Leandro Maia é cantor, violonista e compositor. Professor Adjunto da Universidade Federal de Pelotas. Doutor em Música pela Bath Spa University/Reino Unido com a tese ‘Poetics of Song: songwriting habitus in the creative process of Brazilian music’ (link). Mestre em Literatura Brasileira (UFRGS) com a dissertação Quereres de Caetano: da canção à Canção (link). Especialista em Letras – Práxis da Criação Textual (Uniritter) (link). Licenciado em Música (UFRGS).
Dentre seus últimos lançamentos, encontra-se o álbum Guaipeca: uma ilusão autobiográfica, lançado em 2023 e produzido exclusivamente em LP através de financiamento coletivo (veja a campanha, ouça o single). O trabalho rendeu apresentações no Brasil, Inglaterra e Costa Rica e grande repercussão na imprensa, chamando a atenção para sua “proposta sem coleira” (ouvir o trabalho completo).
Sobre Guaipeca, o crítico musical Juarez Fonseca declarou que Leandro “já um dos grandes da música brasileira, ao nível dos melhores” e que o disco é das “melhores coisas que ouviu sobre os tempos que correm”. (Paralelo 30, 29/09/2023).
A jornalista Andressa Pufal (Jornal do Comércio, 09/02/2023) escreve que “o cão de rua tem o mundo como casa” e que “Maia não gostaria de sumir nos circuitos digitais pelos quais se ouve música ouve em dia”, destacando a produção autobiográfica em LP. Karine Dalla Valle (Zero Hora), descreve o trabalho como “um elogio aos que não se domesticam” e que “até o modo de produção do disco é uma insurgência” (Zero Hora, 08/09/2023 – Capa Segundo Caderno). (mini-clipping e mais detalhes).
O trabalho também recebeu uma edição do premiado programa O Sul em Cima, de Kleiton Ramil. No mesmo ano, Leandro participou como artista e colaborador do Acorde Brasileiro – Encontro Nacional das Músicas Regionais, em Pelotas, em homenagem à memória de Luiz Carlos Contursi, seu idealizador.
Antes de Guaipeca, Leandro Maia lançou o emocionante filme Paisagens (2021), celebrando 20 anos de carreira e seu retorno ao Brasil. O audiovisual, feito de forma alternativa e experimental, tem direção de Juliano Ambrosini e Nando Rossa, da Bumbá Produtora de Conteúdo. Paisagens é um road movie em que Leandro percorre espaços genuínos de Pelotas com seu fusca 1972, presente do falecido irmão mais velho.
O trabalho propõe o fusca como uma cápsula do tempo e guia um passeio sobre os 20 anos de carreira e o retorno ao Brasil, após o período do doutorado na Inglaterra. Destaque para a coreografia de Diadorim, performada por Maria Falkembach, atriz e bailarina, em meio ao Pontal da Barra, na beira da Lagoa dos Patos/Praia do Laranjal, e a conversa com o jornalista e escritor Nauro Júnior, à beira do Arroio Pelotas, sobre tempo, fuscas e os homenageados Barão de Itararé e Aldyr Schlee Neste mesmo período, Leandro lançou seu livro sobre análise de canção popular – Quereres de Caetano: da canção à Canção, pela Paco Editorial.
Neste período, Leandro seguiu colaborando com Pablo Lanzoni, Marcelo Delacroix e Álvaro Rosacosta. Com Pablo Lanzoni, Leandro Maia escreveu as canções Deus na Laje, interpretada por Valéria Barcellos e Cordel, com arranjo e interpretação pianística de Bianca Gismonti. As parcerias integram o álbum Delírio Geral, de Pablo Lanzoni e Thiago Colombo. Com Marcelo Delacroix, Leandro atuou como letrista e participou dos show da campanha de financiamento do disco Tresavento, incluindo a canção título e História de Nós Dois.
Com Álvaro Rosacosta, Leandro fez parcerias para três espetáculos: Pequeno Trabalho para Velhos Palhaços, direção de Adriane Mottola, letra para Canção dos Velhos Palhaços (Álvaro Rosacosta e Simone Rasslan, 2020); Letra para temas de Sambaracacotu, de Carlota Albuquerque e Amazônia: um olhar sobre a Floresta, de Camila Bauer/Projeto Gompa, recebedor do Prêmio Tibicuera de Melhor Espetáculo e Troféu Açorianos de Melhor Disco Infantil.
Ainda no processo de retorno ao Brasil, Leandro Maia colaborou com Betto Serrador e a Orquestra Manouche como letrista nas canções Seja o que Deus Quiser, que recebeu dois videoclipes, incluindo a participação do Pastor Henrique Vieira e o dueto formado pelas solistas cariocas Cássia Raquel e Lilian Valeska. Outras canções desta parceria são Outras Eras, dedicada à ativista Elisa Quadros (canva) e Do jeito quer for, canção epílogo do disco.
A convite do Conselho de Educação Popular da América Latina e Caribe (CEAAL), em meados de 2021 Leandro Maia compôs a música tema em homenagem ao centenário de Paulo Freire, contando com a participação de diversos artistas numa produção em meio à pandemia de Covid-19 e em resposta à tentativa de apagamento da memória e do legado do Patrono da Educação Brasileira.
Como ativista, Leandro foi um dos organizadores do Festival Salve Salve, realizado em 2018, no Centro Municipal de Cultura de Porto Alegre, reunindo mais de 100 artistas em defesa da TVE e da FM Cultura, emissoras públicas e fundações do Estado do Rio Grande do Sul.
Leandro foi o compositor brasileiro agraciado pela primeira edição do Prémio Ibermúsicas de Composición de Canción Popular, concedido pela Organização dos Estados Ibero-americanos, em 2015. Como resultado, realizou-se a coletânea Itinerário Canción, com todos os vencedores ibero-americanos.
Em 2016, recebeu o Prêmio Açorianos de Melhor Intérprete, pelo disco Suíte Maria Bonita e Outras Veredas produzido por André Mehmari, também destacado no Açorianos como Melhor Produtor Musical. O disco foi gravado em 2014, com recursos do Prêmio Funarte de Música Brasileira, com gravações e shows em Pelotas (BPP), Porto Alegre (Salão de Atos da UFRGS), São Paulo (Sesc Ipiranga) e Lisboa (Museu da Música).
No disco, destaca-se a participação e a parceria com Vitor Ramil (Eu-Nuvem), a participação de Maria João Grancha (Waterfall, de Mehmari/Maia) e de Sérgio Santos (Sobressalto, de Mehmari/Maia). Parcerias com Thiago Colombo (Passarim Miguilim), Sílvio Mansani (Seguiu Viagem) e Fábio Mentz (Caminho da Roça), também brilham no trabalho. O espetáculo Suíte também concorreu a melhor Espetáculo no Prêmio Açorianos e foi televisionado pela TVE-RS. Ainda 2016, Leandro participou do concerto Ivan Lins e a Orquestra da Ulbra no auditório Araújo Vianna, em Porto Alegre, tendo suas canções arranjadas para orquestra (assistir).
Leandro vem participando de coletâneas brasileiras e latino-americanas, nos discos Itinerario Canción (Argentina, Prêmio Ibermúsicas, 2019), Cien Anos de Calypso (Costa Rica, 2019, ouvir), ao lado de artistas como Jorge Drexler, Cantoamerica, Inti-Illimani e outros nomes da canção latino-americana.
Nesta coletânea Leandro interpretou a canção Long Tongue Man, do ícone calipsoniano Walter Ferguson, grande homenageado. A faixa contou com a participação especial do mestre Shona Chartwell Dutiro (Mbira). Na sequência, Leandro Maia produziu duas faixas para o disco Queen of the Sea – Evora e Breda Anansi da cantora afro-limonense Stephie Davis, em projeto realizado pelo mestre da Música Costarricense Manuel Monestel.
Em 2017, Leandro Maia escreveu música original para a animação Final Call/Última Chamada da diretora portuguesa radicada no Reino Unido Sara Barbas. A produção contou com profissionais da Holanda, Inglaterra e Dinamarca, recebendo menções e prêmios em festivais internacionais de cinema, incluindo o Prêmio de Melhor Filme de Animação nos festivais Little Wing Film Fest (Londres, 2017), Leiria Film Fest (Lisboa, 2018) e Prêmio de Mérito na One-Reeler Short Film Competition (Los Angeles, 2017).
Em seguida, mais uma produção com seu violão na trilha do delicado curta Algo que eu disse/something I said, também de Sara Barbas e da equipe da Animanostra, produtora portuguesa. O filme está nomeado ao Prêmio Sophia 2024, da Academia Portuguesa de Cinema, como melhor filme de curta-metragem de animação.
Como parte de seu doutoramento, Leandro produziu a compositora pelotense Conceição Rosa Teixeira, já na idade de 87 anos em 2017o primeiro disco (ouvir), filme, songbook (ler) e espetáculo Dona Conceição dos Mil Sambas, Dona Conceição vive na Vila Castilho, em Pelotas, e possui milhares de sambas inéditos.
Ainda como pesquisa artística, Leandro concebeu o produziu o festival Mistura Mundo Sul Generis, contemplado pelo Bath Spa Pioneers Award/Reino Unido, em Pelotas e Porto Alegre. Em sua pesquisa artística, integrou o quarteto internacional Kusanganisa (Mistura) junto com Chartwell Dutiro (Mbira, Zimbábue), Chris Blanden (baixo, Inglaterra), Nick Sorensen (sax, Inglaterra). O grupo gravou o CD Kusanganisa e diversos audiovisuais, participando de festivais e concertos na Inglaterra, Bélgica, Holanda e Brasil, com um DVD live in Brazil em processo de lançamento.
Durante sua estada no exterior, Leandro internacionalizou seu trabalho colaborando com artistas e tocando para plateias da Inglaterra, França, Espanha, Holanda, Bélgica e Portugal em diversas formações. Dentre as diversas atividades, destaca-se a participação no Festival Catalão Barnasants em parceria com a Casa America Cataluña, de orientação antifascista, realizado na cidade de Barcelona/Espanha.
No início da carreira, como artista solo, Leandro Maia lançou Palavreio, seu CD-livro de estréia, considerado um dos dez melhores discos brasileiros de 2008 (Jornal Zero Hora, 16/12/2008 e ABC Domingo, 28/12/2008), vencedor do Troféu Açorianos de Música, categoria Revelação e Troféu RBS Cultura, Menção Honrosa.
Em 2010 participou como convidado especial nos shows do cantor e compositor Ivan Lins, na ocasião do lançamento do CD Perfil nas cidades de Porto Alegre e Pelotas, em comemoração aos quarenta anos de carreira deste grande compositor brasileiro.
Em 2011 participou como cantor, compositor e violonista do CD Canteiro, do genial multiinstrumentista André Mehmari. Participa também do CD Álbum, do compositor Fábio Mentz, lançado em Porto Alegre. Em 2012 participou do show André Mehmari e Convidados – lançamento do Cd Canteiro, no SESC Pompéia, em São Paulo, ao lado de nomes como Mônica Salmaso, Ná Ozzetti, Luciana Alves, Chico Pinheiro, Sérgio Santos, Neymar Dias, Sérgio Reze e Alexandre Andrés. Em maio de 2012 realizou o show Dos Voces Poéticas, ao lado do saudoso cantautor e ativista costarricense Dionísio Cabal, no Theatro Nacional da Costa Rica, passando por mais duas cidades em turnê pelo país centro-americano.
O ano de 2012 ainda marcou o lançamento de Mandinho, trabalho dedicado ao universo infantil, caracterizado como uma obra múltipla de música, audiovisual, artes cênicas. Entre 2012 e 2015, Mandinho se apresentou como álbum, estreou no 20º Porto Alegre Em Cena e realizou turnês como espetáculo de música e formas animadas ao lado da Cia Gente Falante, sendo indicado como Melhor Espetáculo de 2014 no Prêmio Açorianos de Música.
Mandinho também foi lançado em videoclipes de animação e aplicativos móveis. Em 2015, o trabalho realizou uma ocupação artística no Museu do Doce, em Pelotas, em celebração ao lançamento do videoclipe Samba da Páscoa com a exposição Mandinho no Museu. Em 2014, com Mandinho e convidados, Leandro Maia atuou e dirigiu na Cerimônia de Abertura da Conferência Mundial da International Society for Music Education (Opening Ceremony).
Ao todo, Leandro possui cinco Prêmios Açorianos de Música: Grupo MPB (Café Acústico, 1999 e 2000), Revelação (2009), Disco Infantil (2012), e Intérprete (2016). Recebeu também o Troféu RBS Cultura – Menção Honrosa por Palavreio. Possui dois troféus do Prêmio Brasil-Sul de Música, pelo disco Mandinho, de Melhor Projeto Gráfico e Melhor Intérprete. Além disso, vale mencionar os prêmios compartilhados com Álvaro Rosacosta e equipe, sendo um Troféu Açorianos de Melhor Disco Infantil e um Prêmio Tibicuera de Melhor Trilha Sonora, já mencionados.
Leandro iniciou a carreira como violonista, cantor, arranjador e compositor do Quinteto de Música Popular de Câmara Café Acústico (1998 a 2001), com o qual recebeu os dois prêmios já referidos e venceu a segunda edição do II Festival de Música de Porto Alegre (1999).
Café Acústico gravou um disco demo homônimo e era integrado por Alexandre Vieira (Alê Viê, contrabaixo e arranjos), Fabiane Oliveira (flauta transversal e voz), Felipe Karam (violino e cavaquinho), Leandro Maia (violão e voz) e Vinícius Prates (flauta transversal).
Neste período do início dos anos 2000, Leandro colaborou com trabalhos de Jorge Herrmann (Fim e Cantigas de Ninar Vento), Zé da Terreira (Quem tem boa é pra cantar), e o coletivo Música Humana, formado por Alejandro Massiotti, Dunia Elias, Antonio da Rosa, Mimmo Ferreira, entre outros parceiros.
Como idealizador, realizou o projeto Gauchada Sul Generis, selecionado para o CCBB-RJ numa série ao lado de Renato Borghetti, Gisele de Santi, Marcelo Delacroix e Pedrinho Figueiredo. No projeto, Leandro também integrou o trio pelotense Nó de Pinho, contando com a participação especialíssima do ídolo Kleiton Ramil, do lendário grupo “Os Almôndegas” e da dupla “Kleiton & Kledir”.
Atualmente, Leandro Maia se dedica também à pesquisa e à docência, nas áreas de Pesquisa Artística, Processos Criativos, Produção e Políticas Culturais integrando o Núcleo de Pesquisa em Música Popular (NUMP) e coordenando o Grupo de Estudos em Produção e Políticas Culturais e a Agência de Indústria Criativa e Mobilização Social (Agimos) da Universidade Federal de Pelotas, incluindo a organização publicações como Pelotas Território Sonoro (Álbum e Catálogo) e Caderno Agimos Observa: Mapeamento da Dança no RS (livro).
Segue abaixo entrevista exclusiva com Leandro Maia para a www.ritmomelodia.mus.br, entrevistado por Antonio Carlos da Fonseca Barbosa em 25/06/2025:
01) Ritmo Melodia: Qual a sua data de nascimento e a sua cidade natal?
Leandro Maia: Nasci no dia 23 de agosto de 1979 em Caxias do Sul/RS, durante a passagem da família por lá, conduzida pelo pai bancário. Com um ano de idade fui para Bento Gonçalves e com dois anos, para Porto Alegre, onde passei a maior parte da vida. A mudança para Poa ocorreu ao som de “Deu Pra Ti”, dos amados Kleiton e Kledir.
02) RM: Fale do seu primeiro contato com a música.
Leandro Maia: Aprendi a cantar antes mesmo de aprender a falar. Minhas primeiras memórias são de cantar numa língua inventada em frente à janela do apartamento em Poa, olhando a praça. Meus irmãos, já mais velhos, todos estudavam música: minhas irmãs, piano e meu irmão, violão. Convivi desde cedo com vinis, métodos de música, partituras e muito rádio do meu pai e assovios e cantarolares afinadíssimos da minha mãe.
03) RM: Qual a sua formação musical e/ou acadêmica fora da área musical?
Leandro Maia: Minha formação musical inicia-se com esta pré-disposição em um ambiente familiar musical. Aos oito anos de idade, além das aulas de música da escola regular, com uma ótima professora, iniciei aulas numa escola intitulada “Oficina de Música”, com a intenção de estudar piano.
Minha introdução ao instrumento, foi bastante criativa e alternativa, ligada à improvisação nas teclas pretas, a escala pentatônica, uma metodologia que mais tarde descobri ser de uma revolucionária pedagoga argentina, Violeta Gainza – que tive o prazer de conhecer no Forum Latino-Americano de Educação Musical (FLADEM), quando já professor de música. Isto me abriu uma abordagem criativa ao piano que utilizo até hoje. Meu instrumento principal, no entanto, é violão.
Iniciei com um vizinho que, ao ser convocado para o exército, teve de parar de dar aulas. Então passei a fazer aulas de violão clássico propriamente dito com um professor uruguaio – Juan Centurión, violonista clássico e luthier. Então, aos doze anos, já sabia que queria ser músico e frequentava aulas com Juan em seu atelier com violões abertos e músicos frequentando seu espaço. Juan teve de voltar ao seu país e tive aulas com outros professores como Renato Mor, que me incentivou a estudar teoria no Conservatório Pablo Komlós, da OSPA.
Daquele meio de estudantes de música, passei a integrar aos quatorze, quinze anos, o projeto Prelúdio da UFRGS, onde cantei em coral com Agnes Schmelling, integrei o Conjunto de Música Popular com Alexandre Vieira e estudei violão com Fernando Mattos, mais tarde meu professor de harmonia e arranjo na Universidade.
Fui aluno também da violonista Flávia Domingues Alves, que orientou meu recital de conclusão de curso. Estudei muitas coisas, mas minha formação e atuação musical é integralmente musical – Graduação em Licenciatura em Música/Violão, pela UFRGS – com uma especialização em Praxis da Criação Textual (Uniritter), um Mestrado em Literatura Brasileira (UFRGS), estudando canção popular, e um doutorado em Música na Bath Spa University/Reino Unido.
04) RM: Quais as suas influências musicais no passado e no presente. Quais deixaram de ter importância?
Leandro Maia: As influências são múltiplas. A presença de Heitor Villa-Lobos, por exemplo, na minha maneira de construir o violão segue até hoje, junto com outros autores que estudei intensamente no período de formação como violonista. No âmbito coral, arranjadores como Fernando Mattos, Marcos Leite, Pablo Trindade, que sempre fizeram uma ponte importante entre erudito e popular.
Como cancionista, sem dúvida a geração que completa 80 anos agora, a turma do que ficou estabelecido como MPB dos anos 60 e 70, Chico, Caetano, Gil, Milton, Ivans Lins e todo esse patrimônio. Mas confesso que as influências são mais vizinhas, digamos, a turma dos 70 e 80 da música do Rio Grande do Sul: Vitor Ramil, Kleiton e Kledir/Os Almôndegas, Bebeto Alves, Gelson Oliveira, Nelson Coelho de Castro, Zé Caradípia. Nico Nicolaiwvsky e Cláudio Levitan.
Influências mais imediatas e próximas como compositor foram Marcelo Delacroix, Ronald Augusto, Arthur de Faria, Gustavo Finkler, Alexandre Vieira, Carlos Patrício e Mário Falcão. Um apreço especial aos uruguaios Leo Masliah, Eduardo Mateo e Jorge Drexler. Na Costa Rica conheci grandes mestres como Walter Ferguson e Max Goldenberg. Mulheres compositoras que me fazem a minha cabeça são Violeta Parra, Rita Lee, Nara Lisboa e Dona Conceição dos Mil Sambas.
05) RM: Quando, como e onde você começou a sua carreira musical?
Leandro Maia: Estabeleço como data de lançamento musical a conquista do II Festival de Música de Porto Alegre, em 1999, com o Quinteto Popular de Câmara Café Acústico, interpretando a música Retirantes, de Alexandre Fisch, da qual fui intérprete e arranjador. O marco é muito significativo dada as dimensões e características do festival: um grande festival composto de várias eliminatórias nas 16 regiões do Orçamento Participativo com uma final no Auditório Araújo Vianna, no coração de Porto Alegre.
06) RM: Quantos álbuns lançados?
Leandro Maia: Sou violonista. Apenas componho eventualmente ao piano, mas não ouso acompanhar ninguém ao piano além de tocar minhas próprias canções e trilhas. Participei em incontáveis discos e colaborações no Brasil, Costa Rica e Inglaterra.
Na minha carreira como compositor, lancei cinco álbuns: Palavreio (2008, produzido por Pedrinho Figueiredo), Mandinho (2012, co-produzido com Luiz Ribeiro); Suíte Maria Bonita e Outras Veredas (2014, produzido por André Mehmari); Paisagens (2020, EP com algumas faixas ao vivo do Filme) e Guaipeca: uma ilusão autobiográfica (2023, produzido por Luciano Mello).
Este último em formato LP (disco de vinil) e sem lançamento integral nas plataformas, com acesso físico ou digital apenas pelo meu site. Agora, estou em processo de Pré-Produção com os parceiros do Bando Gramelô, formado por Kako Xavier, Sulimar Rass e Cardo Peixoto, para o lançamento de uma coletânea conjunta.
07) RM: Como é o seu processo de compor?
Leandro Maia: Infinito e variado e ocorre de várias maneiras e de acordo com cada parceria. Tendo tempo, tenho minha preferência de iniciar pela música, construindo uma base sólida com uma narrativa subliminar. Entendo que a letra é uma transcriação, ou seja, uma tradução em que a letra deve revelar o conteúdo intrínseco da música. A letra com compatibilidade de texto, fonética compreensível e comunicativa e efeitos poéticos, sempre com muito diálogo intertextual com matrizes culturais diversas. Com parcerias, dentre receber letra para musicar ou música para letrar, prefiro músicas para letrar, mas tenho também algumas parcerias musicando letras enviadas por parceiros e parceiras.
08) RM: Quais são seus principais parceiros de composição?
Leandro Maia: O parceiro com o qual tenho mais canções, numericamente falando, é o genial André Mehmari. Neste caso, atuo mais como letrista, “traduzindo” suas melodias. Outro parceiro profícuo e constante é o Marcelo Delacroix, que me orgulho muito dos nossos processos e resultados.
Outros artistas com parcerias lindas e já gravadas são Jerônimo Jardim, grande mestre, Tarita de Souza, Fábio Mentz, Daniel Wolf, Silvio Mansani, Thiago Colombo, Betto Serrador, Pablo Lanzoni e Ronald Augusto, Álvaro Rosacosta e Simone Rasslan. Vitor Ramil é um parceiro incrível que, além de compartilhar processos em letra e música, me inspira com abordagens e eventuais feedbacks importantes em minhas próprias criações.
09) RM: Quais os prós e contras de desenvolver uma carreira musical de forma independente?
Leandro Maia: Seria normal mencionar a liberdade artística como uma característica da produção independente e a possibilidade de compatibilizar a atividade dos compositores e compositoras com outras atividades artísticas e profissionais. O que vejo atualmente, no entanto, é uma “independização” geral – mesmo de artistas consagrados, por vezes uma “uberização” da profissão.
O que quero dizer é que a estrutura da indústria fonográfica se modificou muito. Muitos grandes selos e gravadoras sequer tem estúdios de gravação ou celebração de contratos. Sequer encomendam discos e outras produções. Os compositores que se virem com todas as etapas de produção, sendo a distribuição e divulgação realizada pelos selos, se muito.
Com exceção de gêneros massivos como Sertanejo Universitário e Gospel, praticamente todos os profissionais criativos da música encaram a produção independente em maior ou menor grau. Existe um desafio comum a todas as criadoras e criadores que é transcender a lógica do streaming e das redes sociais para mecanismos menos colonizados e mais efetivos e recompensadores aos criadores e produtores.
10) RM: Quais as estratégias de planejamento da sua carreira dentro e fora do palco?
Leandro Maia: Toda estratégia no palco depende do planejamento e produção fora do palco. Busco planejar minhas ações considerando todas suas etapas de produção e a melhor remuneração possível de todos colaboradores e colaboradoras, sejam artistas, técnicos, produtores e outras funções. Pra mim, ainda que um projeto artístico seja o mais independente e autofinanciado possível, deve ser pensado enquanto projeto cultural com o devido plano, etapas de realização, formato de lançamento, espetáculo para circulação e um plano de divulgação bastante focado.
Eu sou daqueles caras que se envolve, de alguma maneira, em todas as etapas: dou meus pitacos nos releases, busco contribuir com conceitos e referências para as capas dos trabalhos, adoro ideias para figurinos, iluminação e roteiro e me deixo dirigir em cena com total confiança nos profissionais da equipe.
11) RM: Quais as ações empreendedoras que você pratica para desenvolver a sua carreira musical?
Leandro Maia: A minha atuação da Universidade Federal de Pelotas me permite desenvolver diversas ações no âmbito do empreendedorismo cultural na interface com a pesquisa acadêmica. Neste sentido, destaca-se a Agimos – Agência de Indústria Criativa e Mobilização Social, braço do Grupo de Estudos em Produção e Políticas Culturais. Orgulho-me em dizer que a Agimos, em pouco mais de um ano de atuação, realizou diversas produções e publicações importantes e que foi indicada como finalista na categoria Convergência do Prêmio Profissionais da Música (PPM), um reconhecimento e um incentivo muito importante.
12) RM: O que a internet ajuda e prejudica no desenvolvimento da sua carreira musical?
Leandro Maia: A internet segue sendo, pra mim, muito mais um instrumento de comunicação do que qualquer outra funcionalidade. É através dela que recebo músicas de parceiros, compartilho gravações em processo de coprodução, submeto projetos a editais culturais, armazeno arquivos e memórias. Sou francamente a favor da regulação saudável das redes sociais, reconhecendo o seu impacto e importância cada vez maiores. Sigo, no entanto, um grande adepto do rádio, da televisão e do jornal enquanto veículos de informação e produção de conteúdo qualificado.
13) RM: Quais as vantagens e desvantagens do acesso à tecnologia de gravação (home estúdio)?
Leandro Maia: O conceito de home estúdio é bastante amplo. Adolescentes em seu quarto, com seu computador, microfone e placa de som, por exemplo, consideram seu local de produção um home estúdio. De outro lado, profissionais possuem espaços caseiros bastante desenvolvidos em termos de isolamento acústico, tratamento e equipamentos de gravação analógicos e digitais, como é meu caso.
Acredito, no entanto, que um estúdio de gravação propriamente dito é insubstituível, dado seu acesso público, o envolvimento com outros profissionais técnicos especializados e o compartilhamento de um ecossistema criativo ao vivo e a cores com mais gente. Uma grande vantagem, sem dúvida, é conciliar estes ambientes, reunindo versatilidade, competência, profissionalismo e colaboração entre estas esferas.
14) RM: No passado a grande dificuldade era gravar um disco e desenvolver evolutivamente a carreira. Hoje gravar um disco não é mais o grande obstáculo. Mas, a concorrência de mercado se tornou o grande desafio. O que você faz efetivamente para se diferenciar dentro do seu nicho musical?
Leandro Maia: Boa questão. Essa é uma busca incessante. Acredito que gravar com profissionalismo e como as coisas devem ser segue sendo um grande desafio, embora facilitado pela tecnologia. O fato é que o ouvido é – até que inventem algo diverso (e não estamos longe disto) é analógico, físico e cheio de truques.
O meu nicho musical, pensando neste campo de uma música popular cantada em português com predominância de instrumentos físicos e analógicos e enraizamento cultural, é particularmente desafiador. Acredito que o grande diferencial deste campo é o reconhecimento da crítica especializada e a reputação construída com os colegas de trabalho.
Neste sentido, mobilizar é o elemento chave, mantendo os pés enraizados e os ouvidos antenados aos antecessores e a generosidade em dia para os que estão chegando. Neste sentido eu destacaria a produção de trabalhos como o Festival Sul Generis, a luta pela TVE-RS e a FM Cultura (emissoras públicas), o Songbook de Dona Conceição dos Mil Sambas e o livro musical Pelotas Território Sonoro: Prêmio Agimos de Produção Musical, que contou com a curadoria e mentoria de nomes como Kleiton Ramil, Anaadi, Zudizilla, Pedrinho Figueiredo e Marcos Abreu.
15) RM: Como você analisa o cenário musical brasileiro. Em sua opinião quais foram as revelações musicais nas últimas décadas? Quais artistas permaneceram com obras consistentes e quais regrediram?
Leandro Maia: Não temos dúvidas das contribuições dos movimentos dos anos 1960 a 1970, desde a Bossa Nova, passando pela MPB Engajada, o contraste com a Jovem Guarda e a revolução da Tropicália, assim como coletivos como Os Almôndegas, Secos e Molhados e o Clube da Esquina e seus artistas mentores.
De alguma forma, soma-se a este cenário, a partir dos anos 1980, 1990 e do Sec. XXI em diante, o RAP e a pujança da black music, o Rock Brasileiro e o surgimento de poéticas regionais muito potentes. A canção brasileira é uma tradição sólida e que merece consolidação e constante lembrança.
Um dos grandes desafios é precisamente a contemplação deste legados pelas novas gerações. Tenho alunos num bacharelado em música que não conhecem a obra de Chico Buarque, por exemplo, para citarmos um dos baluartes da música brasileira. Ao mesmo tempo, temos um número impressionante de novos criadores, gente que já surge “profissionalizada”, digamos, com plena consciência da música como profissão – o que muita gente leva tempo para galgar.
Se fosse para mencionar apenas um nome revelação, minha aposta seria da cantora, compositora e artista visual Paola Kirst, em especial sua colaboração com o Kiai Grupo. Artistas do interior do Rio Grande do Sul, atuação impecável e uma ética artística, enquanto posicionamento diante do mundo contemporâneo muito bem realizada.
16) RM: Como você analisa o cenário da música instrumental brasileira. Em sua opinião quais foram as revelações musicais nas últimas décadas? Quais artistas permaneceram com obras consistentes e quais regrediram?
Leandro Maia: A música instrumental brasileira é tão pujante e sofisticada que pertencer e se estabelecer neste cenário a pessoa precisa ralar muito. Sendo uma área de trabalho e formação, acho muito difícil alguém “regredir” neste campo, que é, digamos cumulativo. Assim, não saberia indicar alguém que tenha regredido e, caso me ocorresse, desconfiaria do meu próprio julgamento e eu não externaria a opinião negativa ou depreciativa.
Nas últimas décadas, possivelmente a maior revelação tenha sido a do André Mehmari, artista inigualável enquanto multi-instrumentista, compositor versátil da ópera ao jazz, do lead à canção popular. Sou fã do André muito antes de ser seu parceiro e, claro, considero a parceria um verdadeiro prêmio. Renato Borghetti possui um legado absurdo como acordeonista e compositor. Outro parceiro genial e virtuoso é o violonista Thiago Colombo de Freitas, que todo mundo deveria conhecer.
No âmbito de instrumentistas mais jovens, nomearia pessoas como o percussionista, multi-instrumentista e compositor Antonio Loureiro, o violonista e bandolinista Pedro Franco, assim como a violinista Clarrissa Ferreira, também cantautora e a percussionista e compositora Dessa Ferreira (não são irmãs, apesar do sobrenome).
17) RM: Quais as situações mais inusitadas aconteceram na sua carreira musical (falta de condição técnica para show, brigas, gafes, show em ambiente ou público tosco, cantar e não receber, ser cantado, etc)?
Leandro Maia: Que maravilha. Várias situações citadas na pergunta. Uma vez, numa das minhas primeiras apresentações em televisão ao vivo, com o Quinteto Popular de Câmara Café Acústico, meu primeiro trabalho profissional. Super nervoso, eu derrubei uma estante de partituras com um chute na abertura das câmeras e ao vivo, quase acertando a apresentadora. No repertório, fizemos “Tocando em Frente”, de Renato Teixeira e Almir Sater. Na hora de “como um velho boiadeiro tocando a boiada”, saiu “ beijando a boiada”. Hahahahaha. Morri de vergonha.
18) RM: O que te deixa mais feliz e mais triste na carreira musical?
Leandro Maia: Felicidade: chegar a lugares e realizações que eu jamais imaginei chegar. Encanta-me a magia de criar algo “do nada”, subir ao palco com amigos e viver a aventura das criações. Sigo a mesma criança que aprendeu a cantar antes de aprender a falar.
Tristeza: Perceber que tudo é efêmero, os retrocessos na vida democrática nacional, a ameaça a conquistas sociais. Identificar que, apesar dos avanços na política cultural, ainda sequer temos um Plano Nacional das Artes, sempre relegada ao último lugar, perseguida por uns, ignorada por tantos, alvo de preconceito de muita gente.
19) RM: Quais os estudos técnicos para independências das mãos para um violonista?
Leandro Maia: Eu gosto muito da abordagem que a minha professora Flávia Domingues Alves fazia dos métodos de Abel Carlevaro: uma mescla de arpejos, traslados e escalas condensados num mesmo exercício. Na minha abordagem pessoal, agreguei um vocalize como forma de buscar a interrelação e a independência entre mãos, voz e violão.
20) RM: Quais os estudos técnicos para o desenvolvimento da técnica das “três mãos” mão esquerda fazendo a linha do Baixo, a mão direita fazendo acordes e melodia?
Leandro Maia: Não tenho esta resposta precisa no âmbito do piano que, como comentei, estudei de forma pouco ortodoxa. Imagino que os princípios das Invenções de Bach associadas a abordagens em Música Popular ao estilo Luiz Eça tenham muito a contribuir.
Ao violão, instrumento a que realmente me dediquei academicamente, cabe pensar muito bem os princípios de complementaridade, saindo do “lugar-comum”, explorando melodias em regiões graves, o aproveitamento de abordagens timbrísticas como a campanella, o contraponto inspirado no violão de sete cordas e a harmonização nas cordas primas do instrumento, possibilitando que a voz ocupe a região central, amparada por acordes com notas agudas, se considerarmos o contexto de voz e violão.
21) RM: Você acredita que sem o pagamento do Jabá as suas músicas tocarão nas rádios?
Leandro Maia: Eis a importância fundamental e uma das razões da minha luta pelas emissoras públicas, educativas e comunitárias e, sobretudo, a regionalização dos pontos de comunicação e amostragem do Ecad possam contribuir para solucionar esta questão do jabá, ou payola, termo utilizado no estrangeiro.
O que é mais grave, além do Jabá, é que a própria rede de emissoras privadas concentra-se por estilos musicais. Então, mesmo que eu fosse um bilionário e pagasse jabá pelo meu repertório, ele não encaixaria na programação de emissoras tomadas pelo agronegócio e pela indústria de bebidas, ao lado das emissoras religiosas, sujeitas à especulação financeira em nível global. Já não se trata apenas de verba, ao meu entender, mas de um projeto estético-ideológico no qual minha produção musical não apenas não se encaixa, como enfrenta diretamente.
22) RM: O que você diz para alguém que quer trilhar uma carreira musical?
Leandro Maia: Seja bem vinda, bem vindo, bem vinde ao front. A produção musical independente alimenta a alma do país na mesma medida em que a agricultura familiar garante a comida na mesa da população. Cultura, agricultura e ecologia estão no mesmo barco e a sustentabilidade é uma luta de todo mundo. Boas vindas ao time!
23) RM: Quais os Pianistas e Tecladistas que você admira?
Leandro Maia: Já teci elogios a pianistas aqui. Acrescentaria o trabalho de Catarina Domenici, pianista contemporânea; de Bianca Gismonti, na música instrumental, Nelson Ayres e Cristóvão Bastos na música popular.
24) RM: Quais os compositores eruditos que você admira?
Leandro Maia: Tenho um encanto enorme pelos barrocos, sempre. De outras eras mais recentes, Prokofiev, Debussy e Stravinsky me apaixonam. A singeleza de Esther Scliar, na composição coral me arrebata. No violão erudito, acho exemplar a produção e conduta de Augustín Barrios Mangoré.
25) RM: Quais os compositores populares que você admira?
Leandro Maia: Minha absoluta admiração por Tião Carreiro, Lucio Yanel e Hermeto Pascoal. Mencionei diversas influências cancionistas anteriormente. A trajetória de Lupicínio Rodrigues, sobretudo após a iluminação pela biografia musical escrita por Arthur de Faria, vem me arrebatado intensamente. Piazzolla sempre. Paulinho da Viola e Cartola são imensos.
26) RM: Quais os compositores da Bossa Nova que você admira?
Leandro Maia: Sem negar a dupla Tom Jobim e Vinícius de Moraes, tenho um carinho todo especial pelas letras de Newton Mendonça, um diferencial da metacanção brasileira, alguém que elevou nossa produção lírica a outros patamares. Joyce revisita a bossa, o samba e outras matrizes com uma maestria incrível.
27) RM: Quais os compositores do Jazz que você admira?
Leandro Maia: Ando numa fase totalmente Chet Baker e, em contraste, sigo enfeitiçado por Thelonious Monk e Nina Simone.
28) RM: Quais as principais diferenças entre as técnicas de Piano e Teclado?
Leandro Maia: Embora forasteiro nesta discussão, cada instrumento de teclado tem sua especificidade e há um abismo entre os diversos teclados: seja piano, cravo, acordeon, digamos, e as versões eletrônicas. Plugou, é outro instrumento. O mesmo vale para a voz. Microfonou…, temos outra relação.
A analogia é a mesma entre violão e guitarra: a materialidade, o peso, o mecanismo de martelos, pedais, etc, mudam completamente a sonoridade, os tempos de resposta, as reações. No álbum Guaipeca, por exemplo, gravei pianos preparados e abertos, tocando diretamente nas cordas e percutindo no corpo da madeira do instrumento, que não seriam possíveis com um instrumento eletrônico. O reverb possibilitado pelas cordas soltas, sem mecanismo, mesmo percutindo a madeira gerou densidades impressionantes. Refiro-me à faixa “Perto de Você”, na versão do LP.
29) RM: Quais as principais técnicas que o aluno deve dominar para se tornar um bom Pianista/Tecladista?
Leandro Maia: Além da desenvoltura mecânica e independência entre as mãos e os diferentes toques e golpes, o piano exige considerar técnicas expandidas, enquanto o teclado exige um conhecimento em tratamento de áudio e efeitos bastante importantes.
30) RM: Quais os principais vícios e erros que devem ser evitados pelo aluno de Piano/Teclado?
Leandro Maia: Tenho acompanhado alunos que partiram do autodidatismo para, então, estudar formalmente seu instrumento e a transição foi/ tem sido muito difícil. A técnica é fundamental para evitar lesões e limitações criativas. Uma boa orientação é fundamental. Consciência corporal é uma busca de todos os artistas do corpo, dentre eles e elas, os musicistas.
31) RM: Quais os principais erros na metodologia de ensino de música?
Leandro Maia: Acredito que a concepção de ensino que parte de repertórios, ao invés de práticas, tende a ser problemática. Ao mesmo tempo, as práticas educativas sem o diálogo com as vivências musicais que todas as pessoas possuem em suas culturas, tende a ser estéril. A multiplicidade de culturas e práticas musicais complexifica perspectiva do que vem a ser um método aplicável a todas as pessoas, de qualquer idade, cultura, gênero, etc.
Em suma, metodologias totalizantes, pré-estabelecidas e idealizadas precisam ser superadas. E aí o paradoxo: sem um pensamento metodológico-investigativo, não é possível construir uma ponte pedagógica. O desafio é ter a consciência de tempo-espaço-contexto que equilibre tradição, ancestralidade, exploração e curiosidade.
32) RM: Existe o Dom musical? Como você define o Dom musical?
Leandro Maia: Sou, enquanto pesquisador de processos criativos e educador musical de formação, relativamente avesso à ideia de Dom, sobretudo escrito assim, em maiúsculas. Isto não significa que eu não compreenda e não admire o encanto, a magia, ou mesmo o sagrado e o divino, por assim dizer, das práticas musicais.
A música é uma capacidade inata ao ser humano, tanto quanto a linguagem – pensando na linguística generativa de Noam Chomsky, por exemplo. Todas as pessoas em todas as culturas possuem capacidades inatas para a linguagem, para o simbólico, para a música e outras expressões artísticas.
Algumas pessoas, claro, possuem desenvolturas, predisposições, interesses, inteligências, ou quaisquer outras denominações, que se diferenciam das demais pessoas – ou da média das pessoas. Mas somos uma espécie musical por excelência. A questão é ter a oportunidade de descobrir, num universo imenso de musicalidades, quais nos toca mais intensamente.
33) RM: Qual a definição de Improvisação para você?
Leandro Maia: Improvisar pode ser malabarismo e pode ser mímica. Pode envolver virtuosismo de enfrentar limites e gerar surpresas, pode captar pela cumplicidade e pela sugestividade. Sempre surpresa, mas surpresa codificada. Um bom improvisador cria uma conversa com seu parceiro, seja ouvinte, seja outro músico, seja uma plateia interativa.
34) RM: Existe improvisação de fato, ou é algo estudado antes e aplicado depois?
Leandro Maia: Não há como improvisar – ou seja, intuir – sem que gestos, dispositivos, paradigmas sejam incorporados ao ponto de serem esquecidos. Sonha-se com o que se vê. Improvisa-se com o que se sonha.
35) RM: Quais os prós e contras dos métodos sobre Improvisação musical?
Leandro Maia: Entendo que existam muito mais prós do que contras. Método é estudo. Os contras ocorrem quando a improvisação peca pela previsibilidade, frases, escalas, arpejos, gestos clichês e prontamente reconhecíveis. O excesso de energia, ou a falta de energia. Para imaginar, é necessário arriscar-se. O mesmo vale para a improvisação. O estudo, ou treino, por outro lado, dá confiança ao malabarista, ao equilibrista, à ginasta. Prender-se ao gestual pré-estabelecido, no entanto, denota boa memória, mas pouca ousadia.
36) RM: Quais os prós e contras dos métodos sobre o Estudo de Harmonia musical?
Leandro Maia: Assim como na improvisação, não acreditam que existam contras. Não há contras quando se tem ousadia e imaginação suficiente e, só se tem ousadia e imaginação com confiança e prática. Música é conhecimento prático, ainda que pensado e lido, precisa de aplicabilidade num instrumento ou conjunto. Todo método necessita de um espaço para experimentação. Senão, não é música, no meu entender.
37) RM: Você toca outros instrumentos musicais?
Leandro Maia: Sou um explorador por excelência. Neste sentido, busco adquirir e minimamente compreender e brincar com essa tecnologia ancestral que são os instrumentos musicais. Obviamente, os instrumentos de cordas dedilhadas, me permitem maior desenvoltura e minha paixão por ritmos e instrumentos de percussão me incentivam a transitar por couros, baquetas, peles. Chego a tocar candombe uruguaio de maneira intensa que poucos instrumentistas se arriscariam, dada a técnica peculiar de mãos e baquetas.
38) RM: Quais os prós e contras de ser multi-instrumentistas?
Leandro Maia: Não vejo nenhum contra, no meu caso. Acredito que os instrumentos e suas idiomaticidades auxiliam a compreender, ampliar e enxergar nosso idioma nativo, ou seja, o instrumento no qual temos maior desenvoltura. Falar outras línguas revela gramáticas, expressões idiomáticas e sintaxes que não percebíamos antes, em nossa língua materna.
39) RM: Quais os seus projetos futuros? Quais os Prêmios recebidos?
Leandro Maia: Atualmente, dedico-me à construção do espetáculo do Bando Gramelô, onde buscamos desenvolver uma linguagem de grupo vocal e instrumental com vocalidades expandidas, espaço para improvisação e composição de canções que abordem humor e olhar sempre crítico em relação às coisas do mundo.
Em 2022 – Prêmio FAC Territórios Criativos (Projeto AGIMOS – Agência de Indústria Criativa e Mobilização Social), pela Fundação Delfim Mendes Silveira/UFPel. Em 2022 – Prêmio Tibicuera de Melhor Trilha (Amazônia, um Olhar sobre a Floresta, de Álvaro Rosacosta e Camila Bauer).
Em 2022 – Prêmio Açorianos de Música de Melhor Disco Infantil (Amazônia, um Olhar sobre a Floresta, de Álvaro Rosacosta e Camila Bauer). Em 2017 – Bath Spa Pioneers Award – Prêmio de Pesquisa concedido pela Bath Spa University/Banco Santander. Em 2016 – Prêmio Açorianos de Música – Melhor Intérprete. Também foi indicado a Melhor Disco e Melhor Compositor. Em 2015 – Prêmio Ibermúsicas de Composición de Canción Popular (Organização dos Estados Ibero americanos).
Em 2013 – Prêmio Açorianos de Música – Melhor Disco Infantil. Em 2013 – Prêmio Brasil-Sul de Música – Melhor Cantor. Em 2009 – Prêmio Açorianos de Música 2008 – Revelação, Secretaria Municipal da Cultura de Porto Alegre. Em 2009 – Menção Honrosa – Troféu RBS Cultura. Em 2007 – Troféu Destaque do Mês – Programa Lugar de Criança é na Família e na Escola, Prefeitura Municipal de Porto Alegre.
Em 2000 – Prêmio Açorianos de Música – Melhor Grupo MPB, Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre. Em 1999 – Prêmio Açorianos de Música – Melhor Grupo MPB. Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre. Em 1999 – Premiação UFRGS 65 anos, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Em 1999 – II Festival de Música de Porto Alegre, Secretaria Municipal da Cultura (SMC).
40) RM: Quais seus contatos para show e para os fãs?
Leandro Maia: (51) 98444 – 6072 | www.leandromaia.com.br | https://linktr.ee/Leandro.Maia | [email protected] | https://www.instagram.com/leandromaiacompositor | https://www.facebook.com/LeandroMaiaOficial
Canal: https://www.youtube.com/@leandromaiamusic
Spotify: https://open.spotify.com/intl-pt/artist/387P3dwczzOtkExGMR2ye5
Um artista com trajetória muito importante, tanto ao compor a música tema em homenagem ao centenário de Paulo Freire quanto por ser ativista, além de toda sua história atuando no cenário musical.
Maravilha!!!