Assinada pelo jornalista e escritor Jamil Chade, O indomável: João Carlos Martins, entre som e silêncio (Ed. Record) revela a trajetória prodigiosa do artista brasileiro que se tornou uma das grandes estrelas da música clássica do século XX.
Obra traz novas nuances das glórias e dos percalços vividos pelo filho de imigrante português reveladas em sessões de conversas francas com o autor, que também é músico. O indomável começa em ritmo de thriller com uma inesperada fuga de Cuba, sob o temor de uma possível invasão norte-americana, e ganha contornos dramáticos nas muitas ocasiões em que o músico precisou enfrentar uma doença misteriosa que afetou o movimento das mãos.
Cada capítulo traz um código QR que remete a gravações históricas de sua carreira, das suas interpretações iluminadas de Bach a relíquias como uma performance gravada por seu pai num gravador de fios de aço quando João tinha apenas dez anos. Com ingressos esgotados, aconteceu o concerto gratuito na Sala São Paulo nesta terça-feira, dia 4 de junho de 2024, que também marcou o dia do lançamento.
“Sem resposta diante de seus apelos cada vez mais enfáticos, a cubana decidiu entrar no quarto onde estava o músico e, chacoalhando seus ombros, explicou que não tinham tempo a perder. João Carlos Martins colocou os óculos, na esperança de entender se ainda estava no meio de um sonho. Praticamente, não havia dormido. Horas antes, era aclamado no principal teatro de Havana e em seguida, na companhia de uma mulher designada pelo governo local como sua acompanhante e de uma garrafa de rum, descobriria, aos 20 anos, o fascínio das praias desertas do mar caribenho, regadas a beijos. Como uma cena do realismo fantástico latino-americano, a interrupção do silêncio, do sonho e do amor da noite cubana tinha um motivo urgente. O corpo diplomático estrangeiro havia sido informado que poderia ocorrer nos dias seguintes uma possível invasão da ilha, e os últimos voos comerciais para deixar Cuba estavam quase todos já lotados”_ trecho do capítulo de abertura de O indomável.
João Carlos Martins é considerado um dos maiores pianistas intérpretes de Johann Sebastian Bach, com quem divide, além do primeiro nome, um amor profundo, inquestionável e autêntico pela música. Nesta biografia, o jornalista Jamil Chade expõe suas facetas mais públicas e seus segredos: pianista prodígio, músico silenciado pelo próprio corpo, personagem com erros e acertos, reinvenção ambulante, maestro indomável.
Da infância debruçada sobre o piano, sob o olhar atento do pai obcecado pelo sucesso do filho e disposto a recorrer a métodos questionáveis para isso, a juventude como uma promessa realizada de talento e fama e a consagração interrompida em seu auge pela gradual atrofia nas mãos, João reinventou o conceito de sobrevivência a cada silêncio forçado a suportar. Mesmo quando esteve afastado dos palcos, como no curto período em que foi empresário esportivo e durante sua passagem breve e polêmica pela política, a esperança de que a música retornasse para ele o impediu de ficar à deriva.
Muitas sessões de fisioterapia o levaram de volta aos palcos, mas o agravamento de lesões neurológicas, acidentes e um episódio de violência forçaram a interrupção na carreira de pianista, dessa vez de forma definitiva. Suas mãos não deixaram de ousar trazer Bach à vida, agora como maestro. Muito mais que um exemplo de superação e perseverança, no entanto, o que se destaca em sua trajetória é o talento e a profunda dedicação à música como ferramenta transformadora de vidas.
“Este poderia ser um livro de ficção criado a partir da imaginação de um escritor como Gabriel García Márquez, mas é uma biografia com a precisão jornalística de Jamil Chade. Com os acertos e os erros do biografado, suas qualidades e defeitos. A vida do maestro João Carlos Martins é inimaginável. Vem sendo vivida, até porque seria impossível de ser inventada. Só mesmo um jornalista como Jamil, habituado com o que existe de mais glamoroso e mais dramático no planeta, poderia contá-la. Nesses seus primeiros 80 anos de vida, João Carlos Martins foi de menino prodígio a adulto prodigioso. Foi do clássico ao popular, de Bach a Bethânia. Se manteve sempre allegro e andante, mas nada moderato. Tocou a vida muito bem, e algumas vezes, desafinou o coro dos contentes. Essa biografia só tem um defeito. Breve estará desatualizada porque certamente o maestro já terá arranjado mais uma das suas. Esse maestro não tem conserto.” – Washington Olivetto
O INDOMÁVEL: JOÃO CARLOS MARTINS, ENTRE SOM E SILÊNCIO – Autor: Jamil Chade.
182 págs. | R$ 59,90 | Ed. Record | Grupo Editorial Record
SOBRE JAMIL CHADE: Cruzando fronteiras com refugiados, testemunhando crimes contra a humanidade, viajando com papas ou cobrindo cúpulas diplomáticas, Jamil Chade percorreu mais de setenta países. Com seu escritório na sede da ONU em Genebra, o jornalista conquistou diversos prêmios no exterior e no Brasil por sua defesa da democracia e dos direitos humanos. Chade publicou outros oito livros, três dos quais foram finalistas do prêmio Jabuti. Com sua flauta, ele cresceu dentro de orquestras. Agora, une suas duas paixões – a escrita e a música – nesta obra.
SOBRE JOÃO CARLOS MARTINS: João Carlos Martins, maestro e músico brasileiro, trilhou uma trajetória excepcional que o eleva a um patamar singular no cenário musical do século XX. Reconhecido como um dos maiores intérpretes de Johann Sebastian Bach, sua carreira atingiu seu ápice com a notável gravação da obra completa para teclado deste renomado gênio da música clássica. Essa realização estabeleceu João Carlos Martins como um ícone da interpretação bachiana.
No entanto, sua jornada foi marcada por desafios físicos que o obrigaram a redefinir seu caminho na música. Diante de problemas físicos que o afetaram, João Carlos Martins demonstrou uma incrível resiliência, adaptando-se à adversidade. Com a determinação que sempre o caracterizou, ele canalizou sua paixão inabalável pela música para a regência, revelando uma nova faceta de seu talento e consolidando sua posição como maestro de destaque.
Em 2020, João Carlos Martins emocionou o mundo ao conseguir tocar piano novamente utilizando avançadas luvas biônicas, que permitem os movimentos dos dedos. Essa incrível inovação tecnológica permitiu que o maestro revisitasse o piano, evidenciando não apenas sua maestria musical, mas também sua capacidade de superar obstáculos com criatividade e determinação em nome da música.
Links: http://fundacaobachiana.org.br/maestro
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