, João Penca e Os Miquinhos Amestrados, Legião Urbana. Mais recente, Moby e Radiohead. Acho que o sentimento blues permanece, o lirismo cearense, o existencialismo também, e a ironia de alguns, especialmente Rita Lee, citados acima.
03) RM: Qual sua formação musical? E quando iniciou a sua carreira musical?
Mona Gadelha: Estudei música sempre de forma muito fragmentada. Um pouco de Piano, um pouco de Violão, aulas de Canto por algum tempo. Mas por circunstâncias da vida. Eu acabei fazendo jornalismo e trabalhando muito nessa área, assim como na publicidade também. Com isso, tive dificuldade para administrar o tempo e conciliar tantos compromissos. Mas acho que a força da palavra na música foi o que me seduziu primeiro. Eu devorava livros, sempre gostei de escrever, e tive sorte de conhecer uma geração de letristas brilhantes na MPB.
04) RM: Quantos discos lançados?
Mona Gadelha: Lancei três CDs solo, fora as participações em algumas compilações e dois singles. O primeiro Mona Gadelha – saiu pela Movieplay, em 1996. Sempre é difícil definir, mas acho que é um álbum de música pop brasileira. Começa com rock e termina com baladas.
É um disco autoral, com a maior parte de composições próprias. Para minha surpresa, foi muito bem recebido pela crítica e abriu muitas portas para meu trabalho. Foi produzido por Alexandre Fontanetti, Vladimir Ganzerla e por mim. O segundo, CD- “Cenas & Dramas”, saiu pelo próprio selo, em 2000, e depois foi distribuído pela Eldorado, em 2001.
É um álbum mais conceitual do que o primeiro, com recursos da eletrônica (como programação e samplers), também utilizei guitarras distorcidas e muitos violões de aço. Foi produzido por Álvaro Fernando e André Magalhães. Com a escolha da “Johnny vai pra Guerra” para uma compilação na FNAC da Espanha, comecei a investir no mercado internacional, coisa que até então era bem distante para mim. A música que abre o disco, “Crepúsculo de uma Deusa” foi gravada por Eliana Printes e ficou entre as mais tocadas no Rio de Janeiro por algum tempo.
O terceiro, CD – “Tudo se Move”, foi produzido por vários amigos: Alexandre Fontanetti, Álvaro Fernando, Mau Sacht, Fernando Moura, Paulo Bira e pelo italiano Roby J.C. Foi lançado em 2004 e é distribuído pela Tratore. É um disco que utiliza bastante recursos da eletrônica, com as influências de MPB, rock e jazz, também presentes nos meus discos anteriores. Gravei mais outros do que músicas minhas. Adorei trabalhar com vários produtores, foi uma experiência muito interessante e um desafio conseguir no final um equilíbrio com tantas cabeças e suas idéias distintas.
05) RM: Comente sobre o seu show?
Mona Gadelha: O show tem o mesmo nome do CD – “Tudo Se Move”. Estreou em outubro de 2004 no Teatro do Sesc Pompéia, com uma banda, que incluía dois dos produtores do CD: o saudoso Mau Sacht (nas pick ups e laptop) e Álvaro Fernando na bateria. Contou ainda com Webster Santos (violões e guitarras), Beba Zanettini (piano e teclado) e Zeli (contrabaixo).
Utilizamos também recursos de vídeo, exibimos o clipe “Saint-Denis-Ceará”. Para a abertura convidamos um mestre-sala e porta-bandeira, e o Mau soltava uma base de escola de samba.Isso era a introdução de “Bloco da Solidão” (Evaldo Gouveia e Jair Amorim). Depois o público ficava vendo os dançando na sombra chinesa. O show foi ainda para o Sesc Santo André e Sesc Ipiranga.
06) RM: Como analisa a produção musical que está sendo feita a partir da década de 90 ?
Mona Gadelha: É uma produção bastante diversificada, com a queda das barreiras e fronteiras de estilos. Quando falo barreiras me refiro ao preconceito. Nos anos 80 sentia-se uma nítida separação entre a MPB e o pop brasileiro. Hoje esse hiato perdeu o sentido. Meu CD mesmo, às vezes está nas prateleiras de MPB e outras vezes na ala Pop. E para mim, também poderia ser jazz. Acho ótima essa possibilidade.
Sempre achei esquisito a música ser uma porção de feudos, capitanias hereditárias com donos e guetos. Claro, que as turmas permanecem, mas pode-se tentar entrar sem bater. Nos anos 90 também assistimos à ascensão dos recursos eletrônicos, mas também a proliferação de CDs acústicos. A produção fonográfica no Brasil tornou-se imensa, mas a divulgação continuou extremamente difícil no rádio, apesar da democracia da Internet. A música brasileira começou sua trilha rumo à conquista de mais espaço na Europa e nos Estados.Isso já no final da década, com o sucesso do esplêndido disco “Tanto Tempo”, de Bebel Gilberto.
07) RM: Quais os prós e contras de fazer um trabalho na cena independente ?
Mona Gadelha: Se você é milionário, é maravilhoso ser independente. É livre para lançar o que quiser e depois contratar um belo plano de mídia. Mas se você não pertence a esse clube, tudo se torna mais difícil.
As coisas melhoraram com a organização do setor, por meio de Associações como BM&A (Brazil, Music & Artes) e ABMI (Associação Brasileira de Música Independente). Mas de um modo geral encontramos muitas dificuldades e a principal delas é a divulgação no Rádio. E se você não toca no Rádio, está condenado ao anonimato para o grande público.
08) RM: Por que escolheu São Paulo para trilhar uma carreira profissional ?
Mona Gadelha: Poxa, me pergunto até hoje! Não, é brincadeira. Vim para uma cidade desconhecida, mas com muitas referências de ser um grande pólo cultural. Poderia ter sido o Rio de Janeiro, que já conhecia, onde tinha bem mais amigos.
Acho que vim na vontade de conhecer, e minha estratégia era trabalhar primeiro na área de jornalismo ou publicidade. Aqui já moravam dois amigos do Ceará, artistas plásticos, o Maurício Coutinho e o Siegbert Franklin, este também músico e parceiro na época do rock em Fortaleza. Queria tentar e se não desse, iria para o Rio de Janeiro. Acabei ficando já há 19 anos.
Era a segunda metade da década de 80 e consegui trabalho no jornalismo. Acho que isso me fez ficar também. Além de motivos sentimentais.
09) RM: Como você analisa a atuação cultural e musical dos seus contemporâneos?
Mona Gadelha: Vejo que há uma produção vasta por todos os lugares do país. Sou muito ligada na palavra e tenho grande admiração pelos achados poéticos do Nando Reis e da Adriana Calcanhotto, por exemplo.
Seria maravilhoso que o rádio fosse um meio de comunicação democrática, com espaço para essa grande diversidade brasileira e internacional também. De um modo geral, gosto de trabalhos e não apenas de um determinado tipo de música. Então ouço muito música clássica, jazz, rock, música eletrônica, bossa nova. E tem coisas maravilhosas em todas essas vertentes.
10) RM: Quais as suas divergências e convergências com o mercado fonográfico atual?
Mona Gadelha: A principal divergência é a aplicação das leis do capitalismo selvagem, eliminando a possibilidade de um artista poder ampliar seu público e conseqüentemente seu trabalho pelo fato de não poder investir verbas astronômicas em mídia. Isso é cruel.
Além disso é sempre terrível ter que engolir um executivo de gravadora dizendo que a música vive uma crise de criatividade, como ficou comum nos jornais. A convergência é a valorização que começaram a dar a produção de shows e a abertura de mais companhias independentes no mercado, incluindo grandes nomes como Djavan. Isso prova o declínio das grandes estruturas.
11) RM: Quem são seus principais parceiros musicais?
Mona Gadelha: Tenho vários parceiros. Com alguns fiz poucas músicas, como foi o caso do Flávio Paiva e Edmundo Vitoriano Jr., com quem tenho apenas uma parceria. Com Siegbert Franklin tenho várias canções. Quando cheguei a São Paulo me tornei parceria de Sergio Cruz e João Alberto, guitarristas. O mais atual é Fernando Moura (temos duas músicas no CD – “Tudo se Move”, as canções “Noturna” e “Tudo se Move”). De certo modo, considero os produtores do meus CDs também parceiros.
12) RM: Mona Gadelha, quais os projetos para 2006 ?
Mona Gadelha: Fazer shows em São Paulo e outras cidades, além de me dedicar a novas composições e novos parceiros. Já penso também no próximo CD, mas não sei se será possível começar a gravar este ano.
Continuar atuando na produção e criação de projetos culturais na Brazilbizz, empresa e selo de música da qual sou sócia. E concluir minha pós-graduação em globalização e cultura. Gostaria também de conseguir fazer o projeto “Iracema – do épico ao pop”, em homenagem aos 140 anos da publicação de Iracema, de José de Alencar.
13) RM: Mona Gadelha, quais os seus contatos?
Mona Gadelha: [email protected]
https://pt.wikipedia.org/wiki/Mona_Gadelha