Marietti Fialho tem uma voz acalenta a cena da música negra no sul do país, com o veludo da pele traduzido em sonoridades ao mesmo tempo suaves e cheias de força, com a delicadeza da mãe que acalenta seu filho e o poder da guerreira que defende a sua origem, usando como arma o som do instrumento musical mais antigo e perfeito.
Uma gaúcha e porto alegrense, bisneta de escravizados e de portugueses, que herdou o gosto e o talento para a música dos pais, Gerci Pacheco Fialho e Caitano Fialho Netto. Sua voz já ultrapassou as fronteiras do Rio Grande do Sul e foi ouvida no Rio de Janeiro, Uruguai, Argentina, Paris, Santa Catarina, Paraná, Minas Gerais, São Paulo e em todo interior do Rio Grande do Sul.
Marietti começou a ser ouvida, como integrante de uma das bandas pioneiras e até hoje uma das maiores referências do reggae feito no Rio Grande do Sul, a Motivos Óbvios (Geda, Renato Lubianca, Branka, Rick, Fernando Catatau). Ela começou como backing vocal, em 1990, e logo em seguida conquistou o posto de vocalista principal, que ocupou durante dez anos, com muita presença de palco, muita atitude e empatia com o público.
Em 2004 participou pelo Projeto Sempre as Terças, na Unisinos, no Teatro Padre Werner, que foi gravado pela TVE/RS e TV Unisinos, para o Programa Palcos da Vida, no Instituto Odomodê, Assembleia Legislativa (Sarau no Solar), na Cidade Camaquã, no Dia Nacional da Consciência Negra, em 2005.
Em 2006 fez show na cidade de Osório, pelo Simpósio de Cultural Negra. Gravou seu primeiro álbum solo independente em 2008 pelo projeto Fumproarte, com lançamento no Bar Opinião.
Em 2009 foi para o Rio de janeiro, onde teve uma temporada de divulgação e de participações em saraus como o de Omar Marzagão, nos shows da banda Tribo de Jah, com os músicos Udi Fagundes, Lizza Dias, Jair junior, Jahmiliano, Jovi Joviniano.
O seu show vai muito além do reggae, Marietti empresta sua voz para outros gêneros musicais, sempre com segurança e conhecimento. Ainda integrante da banda Motivos Óbvios, Marietti cantou blues como vocalista da Terraplane Blues. Cantou RAP com Piá e a banda Da Guedes, referências do hip hop local. E foi ainda backing vocal para Gilson e Banda Ponto G (atual Limusine Negra), no CD – Banda Partido de Primeira.
Essa bagagem toda coloca a Marietti em eventos de grande significado artístico, cultural e político. Ela foi Mestre de Cerimônias na primeira e quinta edições do saudoso Fórum Social Mundial de Porto Alegre – RS e cantou no primeiro, segundo e terceiro.
Foi Jurada do Prêmio Açorianos de Música de 2002 e da Nona edição do Festival de Porto Alegre. Ministrou também oficina de Técnicas Vocais na Escola João Satte – pelo projeto Escola Aberta, de outubro de 2005 a outubro de 2006 e na Associação de Moradores da Vila Santa Rosa.
Sempre em atividade, Marietti ainda canta em grandes eventos; na Semana da Consciência Negra, no Sesc Mulher deste ano. Participa do projeto GAIA Mulher Encanto, desde 2012, com turnês em cidades do interior, incluindo a capital, no Rio Grande do Sul.
As músicas que Marietti interpreta recebem em seus arranjos um brilho especial, com fortes influências do jazz, samba, reggae, funk, bossa nova e blues.
Com sua carreira consolidada da a nova fase de compositora, Marietti surpreende. Faz tempo, ela vem sendo acompanhada por um time de músicos de primeira, que garantem o balanço e a pegada. Que com muito carinho batizou de Cia Luxuosa.
Segue abaixo entrevista exclusiva com Marietti Fialho para a www.ritmomelodia.mus.br, entrevistada por Antonio Carlos da Fonseca Barbosa em 06.05.2022:
01) Ritmo Melodia: Qual a sua data de nascimento e a sua cidade natal?
Marietti Fialho: Nasci no dia 10 de janeiro de 1963 em Porto Alegre – RS. Registrada como Marietti Pacheco Fialho.
02) RM: Fale do seu primeiro contato com a música.
Marietti Fialho: Meu primeiro contato com a música foi desde que comecei a ter percepção do som, eu imagino que foi no ventre de minha mãe Gerci Pacheco Fialho. A música me embalou em todos os momentos de minha vida.
03) RM: Qual a sua formação musical e/ou acadêmica fora da área musical?
Marietti Fialho: Sou autodidata na música.
04) RM: Quais as suas influências musicais no passado e no presente. Quais deixaram de ter importância?
Marietti Fialho: Minhas primeiras influências foram meus pais, Dona Gerci Pacheco Fialho e Caitano Fialho Neto, ambos artistas natos. Artistas anônimos como muitos, principalmente sendo negros e morando no Rio Grande do Sul. Foram eles que me motivaram a ouvir música, em rodas de samba, em festas de batizado, casamento. Cantavam várias músicas…, era lindo de ver minha mãe e meu pai cantando e tocando pandeiro.
05) RM: Quando, como e onde você começou a sua carreira profissional?
Marietti Fialho: Comecei em 1990, quando entrei para a banda Motivos Óbvios (Geda – voz, Renato Lubianca – guitarra, Branka – percussão, Rick – contrabaixo, Fernando Catatau – bateria). Mas antes fiz parte do coral do colégio Júlio de Castilhos.
06) RM: Quantos CDs lançados?
Marietti Fialho: Em 1992 com a banda Motivos Óbvios participamos da coletânea “Porto Reggae” lançada em Vinil e depois de mais duas coletâneas: Em 2000, o CD – “Tri Legal do Reggae”, as bandas que participaram: Motivos Óbvios, Produto Nacional, Leão de Judah. Em 2001, o CD – “Reggae as Pampas” as bandas que participaram: Motivos Óbvios, Produto Nacional, Leão de Judah, Alelujah, Pure Feeling, Planet Roots, Rastamanos, Rastamen. Em 2008, lancei meu CD solo – “Eu vou à luta”. E também comecei uma nova fase como compositora.
07) RM: Como você define seu estilo musical?
Marietti Fialho: Livre.
08) RM: Você estudou técnica vocal?
Marietti Fialho: Não. Mas li sobre o assunto e tive acompanhamento de profissionais.
09) RM: Qual a importância do estudo de técnica vocal e cuidado com a voz?
Marietti Fialho: Importante o conhecimento de seu instrumento de trabalho (a Voz). Sua anatomia, funcionamento, cuidados… Cuidar da voz bebendo muita água, não competir com volumes altos, dormir bem.
10) RM: Quais as cantoras (es) que você admira?
Marietti Fialho: São muitos. Gosto de ouvir e perceber a técnica usada pelo intérprete. Sempre observei a maneira de cantar destes artistas. Minha mãe Gerci Pacheco Fialho (foi minha primeira professora), Elza Soares, Loma, Maria Helena Montier, Maria Bethânia, Alcione, Leni de Andrade, Emílio Santiago, Ney Matogrosso, etc.
11) RM: Como é o seu processo de compor?
Marietti Fialho: Inspiro-me na minha vida, em minhas experiências, o que sinto e almejo, na minha realidade. Que acaba sendo a de muitas mulheres, como eu: pobre, preta e de periferia.
12) RM: Quais são seus principais parceiros de composição?
Marietti Fialho: Meu primeiro parceiro musical foi Elton Rolim. Depois Cláudio Costa, Márcio Bandeira, Alan Barcellos, Nando Africano, Renato Borba se agregam a esta lista. São grandes parceiros.
13) RM: Quem já gravou as suas músicas?
Marietti Fialho: Minhas músicas foram executadas em shows de outros artistas. Mas não foram gravadas por nenhum artista até o momento.
14) RM: Quais os prós e contras de desenvolver uma carreira musical de forma independente?
Marietti Fialho: É bem complicada. Mas ao meu ver é bem mais tranquila. Ser dono de seu trabalho, não dever nada a gravadoras, não ficar preso as obrigações fonográficas. Poderia ficar citando mais, mas ser livre é a palavra.
15) RM: Quais as estratégias de planejamento da sua carreira dentro e fora do palco?
Marietti Fialho: Trabalho na base. Meu trabalho é admirado por pessoas que multiplicam essa admiração e respeito. Uso as redes sociais, mas sem muita paranóia. O mercado é veloz. Meu ritmo é outro. Meu trabalho tem de ser saboreado e digerido com tranqüilidade.
16) RM: Quais as ações empreendedoras que você pratica para desenvolver a sua carreira?
Marietti Fialho: Postagens de vídeos, com gravações, shows e lives…
17) RM: O que a internet ajuda e prejudica no desenvolvimento de sua carreira?
Marietti Fialho: Esta competição injusta que é imposta. Logaritmos…Postagens diárias… likes… isso cansa.
18) RM: Quais as vantagens e desvantagens do acesso à tecnologia de gravação (home estúdio)?
Marietti Fialho: Acho que tem muitas vantagens o home estúdio. Trabalhar em seu ambiente, bom custo e benefício. É claro que tem um gasto, que está por muitas vezes aquém de nossas possibilidades. Software, programas, placas de áudio, tudo requer investimento.
19) RM: No passado a grande dificuldade era gravar um disco e desenvolver evolutivamente a carreira. Hoje gravar um disco não é mais o grande obstáculo. Mas, a concorrência de mercado se tornou o grande desafio. O que você faz efetivamente para se diferenciar dentro do seu nicho musical?
Marietti Fialho: Ainda não está fácil. Como eu já havia citado: competir com esse mercado é cansativo e desleal. Muito não tem esse aparato. Hoje se contrata empresa para impulsionar uma carreira. Faz-se necessária uma constante postagem em redes socais para estar “bombando”. Qual o limite? Gravar um álbum por ano, lançar uma música por mês…
20) RM: Como você analisa o cenário musical brasileiro. Em sua opinião quais foram as revelações musicais nas últimas décadas? Quais permaneceram com obras consistentes e quais regrediram?
Marietti Fialho: A cena musical brasileira está cheia de pessoas talentosíssimas, outras nem tanto e outras nada. Mas existem os que nunca serão “revelados”, pois são esmagados por um sistema que não oportuniza. Mas que tem muito talento. Meu parâmetro não se alinha com os da grande mídia, por isso não posso responder esta pergunta.
21) RM: Quais os músicos já conhecidos do público que você tem como exemplo de profissionalismo e qualidade artística?
Marietti Fialho: Gilberto Oliveira, Cláudio Costa, Marcio Bandeira, Luís Vagner, Alexsandra Amaral, Loma Pereira.
22) RM: Quais as situações mais inusitadas aconteceram na sua carreira musical (falta de condição técnica para show, brigas, gafes, show em ambiente ou público tosco, cantar e não receber, ser cantado, etc)?
Marietti Fialho: Tem muitos episódios, que dariam para escrever um livro. Um episódio foi em 2009 quando participei de um Sarau no apartamento de Augusto Marzagão no bairro de Copacabana no Rio de Janeiro. Fui chamada para cantar em meio a grandes nomes da MPB, Tavinho, Vatusi. Na hora de pegar o microfone estiquei mais que devia e o cabo arrebentou, era curto e eu não percebi. Fiquei muito mal, meu rosto queimava. Daí ouvi vozes na sala, “manda ver”, “canta”, “dá-lhe Marietti”. Respirei fundo e cantei, foi muito bom, eu conheci a cantora Watusi, e dei meu CD para ela.
23) RM: O que lhe deixa mais feliz e mais triste na carreira musical?
Marietti Fialho: Ter o dom e amar o que faço, me faz feliz. O desrespeito ao meu trabalho e a arte me deixa triste.
24) RM: Você acredita que sem o pagamento do jabá as suas músicas tocarão nas rádios?
Marietti Fialho: Não acredito que minha música toque em rádio comercial sem o pagamento do jabá. Todas as rádios que tocam minhas músicas são em sua maioria comunitárias e/ou independentes.
25) RM: O que você diz para alguém que quer trilhar uma carreira musical?
Marietti Fialho: Trabalhar com a verdade e ser fiel a si mesmo.
26) RM: Como você analisa a cobertura feita pela grande mídia da cena musical brasileira?
Marietti Fialho: A grande mídia visa o lucro.
27) RM: Qual a sua opinião sobre o espaço aberto pelo SESC, SESI e Itaú Cultural para cena musical?
Marietti Fialho: Tem que ser mais abrangente a oportunidade desses espaços para os artistas. Não é um favor, é uma obrigação de empresas que lucram com o trabalho, investir na cultura.
28) RM: Como você analisa o cenário do reggae no Brasil. Em sua opinião quais foram as revelações musicais nas últimas décadas? Quais permaneceram com obras consistentes e quais regrediram?
Marietti Fialho: Não tenho esta estatística. Gosto de vários artistas do reggae. E o reggae com certeza tem muitos representantes.
29) RM: Você é Rastafári?
Marietti Fialho: Não.
30) RM: Alguns adeptos da religião Rastafári afirmam que só eles fazem o reggae verdadeiro. Como vocês analisam tal afirmação?
Marietti Fialho: Depende de que ângulo se vê. Da religião ou somente musical.
31) RM: Na sua opinião quais os motivos da cena reggae no Brasil não ter o mesmo prestígio que tem na Europa, nos EUA e no exterior em geral?
Marietti Fialho: O mercado do reggae no exterior é bem diferente do Brasil. Existem interesses fonográficos, o artista que sai para o exterior, é só o que a grande mídia quer ou paga (o velho Jabá).
32) RM: Existe o Dom musical? Como você define o Dom musical?
Marietti Fialho: Existe. O dom é aquilo que se sente no momento do contato. Faz-te viajar, esquecer dores, rancores. Faz bem, limpa, relaxa, sem contraindicação.
33) RM: Quais os prós e contras do Festival de Música?
Marietti Fialho: Prós do Festival de música são os possíveis novos talentos. Contras: são manipulações e interesses.
34) RM: Quais os pros e contras de se apresentar com o formato Sound System?
Marietti Fialho: Já cantei no formato Sound System. É uma forma diferente de apresentação e bem usada fica muito bom. Particularmente gosto de me apresentar com banda.
35) RM: Quais as diferenças de se apresentar com banda em relação ao formato com Sound System?
Marietti Fialho: O fator humano é maior com apresentação de banda.
36) RM: Quais os seus projetos futuros?
Marietti Fialho: Continuar compondo e fazendo projetos para minha música rodar para todos que quiserem ouvir e em cada canto esquecido.
37) RM: Quais seus contatos para show e para os fãs?
Marietti Fialho: (51) 99143 – 6999 | [email protected]
| https://www.facebook.com/mariettifialho
| https://www.instagram.com/mariettifialhooficial
| https://www.youtube.com/channel/UC3NtvlFCiYRLddo_BvacMBg
Marietti Fialho e Cia Luxuosa: https://www.youtube.com/watch?v=IeaY_jPf4Vw
| Live Projeto Mistura Fina do Teatro São Pedro Marietti Fialho e Cia Luxuosa 22 de abril de 2021: https://www.youtube.com/watch?v=wravsHw5dUs
| https://www.youtube.com/channel/UCKuBq9uPw3Og5_AHH6ohwKw
| Marietti Fialho – “Eu vou à luta”: https://www.youtube.com/playlist?list=OLAK5uy_lQeikdi-Avm7l0fUF6H_iQDZYnUo429Pg
É muito lindo o trabalho da Marietti Fialho, com sua rica variedade de ritmos… é muito show. Parabéns e muito sucesso Marietti! Viva Ritmo Melodia!
Que mulher guerreira e com um ótimo trabalho com a música, avante sempre.