O analista de sistemas de formação, radialista, DJ, Selector, colecionador, Pesquisador mineiro Ênio Lacerda apaixonado pelo mundo musical.
Simplesmente um amante do Reggae Roots Music. Além de apreciar a sonoridade reggae é apaixonado pelas histórias que norteiam o ritmo. Para ele o reggae tem cheiro, cor e sabor! A musicalidade é apenas umas dessas sensações e não foca em apenas em ouvir, mas contempla o reggae na sua totalidade.
Ênio com Ednei (Salvador – BA), Muniz (Angra dos Reis – RJ), Reinaldo (Ilhéus – BA) e Dino (Codó – MA) fundou o movimento Reggae Good Idea em 2016, que inicialmente era apenas um grupo de amigos no WhatsApp com o objetivo de compartilhar música e conhecimento. Ao longo dos anos esse movimento cresceu e hoje conta com Rádio Web com aplicativo, Canal no YouTube, Facebook, Twitter, Instagram, Blog. Hoje o movimento Reggae Good Idea é acessado em mais de 100 países em todas as suas plataformas.
O movimento Reggae Good Idea tem como objetivo principal o compromisso com o Reggae e tratar o reggae com o devido respeito que ele merece.
Segue abaixo entrevista exclusiva com Ênio Lacerda para a www.ritmomelodia.mus.br, entrevistado por Antonio Carlos da Fonseca Barbosa em 03.11.2019:
01) RitmoMelodia: Qual a sua data de nascimento e cidade natal?
Ênio Lacerda: Nasci no dia 03 de novembro de 1985 em Itacarambi – Minas Gerais.
02) RM: Como foi o seu primeiro contato com a música?
Ênio Lacerda: Apesar do estado de Minas Gerais ser muito rico na música caipira; que ouvia com bastante frequência quando garoto, as primeiras evidências sonoras que chegam a minha mente no momento foram os grandes cantores e grupos de Rock dos anos 70.
Meu tio tinha um Bar na beira do Rio São Francisco e me lembro dele colocar na vitrola para tocar: Rod Stewart, ABBA, Beatles, Bob Dylan, Pink Floyd entre grandes que marcaram principalmente os anos 70.
03) RM: Qual a sua formação musical e acadêmica fora da área musical?
Ênio Lacerda: Formação musical nenhuma. Sou formado em Análise e Desenvolvimento de Sistemas. E autodidata como radialista e DJ.
04) RM: Quais as músicas que você escutava no passado e no presente? Quais deixaram de ter importância?
Ênio Lacerda: Ainda jovem, escutava desde a música caipira, passando pelo rock e chegando ao reggae. Ouvia Milionário e José Rico… Creedence Clearwater Revival… Edson Gomes. Atualmente meu tempo é focado em escutar, creio que, 95% de Reggae Music, pois ainda gosto de pesquisar outros sons para ouvir, recentemente estava ouvindo Tim Maia, Jorge Bem, Djavan entre outros.
Acredito que faz bem permitir que os ouvidos apreciem outros sons que de uma forma ou outra foram influenciados ou influenciaram o reggae. Para mim nenhum som deixou de ter importância, no início dos anos 90 a internet ainda engatinhava no Brasil e por morar no interior não tinha muito acesso as informações sobre o mundo musical, então, o leque de possibilidades musicais eram poucas.
À medida que comecei a me integrar mais com o mundo digital a busca por informações ficavam cada vez mais fáceis e numa quantidade absurda, não sabia que o reggae era tão gigante, pois conhecia meia dúzia de cantores. Então fui me focando cada vez mais em conhecer a fundo o gênero. As vezes em casa me pego escutando João Mineiro e Marciano, música raiz nunca sai de cena.
05) RM: Fale sobre a sua trajetória como radialista.
Ênio Lacerda: A primeira experiência foi numa rádio ainda em Minas Gerais, certa vez mostrei o acervo (Cassete, Vinil, VHS, CD, Revistas, Livros…) que tenho para ele e ai pintou o convite para fazer um programa focado no reggae, creio que fizemos uns 10 programas porque na época me mudei para São Paulo. Retomei essa atividade a pouco tempo com a criação do grupo e consequentemente com a rádio.
06) RM: Quando, como e onde começou a sua carreira como DJ?
Ênio Lacerda: O ser Radialista é também um ser DJ e vice-versa, montamos nossas seleções para o público apreciar, dançar, sentir… Minha primeira experiência como Tocador de Reggae (Digamos assim) numa rádio, ainda em Minas Gerais creio que, em 2004 ou 2005.
Um radialista local me convidou para fazer um programa em sua rádio, tocar reggaes, contar sobre o ritmo e tal. “Momento Reggae” era o nome do programa, até hoje tenho uma gravação de um dia, creio que fiz uns 10 programas mais ou menos.
07) RM: Qual a diferença entre a função de Selekta e DJ?
Ênio Lacerda: Recentemente assisti um documentário sobre a história dos Sounds Systems na Inglaterra, eles citam que o Selector tem o papel de pesquisar e selecionar as músicas para tocar nos Sounds. Ele tem papel crucial nas buscas de coisas inéditas, raras, exclusivas etc…
Porque é isso que irá atrair o público: coisa nova tocando. Enquanto que o show ficaria por conta do DJ, tocar o som, agitar o público, animar, cantar e promover o evento. Gostei dessa definição.
08) RM: Fale da criação da Rádio Web Reggae Good Idea.
Ênio Lacerda: Começamos com um grupo de WhatsApp em julho de 2016, no início tínhamos pouca gente nesses grupos, estava engatinhando. À medida que o tempo passava íamos conquistando mais membros, chegou um momento que tínhamos três grupos de tanta gente que chegava.
Algumas pessoas chegaram junto, compraram a ideia e começaram a me ajudar, a vestir a camisa: Ednei (Salvador – BA), Muniz (Angra dos Reis – RJ), Reinaldo (Ilhéus – BA) e Dino (Codó – MA), grandes agradecimentos, pois o sucesso do movimento Reggae Good Idea teve/têm a colaboração deles.
Chegamos num ponto onde queríamos compartilhar o Reggae, conhecimento Reggae, música Reggae, pois ser apenas um grupo de WhatsApp era bem limitado, não teria um alcance para as massas ao redor do mundo. E ai surgiu a ideia de montar um Web Rádio que colocamos no ar em Janeiro de 2017 e hoje ela atinge povos nos quatro cantos do mundo.
09) RM: Fale sua atividade como colecionador de Vinil de Reggae.
Ênio Lacerda: Comecei minha coleção com fitas K-7, depois passei para o vinil, para o arquivo digital. Mas o vinil tem seu charme, seu cheiro, sua identidade, existe uma atmosfera no vinil que não existe em nenhuma outra mídia e é isso que encanta e o faz reviver nos dias atuais.
É muito arcaico ver uma agulha ler um disco preto e dali sair um som, é fantástico, surreal. Grande parte do meu acervo é composto de vinis de Reggae, mas também tenho de outros ritmos: Samba, Sertanejo, MPB, Rock… Compro discos em grande parte no exterior em sites especializados, principalmente na Europa. É uma terapia.
10) RM: Quais os cantores, cantoras e banda que você admira?
Ênio Lacerda: Bob Marley sem sombra de dúvidas é a grande inspiração para mim. Alton Ellis é outra fera. Curto muito do período Ska-Rock Steady. Grandes nomes que brotavam dos estúdios: Studio One, Treasure, Beverley etc etc, grandes gênios saíram desses locais.
11) RM: O que a internet ajuda e prejudica no desenvolvimento a sua carreira de DJ?
Ênio Lacerda: Creio que vem para ajudar, para somar, algo se torna prejudicial quando não se faz um uso consciente. Sem a Web seria praticamente impossível uma Rádio no Brasil tocar um reggae no Vaticano (Nossos relatórios apontam algumas conexões vindas de lá) além de outros pontos extremos do mundo. O uso do recurso tem que ser respeitoso, sendo feito assim, só ajuda.
12) RM: Como você analisa o cenário reggae brasileiro? Em sua opinião quais foram às revelações musicais nas duas últimas décadas e quem permaneceu com obras consistentes e quem regrediu?
Ênio Lacerda: Minhas preferências nacionais são bem restritas, a mídia rotula bandas/cantores sendo de reggae, mas quando vamos escutar é uma mistura de ritmos etc (Não digo que é ruim), apenas gosto daquele reggae mais Roots, com letras mais politizadas e de resistência.
Edson Gomes é um artista que mantém a linha de mensagem desde o início da sua carreira, apesar de ser polêmico, sua obra tem esse efeito, é constante. Creio que as bandas começam a regredir quando começam a sair da linha Roots do reggae e é como dizem “Menos é mais”.
13) RM: O que lhe deixa mais feliz e mais triste na carreira de DJ?
Ênio Lacerda: A felicidade vem quando o público reconhece o nosso trabalho de divulgação do Reggae Roots Music, as vezes recebemos alguns relatos do tipo “Pô cara não conhecia a rádio e agora me encantei” isso mostra que estamos trilhando o caminho certo.
O que me deixa triste é que existe um “competitividade não-saudável” dentro do ritmo, o reggae prega paz, amor, união… A realidade é bem diferente, não estou generalizando, mas vejo certas atitudes por aí que me entristecem.
14) RM: O que você diz para alguém que quer trilhar uma carreira musical?
Ênio Lacerda: Como exemplo da rádio, no início tínhamos poucas pessoas que se conectavam na rádio (1 ou 2 no máximo) e mesmo assim não desistimos, seguimos em frente. A mesma linha se aplica numa carreira musical, trabalhar duro e fazer o melhor… Se uma pessoa assiste ao show, trate como se fosse uma multidão, pois essa 1 pessoa pode te trazer a multidão.
15) RM: Como você analisa a relação que se faz da música reggae com o uso da maconha?
Ênio Lacerda: Uma total falta de conhecimento e preconceituosa. Reggae e a Erva estão intimamente ligados porque grande parte dos cantores nos anos 70 era/são Rastas e os Rastas fazem uso da Ganja (Cannabis Sativa) conforme seus princípios. Então acabou levando a essa relação deturbada dos fatos, porque nem todo Rasta usa maconha, nem todo cantor de Reggae é Rasta. Creio que quem ainda tem essa visão não conhece bem o reggae nem a vivência Rastafári.
16) RM: Como você analisa a relação que se faz da música reggae com a religião Rastafári?
Ênio Lacerda: Durante a era Ska-Rock Steady na Jamaica os princípios Rastas não era colocado na música. No final dos anos 60 e início dos 70 essa imersão do Reggae-Rasta começou a ficar mais evidente.
A Jamaica nesse período era resistente a tocar música Rasta nas rádios, os cantores com os seus Dreadlocks eram malvistos. Então, essa união do Reggae-Rastafári através das mensagens positivas de amor, irmandade, paz, união ganhou o público.
Onde Bob Marley passava com o seu Reggae e com suas mensagens Rasta faziam com que as pessoas parassem um pouco para refletir a respeito do sistema. O Reggae juntamente com o conhecimento Rasta se completam e faz esse ritmo ser único nesse sentido. O público que tem uma mente mais consciente e aberta sente essas energias.
17) RM: Alguns adeptos da religião Rastafári afirmam que só eles fazem o reggae verdadeiro. Como você analisa tal afirmação?
Ênio Lacerda: Toda mente consciente faz um reggae verdadeiro.
18) RM: Na sua opinião quais os motivos da cena reggae no Brasil não ter o mesmo prestígio que tem na Europa, nos EUA e no exterior em geral?
Ênio Lacerda: Creio que por dois fatores: primeiro o Brasileiro precisa aprender a dar valor para as coisas nacionais. Segundo esses dias entrevistando a cantora e compositora Fabiana Rasta, ela comentou o seguinte: “…Ninguém vê um reggae tocando numa loja de roupas ou departamentos ou quando você está esperando para ser atendido…”
Cadê o nosso espaço na mídia? Outro dia assistindo a um programa de grande repercussão nacional, nem chegaram a mencionar datas importantes como o dia Nacional do Reggae entre outras, mas são capazes de lembrar de datas que somente 1% da população conhece. Prioridades né. Por esse motivo que temos que ser resistentes e divulgar.
Lembrei da música “Bad Card” de Bob Marley que diz o seguinte: “…Eles vão se cansar de ver meu rosto \Não podem me tirar da corrida \ Oh cara, você disse que estou em seu lugar \E então você puxa carta ruim \ Eu quero perturbar o meu vizinho \ Pois me sinto tão bem! \ Eu quero aumentar o volume \ Tocar à toda energia esta noite…”.
19) RM: Quais os prós e contras de usar o Riddim (do inglês rhythm é o termo usado na Jamaica para designar bases sonoras comumente usadas. São usados principalmente no reggae, dub, ragga, dubwise, jungle e dancehall) como base instrumental para composição de reggae?
Ênio Lacerda: O Reggae que conhecemos hoje nem existiria. Nos anos 60 na Jamaica era comum fazer covers de músicas Americanas, Europeias etc… Eram o chamados “Do-Overs”… Pega-se essa base e recria no formato reggae aquela música.
Bob Marley, Alton Ellis entre outros nomes fizeram bastante. Porém a Jamaica sempre inovando começou a usar essas bases e começou a criar coisas próprias tais como o Dub, Dancehall e que influenciaram o Rap e Hip Hop que temos hoje, um processo de inversão, agora eles que se espelham nas criações Jamaicanas.
20) RM : Quais os prós e contras de fazer um show usando o formato Sound System (base instrumental sem voz)?
Ênio Lacerda: Não vejo um contra, pois antes mesmo de existir o Ska grandes produtores Jamaicanos como Coxsone Dodd e Duke Reid já tinham os seus sistemas de som, isso nos anos 50. Então com o tempo essa forma foi ganhando mais força e quando é algo bom influencia o mundo inteiro. A Europa como forte consumidora de cultura Jamaicana tinha sistemas potentes de som e o reflexo temos aqui no Brasil. O movimento tende a ganhar.
21) RM : Quais os seus projetos futuros?
Ênio Lacerda: Juntamente com a Diretoria do Movimento Reggae Good Idea (Ednei, Muniz, Dino e Reinaldo), estamos mudando o formato do programa Sábado Fyah!, estamos buscando mais informações para deixar os ouvintes mais ligados no que está rolando no mundo reggae, estamos buscando uma interatividade maior entre a rádio e os ouvintes: Eles podem enviar as músicas para tocar na rádio ou até mesmo fazer o seu programa.
Somos uma rádio bem democrática e damos espaço para quem precisa. Temos aí também uma parceria com Toko Hayek e o seu projeto Mafia Reggae onde estão pintando alguns radialistas ao redor o mundo para fazerem programas na rádio. Temos também o programa Regueiros Guerreiros de Jah (Miriane de Jah) que tem dado grande atenção ao reggae nacional e independente. Também temos algumas entrevistas com artistas nacionais e internacionais que estão pintando por aí. Fiquem ligados.
22) RM: Quais os seus contatos para show e para os fãs?
Ênio Lacerda: [email protected] | www.reggaegoodidea.com |www.reggaegoodidea.blogspot.com |
www.youtube.com/reggaegoodidea |Twitter: @reggaegoodidea |Instagram: @reggaegoodidea | www.facebook.com/reggaegoodidea
Gostaria de agradecer ao nosso M.C Lacerda pela oportunidade de estar ao seu lado aprendendo sobre os cheiros, cores e sabores da Cultura Reggae.